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por Estênio Negreiros

 

A ponte Marie e O Livro dos Espíritos


A sublime Doutrina Espírita tem sido um farol a iluminar caminhos de todos quantos dela se aproximam em busca de explicações para os “problemas do ser, do destino e da dor”, bem como tem servido de lenitivo para os que buscam os seus ensinamentos nos instantes de sofrimentos físicos, das contrariedades, ou nos aflitivos momentos de perdas de entes queridos que nos precedem no retorno ao Mundo Maior.

Devemo-la à curiosidade do professor lionês Hippolyte Léon Denizard Rivail (Allan Kardec), quando se interessou pelo Magnetismo e posteriormente constituiu-se observador dos fenômenos das “mesas girantes” ocorridos em reuniões familiares e atribuídos a manifestações de almas de pessoas falecidas.

A ele, pois, devemos a construção desse magistral edifício científico-filosófico, no gigantesco trabalho da codificação do que viria a se chamar Doutrina Espírita ou Espiritismo, constituído das cinco extraordinárias obras literárias conhecidas como o Pentateuco Espírita.

Não sendo objetivo deste modesto artigo a pretensão de contar a história do Espiritismo nem tampouco escrever a biografia do Codificador, detemo-nos aqui somente num significativo episódio ocorrido durante o longo e espinhoso caminho trilhado por Allan Kardec na produção da Codificação Espírita, quando enfrentou e venceu os mais diversos obstáculos.

Leiamos, a seguir, o que extraímos da obra O Livro dos Espíritos de Estudo (Edição Pedagógica Cárita Editora Espírita), com questões e comentários para o aprendizado espírita, produzidos pelo Espírito Eurípedes Barsanulfo.

PONTE MARIE

O Livro dos Espíritos é uma ponte entre o visível e o invisível, entre o Céu e a Terra, entre o homem e os anjos. A Humanidade, mais cedo ou mais tarde, encontrará essa ponte; ponte a unificar os continentes separados, as saudades intransponíveis dos que partiram, a dilaceração entre o amar e a distância do objeto do amor. Enfim, no episódio da Ponte Marie podemos encontrar, em metáfora, a definição humanizada da Ciência e da Filosofia contidas na obra O Livro dos Espíritos, nas questões mais pungentes e dolorosas que, através de 1019 perguntas, são respondidas. Ponte Marie significa a ode dramática do homem diante de suas contingências... A luz se fez!... Faça-se a luz!

Depoimento do Espírito Hilário Silva, da obra O Espírito da Verdade, psicografia de Francisco Cândido Xavier:

“Allan Kardec, o Codificador da Doutrina Espírita, naquela triste manhã de abril de 1860, estava exausto, acabrunhado. Fazia frio. Muito embora a consolidação da Sociedade Espírita de Paris e a promissora venda de livros, escasseava o dinheiro para a obra gigantesca que os Espíritos Superiores lhe haviam colocado nas mãos. A pressão aumentava... Missivas sarcásticas avolumavam-se à mesa.

Quando mais desalentado se mostrava, chega a paciente esposa, Madame Rivail – a doce Gaby –, a entregar-lhe certa encomenda, cuidadosamente apresentada. O professor abriu o embrulho encontrando uma carta singela. E leu:

‘Sr. Allan Kardec:

Respeitoso abraço.

Com a minha gratidão, remeto-lhe o livro anexo, bem como a sua história, rogando-lhe, antes de tudo, prosseguir em suas tarefas de esclarecimento da Humanidade, pois tenho fortes razões para isso.

Sou encadernador desde a meninice, trabalhando em grande casa desta Capital.

Há cerca de dois anos casei-me com aquela que se revelou a minha companheira ideal. Nossa vida corria normalmente e tudo era alegria e esperança, quando, no início deste ano, de modo inesperado, minha Antonieta partiu desta vida, levada por sorrateira moléstia.

Meu desespero foi indescritível e julguei-me condenado ao desamparo extremo.

