Direitos Naturais
No presente trabalho tentar-se-á descrever, ainda que
resumidamente, com recurso à citação a partir do próprio
autor de referência, Silvestre Pinheiro Ferreira
(1769-1846), os aspectos que se consideram mais
adequados aos objetivos desta abordagem e que, como é
notório, se prendem com a defesa dos Direitos Humanos, a
partir do sistema educativo português, numa determinada
época da História Lusitana, seguindo, sincronicamente, o
pensamento do autor do manual de Filosofia de 1866
(António Ribeiro da Costa), que, desde logo, transmite
algumas noções, caracteres e definição do Direito
Natural.
A moral é entendida como a «ciência das leis segundo
as quais deve desenvolver-se a atividade livre do homem;
e o dever do homem consiste no desenvolvimento da sua
natureza e faculdades. Este desenvolvimento implica a
aplicação das faculdades a todas as classes de entes, o
que determinará uma relação entre o homem e os seus
semelhantes» (COSTA, 1866:441).
Nesta linha de pensamento, o Direito é uma possibilidade
e uma relação, constitui os meios para alcançar um
determinado fim de que resulta a faculdade de empregar
tais meios, sem o que nenhum ato pode servir de meio
para a realização de um fim, se não tiver com esse mesmo
fim uma relação tão forte e íntima que, dado um, o outro
se siga imediatamente.
A possibilidade que o homem tem de empregar os meios
para atingir um fim é o que se pode designar por um
direito, donde se poderá inferir que o Direito exprime
uma relação entre pessoas, sendo necessário que todos
respeitem as mesmas liberdades de utilização dos meios
morais ou de direitos, mas em relação a outros.
Para, afinal, considerar que «fim do homem como um
fim individual e também um fim comum da humanidade. A
Ciência dos Direitos, a Filosofia do Direito ou o
Direito Natural pode pois definir-se; a ciência que
expõe o complexo das condições dependentes da
liberdade e necessários para o conseguimento do fim do
homem. Ciência das condições porque são outros tantos
direitos e meios; dependente da liberdade porque todos
aqueles que o homem precisa (...) não podem ser objeto
de direitos que possam ou devam ser respeitados;
necessária para o conseguimento do fim do homem porque o
conseguimento deste fim é o fundamento comum para todas
as leis racionais que regulam a livre atividade humana»,
seguindo-se que: «fim do homem como um fim
individual e também um fim comum da humanidade»
(Ibid.:144).
Pode-se considerar o direito no seu sentido subjetivo
quando, com relação ao sujeito, designa a faculdade ou a
possibilidade moral de praticar atos que sejam condições
para o conseguimento do fim do homem; no seu sentido
objetivo, quando, relativamente ao objeto, designa a
propriedade que um ato tem de servir de condição para o
conseguimento do fim do homem.
O Direito tem, simultaneamente, a ideia de obrigação do
dever jurídico pela necessidade que existe em respeitar
a faculdade de usar das condições necessárias para
atingir o fim, do que se entende que: a faculdade é o
direito; a necessidade, a obrigação.
Refere, ainda, o autor, que todos os direitos envolvem
uma obrigação genérica e, nesse sentido, a norma geral
das obrigações jurídicas exprime-se pela fórmula: «Omite
todas as ações que estorvem ou ofendam os direitos de
outrem. (...) Fácil é formular o princípio moral do
Direito: - usa livremente das condições necessárias para
o teu fim racional, que não estorvem os direitos de
outrem» (Ibid.:446).
Se por um lado a Moral visa à harmonização de todas as
ações do homem com o seu fim, o Direito assegura as
condições de realização deste bem, dirige-se aos atos
humanos, impedindo que estorvem o livre uso destas
condições e, assim, as obrigações, ou deveres jurídicos,
revestem certos caracteres distintos dos deveres morais.
As obrigações jurídicas são contidas numa fórmula
negativa que consiste em não estorvar o direito de
outrem: «a) aplicam-se a atos que se revelem
exteriormente, saindo para fora do domínio psicológico;
b) são correlativas a direitos de outrem por exprimirem
sempre uma relação entre pessoas; c) são exigíveis pela
coação por serem condições do conseguimento do fim do
homem; d) podem ser cumpridas por ações em que apenas se
verifique a moralidade objetiva ou a conformidade com a
lei; e) são relativas e variáveis porque só se verificam
nas relações de homens para homens» (Ibid.:450).
São ainda: «a) positivas ou afirmativas porque mandam
ao homem que pratique todas as ações que forem
necessárias para alcançar o fim; b) interiores
porque se impõem à resolução voluntária ou intenção do
agente; c) não supõem nenhuma relação porque
imperam absolutamente, sem dependência de direito algum;
d) isentas de coação, a qual não opera sobre a
resolução que é um fato psicológico; e) só podem
cumprir-se por ações em que se verifique a moralidade
subjetiva; f) pertencem ao foro interno ou da
consciência pelo que muito dificilmente se deixam
apreciar fora do sujeito; g) são absolutas e
invariáveis, como as verdades necessárias que elas
exprimem» (Ibid.).
Das distinções efetuadas entre os caracteres das
obrigações jurídicas e dos Deveres Morais, podemos
estabelecer, de acordo com o autor, uma comparação entre
Direito e Moral:
«Direito: a) não lhe importa a intenção, mas sim
a ação exterior; b) é uma crença objetiva, embora
menos vasta que a moral; c) as obrigações
jurídicas podem ser exigíveis pela força; d) é
uma faculdade, uma permissão, da qual o sujeito pode
usar ou não; e) o sujeito do direito deve
moralmente, no uso dele, subordiná-lo aos deveres
morais.
Moral: a) considera a intenção com que a ação é
praticada; b) é uma ciência subjetiva; c)
proíbe e ordena tudo como o Direito porque é uma ciência
mais vasta que o Direito e além disso exige o
cumprimento de todas as obrigações jurídicas como
deveres morais»
(Ibid.).
Considera o autor que «Não há oposição entre a Moral
e o Direito (...) porque não pode haver direitos
imorais, porque a imoralidade respeita a parte subjetiva
da ação, da qual o Direito não pode conhecer, (...). Não
há, pois, colisão entre as obrigações jurídicas e as
morais» (Ibid.)
Nas relações de harmonia da Moral e do Direito, aquela e
este têm por objetivo a concretização do fim do homem,
ainda que por caminhos diferentes: a Moral pela parte
subjetiva, pela vontade; o Direito pelo lado exterior da
ação positiva.
Bibliografia
COSTA, António Ribeiro da, (1866). “Curso Elementar
de Philosofia”, 2ª Ed. Porto: Typographia de António
J. S. Teixeira.
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