A irrefreável
força de
expansão do
Espiritismo
Vendo o número de felizes que o Espiritismo faz,
esquecemos as fadigas de nossa tarefa
Por tornar felizes aqueles que o compreendem, professam
e praticam, o Espiritismo teve – desde os seus
primórdios – uma facilidade muito grande de propagação.
Afinal, qual o aflito que recusa consolações? Quem
poderia rejeitar compreender os mecanismos das leis
divinas, da lei de causa e efeito, e todas as luzes
oferecidas pelo Espiritismo?! Só mesmo quem possui
interesses escusos e/ou subalternos a resguardar.
Em uma curta excursão
realizada em 1867 por Allan Kardec, nas cidades de
Bordeaux, Tours e Orléans, podemos verificar o fenômeno
da inexorável propagação do Espiritismo e seus efeitos
salutares sobre as pessoas. Pincemos, então, alguns
lances do relato feito pelo próprio Codificador:
“(...) apesar das ocupações que nos retinham em Paris,
pudemos aceder ao gracioso e insistente convite da
Sociedade Espírita Bordalesa para estar presente em sua
reunião anual, para a qual acorreram visitantes vindos
de uma grande distância, como Toulouse, Marmande,
Villeneuve, Libourne, Niort, Blaye e até Carcassonne,
que está a 80 léguas, ali tinham seus representantes.
Todas as classes da
sociedade estavam nele confundidas numa comunidade de sentimentos;
lá se encontravam o artesão, o cultivador ao lado do
burguês, do
negociante, do médico, dos funcionários, dos advogados,
dos homens de ciência etc...
Seria supérfluo acrescentar que tudo se passou como isto deveria
ser entre pessoas que têm por divisa: ‘fora da
caridade não há
salvação’,
e que professam a tolerância por todas as opiniões e
todas as
convicções. Também, nas alocuções de circunstância que
foram pronunciadas, nem uma palavra foi dita, cuja suscetibilidade mais
sombria pudesse
chocar; nossos maiores adversários, mesmo se ali tivessem
se encontrado, não teriam ouvido uma palavra, nem uma alusão
à sua proposta.
A autoridade tinha se mostrado cheia de benevolência e
de cortesia
com respeito a esta reunião, e lhe devemos o
agradecimento. Ignoramos
se ela ali estava representada de maneira oculta, mas,
seguramente
ela pôde se convencer ali, como sempre, de que as ideias
professadas
pelos Espíritas, longe de serem subversivas, são uma
garantia de paz
e de tranquilidade; que a ordem pública nada tem a temer
de pessoas
cujos princípios são os do respeito às leis, e que, em
nenhuma
circunstância, não cederam às sugestões dos agentes
provocadores
que procuravam comprometê-los. Vistos sempre se
retirarem e se
absterem de toda
manifestação ostensiva, todas as vezes que puderam
temer que se
fizesse ali um pretexto de escândalo... É
fraqueza de sua parte? Certamente, não; ao contrário, é
a consciência da força de seus princípios que os torna
calmos, e a certeza
que têm da inutilidade dos esforços tentados para
abafá-los;
quando se abstêm, não é para colocar suas pessoas ao
abrigo, mas
para evitar o que poderia recair sobre a Doutrina. Eles
sabem que ela
não tem necessidade
de demonstrações exteriores para triunfar. Veem
suas ideias germinarem com uma força
irresistível; que necessidade teriam de fazer barulho? Eles deixam esse
cuidado aos
seus antagonistas, que, por seus clamores, ajudam a
propagação. As próprias perseguições são o batismo
necessário a
todas as ideias novas um pouco grandes; em lugar de
anulá-las, elas
lhes dão o brilho; mede-se a sua importância pela obstinação que se
põe em
combatê-las. As ideias que não se aclimatam senão à
força de
reclames e de encenações não têm senão uma vitalidade
factícia e de
curta duração; as que se propagam por si mesmas e pela
força das
coisas têm a vida nelas, e são as únicas duráveis; é o
caso em que se encontra o Espiritismo.
A reunião terminou por uma coleta feita em proveito dos
infelizes, sem
distinção de crenças, e com uma precaução cuja sabedoria
não se
pode senão louvar.