Sem confiança em Deus, sentindo as necessidades do homem do mundo e vivendo com as dúvidas aflitivas de nosso século, resolvera seguir o caminho de tantos outros ante a fatalidade...

A prova da separação vencera-me, e eu não passava, agora, de um trapo humano.

Faltava ao trabalho e meu chefe, reto e ríspido, ameaçava-me com a dispensa.

Minhas forças fugiam.

Namorara diversas vezes o Sena e acabei planejando o suicídio. ‘Seria fácil, não sei nadar’ – pensava.

Sucediam-se noites de insônia e dias de angústia. Em madrugada fria, quando as preocupações e o desânimo me dominaram mais fortemente, busquei a Ponte Marie.

Olhei em torno, contemplando a corrente... E, ao fixar a mão direita para atirar-me, toquei um objeto algo molhado que se deslocou da amurada, caindo-se aos pés.

Surpreendido, distingui um livro que o orvalho umedecera.

Tomei o volume nas mãos e, procurando a luz mortiça de poste vizinho, pude ler, logo no frontispício, entre irritado e curioso:

‘Esta obra salvou-me a vida. Leia-a com atenção e tenha bom proveito.

A. Laurent’.

Estupefato, li a obra – O Livro dos Espíritos –, ao qual acrescentei breve mensagem, volume esse que passo às suas mãos abnegadas, autorizando o distinto amigo a fazer dele o que lhe aprouver’.

O Codificador desempacotou, então, um exemplar de O Livro dos Espíritos ricamente encadernado, em cuja capa viu as iniciais do seu pseudônimo e na página do frontispício, levemente manchada, leu com emoção não somente a observação a que o missivista se referira, mas também outra, em letra firme:

‘Salvou-me, também. Deus abençoe as almas que cooperaram em sua publicação.

Joseph Perrier’.

Após a leitura da carta providencial, o Professor Rivail experimentou nova luz a banhá-lo por dentro... Aconchegando o livro ao peito, raciocinava, não mais em termos de desânimo ou sofrimento, mas sim na pauta de radiosa esperança.

Era preciso continuar, desculpar as injúrias, abraçar o sacrifício e desconhecer as pedradas... Diante de seu Espírito turbilhonava o mundo necessitado de renovação e consolo.

Allan Kardec levantou-se da velha poltrona, abriu a janela à sua frente, contemplando a via pública, onde passavam operários e mulheres do povo, crianças e velhinhos...

O notável obreiro da Grande Revelação respirou a longos haustos, e, antes de retomar a caneta para o serviço costumeiro, levou o lenço aos olhos e limpou uma lágrima...”.

Essa ponte, metáfora de uma outra mais sensível, tecida de conhecimentos, desvela-se aos nossos olhos, O Livro dos Espíritos. Salvou-nos e continuará sua obra de regeneração enquanto houver dor e o grito humano a cortar os espaços da Criação. Poderia o Cristo seguir indiferente?

Certa vez, ao referir-se ao O Livro dos Espíritos, José Herculano Pires assim se manifestou:

“Este livro é, portanto, o resultado de um trabalho coletivo e conjugado entre o Céu e a Terra. O Prof. Denizard não o publicou com o seu nome ilustre de pedagogo e cientista, mas com o nome obscuro de Allan Kardec, que havia tido entre os druidas, na encarnação em que se preparava ativamente para a missão espírita. O nome obscuro suplantou o nome ilustre, pois representava, na Terra, a Falange do Consolador. Esta falange se constituía dos Espíritos Reveladores, sob a orientação do Espírito de Verdade e dos pioneiros encarnados, com Allan Kardec à frente”.

 

Bibliografia:


O Livro dos Espíritos de Estudo – Allan Kardec – edição com questões e comentários para a aprendizagem espírita pelo Espírito Eurípedes Barsanulfo – Cárita Editora Espírita – 2012 – 3ª edição. 

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita