A vida e a obra
de Amalia
Domingo Soler
Os
frutos do
trabalho
realizado pela
mãe do clássico Memórias
do Padre Germano continuam
até hoje
É comum ouvirmos
de nossos
companheiros
espíritas mais
antigos a
seguinte frase:
- “Amigos, se
vocês quiserem
realmente
conhecer o
Espiritismo, não
podem
desencarnar
antes de lerem Memórias
do Padre Germano,
um clássico
espírita que
devemos a Amalia
Domingo Soler”.
O livro,
publicado no
Brasil pela
editora da
Federação
Espírita
Brasileira,
surgiu
inicialmente sob
a forma de
fascículos, na
Espanha, a
partir do dia 29
de abril de
1880, como a
própria Amalia
relata em um
texto que
constitui, na
edição publicada
pela FEB, o
prefácio da
obra.
Como surgiu o
livro Memórias
do Padre Germano
Eis como ela
menciona o fato:
Aos 29 de abril
de 1880 comecei
a publicar, no
jornal espírita A
Luz do Porvir,
as Memórias do
Padre Germano —
uma série de
comunicações
que, sob a forma
de novela, nem
por isso deixam
de instruir
deleitando. O
Espírito Padre
Germano foi
relatando alguns
episódios de sua
última
encarnação
terrena,
consagrada à
consolação dos
humildes e
oprimidos, ao
mesmo tempo que
desmascarava os
hipócritas e
falsos
religiosos da
Igreja Romana.
Tal proceder,
como era
natural, lhe
acarretou
inúmeros
dissabores,
perseguições sem
tréguas, cruéis
insultos e
ameaças de
morte, ameaças
que, por mais de
uma vez, e por
pouco se não
converteram em
amaríssima
realidade.
Vítima dos
superiores
hierárquicos,
assim viveu
desterrado em
obscura aldeia,
ele que, pelo
talento, bondade
e predicados
especiais,
poderia ter
conduzido a
seguro porto,
sem perigo de
soçobro, a arca
de São Pedro.
Mas, nem por
viver em recanto
ermo da Terra,
obscura foi sua
existência.
Assim como as
ocultas violetas
exalam delicado
perfume entre as
heras que as
sobrepujam,
assim a
religiosidade
dessa alma
exalou o sutil
aroma do
sentimento, e
com tanta
fragrância, que
a essência
embriagadora
pôde ser
aspirada em
muitos lugares
da Terra. Muitos
foram os
potentados que,
aterrados pela
ideia de crimes
enormes,
correram
pressurosos à
sua presença,
prostrando-se
humildes ante o
humilde
sacerdote, para
que fosse
intermediário
entre eles e
Deus. O Padre
Germano
arrebanhou
muitas ovelhas
desgarradas,
guiando-as pela
senda estreita
da verdadeira
religião, que
outra não é
senão a do bem
pelo bem, e
amando — não só
o bom, que por
excepcionais
virtudes merece
ser amado
ternamente, como
também o
delinquente —
enfermo d’alma
que, em
gravíssimo
estado, só com
amor se pode
curar. A missão
desse Padre em
sua última
encarnação foi,
de fato, a mais
bela que
porventura possa
ter o homem na
Terra; e visto
como, ao deixar
o invólucro
carnal, o
Espírito
prossegue no
espaço com os
mesmos
sentimentos
humanos, pôde
ele sentir,
liberto dos seus
inimigos, a
mesma
necessidade de
amar e instruir
o próximo,
buscando todos
os meios de
completar tão
nobilíssimos
desejos. À
espera de
propícia
ocasião,
encontrou,
finalmente, um
médium falante
puramente
inconsciente, ao
qual dedicava,
contudo, esse
achado: —
importava que
tal médium
tivesse um
escrevente capaz
de sentir,
compreender e
apreciar o que o
médium por si
dissesse. A isso
me prestei eu,
de boa vontade,
e no
veementíssimo
intuito de
propagar o
Espiritismo,
trabalhamos os
três na redação
destas
“Memórias”, até
10 de janeiro de
1884. Não
guardam elas
perfeita ordem
com relação à
existência do
Padre, sendo
que, tão
depressa relatam
episódios
verdadeiramente
dramáticos da
sua juventude,
como deploram o
isolamento da
sua velhice; em
tudo, porém, que
diz o Padre