Apesar da brevidade da nossa permanência em Bordeaux,
pudemos
assistir a duas sessões da sociedade: uma consagrada ao
tratamento
dos doentes, e a outra aos estudos filosóficos. Pudemos
assim constatar, por
nós mesmos, os bons resultados que são sempre o fruto
da
perseverança e da boa vontade. No relatório que
publicamos em
nosso número precedente sobre a sociedade bordalesa,
pudemos, com conhecimento de causa, acrescentar
as nossas felicitações pessoais. Mas ela não deve se
dissimular de que quanto mais
prosperar, mais será
o alvo dos ataques de nossos adversários; que ela
desconfie,
sobretudo, das surdas manobras que poderiam urdir contra
ela, e dos pomos de discórdia que, sob a
aparência de um zelo exagerado, poderiam lançar em seu
seio.
Estando o tempo de nossa ausência de Paris limitado pela
obrigação
de para lá regressar em dia determinado, não pudemos,
lamentavelmente, ir aos diferentes centros para os quais
fomos convidados;
não pudemos senão nos deter alguns instantes em Tours
e em Orléans
que se encontravam em nossa rota. Lá também pudemos
constatar o
ascendente que a Doutrina adquire a cada dia na opinião,
e seus felizes resultados que, por não serem ainda senão
individuais, não são por isto menos
satisfatórios.
Em Tours a reunião deveria ter quase cento e cinquenta
pessoas,
tanto da cidade quanto das vizinhanças, mas, em
consequência da
precipitação
com a qual a convocação foi feita, somente os dois
terços delas puderam ali ir. Uma circunstância
imprevista não tendo permitido o aproveitamento da sala
que havia sido escolhida, reuniu-se, em uma
magnífica noite, no jardim de um dos membros da
sociedade. Em Orléans os Espíritas são menos numerosos, mas esse centro não
contou com número
menor de adeptos sinceros e devotados, aos quais
ficamos felizes de apertar a mão.
Um fato constante e característico, e que se deve
considerar como
grande progresso, é a diminuição gradual e quase geral
das prevenções
contra as ideias espíritas, mesmo entre aqueles que não
as partilham; reconhece-se agora a todos o direito de
ser Espírita, como o de ser judeu
ou protestante; já é alguma coisa!
O objetivo sério da Doutrina, suas consequências
morais, os recursos que ela pode oferecer para o alívio
do sofrimento,
a felicidade de reencontrarem os parentes ou amigos que se
perdeu e
de conversar com eles, escutar os conselhos que vêm dar, fazem o
objeto exclusivo e preferido das reuniões espíritas.
O que se
procura na Doutrina,
antes de tudo, é o que toca o coração. É uma
coisa notável a facilidade com a qual as pessoas, mesmo
as mais ilustres, compreendem e assimilam os princípios
desta filosofia; é porque não é necessário ser sábio
para ter coração e julgamento.
Ah! Dizem eles, se
nos tivessem sempre nos falado assim, jamais teríamos
duvidado de Deus e de Sua bondade, mesmo nas piores
misérias!
Sem dúvida, é alguma coisa crer, porque já é um pé
colocado no
bom caminho;
mas a crença sem a prática é uma letra morta;
ora,
somos felizes em dizer que, em nossa curta excursão, entre numerosos
exemplos dos efeitos moralizadores da Doutrina,
encontramos bom
número desses Espíritas de coração que se poderia dizer
completos
se fosse dado ao homem ser completo no que quer que
seja, e que se
pode considerar como os tipos da geração futura
transformada; há-os
de todas as idades e de
todas as condições,
desde a juventude até o limite extremo da idade, que
realizam desde esta vida as promessas que nos são
feitas para o futuro. Eles são
fáceis de reconhecer:
há em todo o seu ser um reflexo de franqueza e de
sinceridade que comanda a confiança; desde o início
sente-se que
não há nenhum pensamento dissimulado sob palavras douradas ou
hipócritas. Ao redor
deles, e mesmo na mediocridade, sabem
fazer reinar a calma
e o contentamento. Nesses interiores benditos
respira-se uma
atmosfera serena que reconcilia com a humanidade, e
compreende-se
o reino de Deus sobre a Terra; felizes aqueles que
sabem disto gozar por antecipação!
Em nossas viagens espíritas, é
menor o número de crentes que calculamos e que mais nos
satisfaz,
que aqueles desses adeptos que são a honra da Doutrina e que são
dela, ao mesmo tempo, os mais firmes sustentáculos,
porque a fazem
estimar e respeitar neles.
Vendo o número dos felizes que o Espiritismo faz,
esquecemos
facilmente as fadigas inseparáveis de nossa tarefa. Está
aí uma satisfação,
um resultado positivo, que a mais obstinada malevolência
não pode nos tirar”.