João Cândido conseguiu três meses de licença para o
filho no armazém de José Felizardo Sobrinho, Chico se
despediu dos companheiros do Centro Luiz Gonzaga e
embarcou com o desconhecido em direção a uma chácara a
três quilômetros do bairro da Gameleira, em Belo
Horizonte.
O autor do Parnaso de Além-Túmulo, mulato,
malvestido, com expressão atordoada, virou atração na
casa. Intelectuais mineiros se reuniam em torno dele e
comentavam, diante de seus olhos arregalados, os estudos
de Coorkes e Richet sobre a mediunidade, os pastiches de
Paul Reboux, os poemas de Baudelaire, Musset, Bilac,
Augusto dos Anjos.
O matuto acompanhava tudo em silêncio. Uma vez ou outra,
respondia com monossílabos a perguntas sobre os poemas
ditados do outro mundo. Tinha medo de cometer
disparates. No meio da noite, sozinho no quarto,
respirava aliviado diante das visões do guia e da mãe.
As aparições repetiam conselhos sobre a prudência e o
respeito aos outros e Emmanuel ainda aproveitava para
tirar dúvidas literárias do protegido.
Explicava, por exemplo, que Paul Reboux era mestre em
imitar o estilo de outros poetas. Enquanto esperava o
serviço prometido, Chico acompanhava, a distância, entre
as árvores da chácara, a construção de um sanatório em
terreno vizinho. Estava triste, tenso. O hospital, no
terreno vizinho, crescia a cada dia e o emprego não
saía. Os três meses se esgotaram.
(Continua.)
Do livro As Vidas de Chico Xavier, de Marcel
Souto Maior.