Germano, há
tantos
sentimentos,
religiosidade e
amor a Deus;
admiração tão
profunda das
leis eternas e
tão grande
adoração à
Natureza, que,
lendo estes
fragmentos, a
criatura mais
atribulada se
consola, o mais
céptico espírito
conjetura,
comove-se o
maior criminoso,
cada qual
procurando Deus
a seu modo,
convencido de
que Ele existe
na imensidade
dos céus. Um dos
fundadores de A
Luz do Porvir,
o editor João
Torrents, teve a
feliz ideia de
reunir em
volumes as Memórias
do Padre Germano,
às quais
adicionei
algumas
comunicações do
mesmo Espírito,
por ter
encontrado nelas
imensos tesouros
de Amor e de
Esperança —
esperança e amor
que são frutos
sazonados da
verdadeira
religiosidade
por ele possuída
de muitos
séculos. Sim,
porque para
sentir e amar
como ele,
conhecendo ao
mesmo tempo tão
profundamente as
misérias da
Humanidade, é
preciso haver
lutado com a
fonte nunca
estanque das
paixões, com a
tendência dos
vícios, com o
estímulo
indômito das
vaidades
mundanas. As
grandes e
inveteradas
virtudes, tanto
quanto os
múltiplos
conhecimentos
científicos, não
se improvisam
porque são a
obra paciente
dos séculos. E
sejam estas
linhas — humilde
prólogo àsMemórias
do Padre Germano —
as heras que
ocultam o ramo
de violetas,
cujo
delicadíssimo
perfume há de
ser aspirado com
prazer pelos
sedentos de
justiça e
famintos de amor
e verdade. (Grácia,
25 de fevereiro
de 1900. Amalia
Domingo Soler.)
A vida difícil
na capital
espanhola
Amalia
certamente não
sabia que sua
obra se tornaria
imortal e
asseguraria um
lugar de
destaque entre
as obras mais
importantes que
a literatura
espírita nos
ofereceu e,
coincidência das
coincidências,
exatamente 29
anos depois da
publicação do
primeiro
fascículo, e no
mesmo dia, 29 de
abril, ela
retornaria ao
Plano
Espiritual.
Referimo-nos ao
ano de 1909,
quando em
Barcelona, aos
73 anos de
idade, Amalia
desencarnou.
Escritora,
costureira de
profissão e
grande expoente
do movimento
espírita
espanhol,
sobretudo por
seu trabalho na
divulgação do
Espiritismo,
Amalia Domingo
Soler nasceu em
Sevilha, região
da Andaluzia, no
dia 10 de
novembro de
1835.
Seu pai morreu
antes de a
menina nascer.
Aos oito anos
ficou
temporariamente
cega, sendo mais
tarde curada por
um farmacêutico.
Os problemas
visuais, no
entanto, a
acompanhariam
por toda a vida,
mas, graças aos
esforços
de sua mãe, dos
dois aos cinco
anos aprendeu a
ler, aos dez
anos começou a
escrever poesias
e aos dezoito
publicou seus
primeiros
versos.
Aos vinte cinco
anos, com o
falecimento da
mãe, Amalia
passou a
enfrentar outra
fase difícil.
Seus recursos
financeiros eram
utilizados na
manutenção de
sua frágil
saúde. Solteira,
suas relações
com a família
paterna eram
instáveis. Ela
decidiu então
mudar-se para a
capital do país,
Madri, esperando
encontrar ali
melhores dias.
Sua mãe lhe
aparece e muda
sua vida
Já morando na
capital, em 1868
passou por novas
dificuldades.
Não encontrando
trabalho,
enfrentou a fome
e passou a
depender a ajuda
de Instituições
de benemerência.
Sozinha e sem
recursos,
pensava em
desistir quando
certa noite,
caminhando sem
esperanças,
desiludida com a
vida,
apareceu-lhe sua
mãe. A visão
causou-lhe
grande espanto,
mas lhe reavivou
as esperanças e
fez Amalia
recordar-se da
importância da
religião. Buscou
auxílio, então,
em uma igreja
luterana. As
pregações da
igreja e o
contato com a
religião
impelem-na a não
desistir. Ela
volta a escrever
versos,
dedica-se à
costura e tenta
reerguer-se. A
visão causa-lhe,
no entanto,
novas aflições e
ela procura a
ajuda de um
médico
homeopata, Dr.
Hysern, que a
salva da
cegueira. Esse
mesmo homeopata,
embora se
declarasse
materialista,
entrega-lhe um
exemplar de "El
Critério",
periódico
espírita que
circulava na
época. O pequeno
jornal espírita
lhe desperta a
curiosidade e,
buscando maiores
esclarecimentos,
Amalia mantém
contanto com
diversas
revistas
espíritas da
época, toma
coragem e
escreve uma
poesia para o
jornal "El
Critério", a
qual não é
publicada, mas
inspirou o
editor a lhe
enviar um
exemplar de
"Preliminares
del
Espiritismo".
Sua primeira
publicação, uma
poesia, aparece
no periódico
espírita "La
Revelación". Seu
primeiro artigo
doutrinário, "La
Fe Espiritista",
sai pelo "El
Critério", em
1872. Seus
artigos
despertam grande
atenção e, aos
poucos, Amalia
integra-se no
movimento
espírita
espanhol,
participando de
reuniões em
casas espíritas.
Em Barcelona as
atividades se
multiplicam
Em 31 de março
de 1875,
aniversário da
desencarnação de
Allan Kardec, lê
a poesia "A la
Memoria de Allan
Kardec" diante
dos membros da
Sociedad
Espiritista
Española e
torna-se, a
partir de então,
mais um membro
das fileiras de
propagandistas
da Doutrina
Espírita em
terras
espanholas.
Junto aos
espíritas de
Murcia,
permanece quatro
meses
recuperando-se
de uma
enfermidade.
Recuperada,
ciente de que
seria errado
viver do
Espiritismo,
Amalia continua
a trabalhar de
dia e escrever
de noite. Em 10
de agosto de
1876, convidada
pelo grupo
espírita
"Circulo La
Buena Nueva",
ela decide
mudar-se para
Barcelona, com a
esperança de
encontrar
melhores
condições de
trabalho na
capital catalã,
já então uma
cidade de grande
atividade
econômica.
No dia 9 de maio
de 1879
aparece-lhe o
Padre Germano,
seu guia
espiritual. Em
Barcelona, ela
conhece o médium
sonâmbulo
Eudaldo, que
recebe várias
mensagens
destinadas a
Amalia, muitas
dessas reunidas
no livro Memórias
do Padre
Germano, que
foi publicado,
como dissemos
inicialmente, em
partes, a partir
de 29 de abril
de 1880.
Em 22 de maio de
1879 Amalia
publica o
primeiro número
do periódico "La
Luz del Porvenir",
dirigido por ela
própria. No
primeiro número
saiu o artigo
"La idea de Dios",
que foi
denunciado às
autoridades e
provocou a
suspensão do
periódico por 42
semanas.
A influência da
obra de Amalia
perdura até hoje
Não se intimidou
e lançou outra
revista, com o
nome "El Eco de
la Verdad", até
que a revista
suspensa pudesse
voltar a
circular, o que
ocorreu após um
decreto do rei
Afonso XII. O
Catolicismo era
a religião
oficial na
Espanha e
reagia, por
isso, a tudo que
entendesse fosse
contrário aos
seus interesses.
O periódico "La
Luz del Porvenir"
foi publicado
até 1899 e
muitos dos
artigos de
Amalia Domingo
Soler publicados
durante este
período -
incluindo "La
Idea de Dios" -
foram, a partir
de 1972,
reunidos por
Salvador Sanchís
Serra nos livros
"La Luz del
Porvenir" e "La
Luz del Camino",
distribuídos
gratuitamente
por ele e pelo
grupo espírita
"La Luz del
Camino" de
Orihuela,
Alicante.
O balanço da
obra de Amalia
Domingo Soler é
difícil de ser
feito, pois seus
frutos ainda
continuam
surgindo.
O movimento
espírita
espanhol do
final do século
XIX, obra de
Amalia e de
outros grandes
pioneiros, como
Fernandes
Colavida e
Miguel Vives y
Vives, abrigou o
primeiro
congresso
espírita
internacional em
1888,
influenciou os
movimentos
nascentes nos
vários países de
língua espanhola
da América
Latina e - como
precedente
histórico - é a
base para o
atual
renascimento do
Espiritismo
espanhol. Seus
artigos são
hoje, como foram
ontem,
exposições
claras e diretas
do Espiritismo e
fiéis
intérpretes da
Doutrina
Espírita
codificada por
Allan Kardec. |