A. Como Flammarion se refere ao cérebro?
Diz Flammarion que, seja qual for a opinião a
respeito da natureza do espírito, não há duvidar
de que o cérebro não seja o órgão das faculdades
intelectuais. Não há no corpo humano nenhum
órgão que, com um número proporcionalmente tão
diminuto de elementos anatômicos a lhe
constituírem a substância, possua tamanha
quantidade de partes diferentemente conformadas
e provando, à evidência, por sua forma exterior
e estrutura interna, sua posição e relações
mútuas, que elas presidem a funções especiais,
que ainda não foi possível fixar. (Deus na
Natureza – Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
B. Pode-se dizer que o pensamento é proporcional
ao número e à irregularidade das circunvoluções?
É o que se entendia na época de Flammarion, ou
seja, que o pensamento é proporcional ao número
e à irregularidade das circunvoluções. Segundo
as conclusões de sua época, o que sobretudo
distingue o cérebro humano do simiesco é que,
entre as circunvoluções que se dirigem do lobo
occipital para o temporal, duas há, no homem,
que não se encontram no macaco, sendo este um
dos maiores contrastes que separam os dois
cérebros. (Deus na Natureza – Terceira Parte.
A Alma. O Cérebro.)
C. Qual é, em média, o peso normal de um cérebro
humano?
Ele varia entre três libras e três libras e
meia. Cada libra equivale a 453 gramas. O peso
do cérebro dos cretinos desce, por vezes, a uma
libra. O de Cuvier pesava mais de 4 libras.
Afora a questão do peso, o tamanho, a forma e o
arranjo da composição do cérebro eram também
invocados pelos anatomistas como correlatos à
inteligência. (Deus na Natureza – Terceira
Parte. A Alma. O Cérebro.)
Texto para leitura
564. Em regra, os homens que encaram com desdém
e displicência quaisquer questões são os que
pretendem opinar com maior segurança, e isto
simplesmente porque, não as tendo profundado,
são incapazes de avaliar as dificuldades que
elas apresentam aos pesquisadores. Ainda hoje,
temos metafísicos que cerram os olhos para
melhor se verem a si mesmos, e sem noção alguma
de método experimental. Esses, pois, que vêm
repetindo há 50 anos, sem se precatarem das
dificuldades da proposição, que a alma é um ser
encarnado no corpo e independente desse corpo,
terão muito o que meditar na sequência dos fatos
que vamos desenvolver. (Deus na Natureza –
Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
565. Seja qual for a opinião a respeito da
natureza do espírito, não há duvidar de que o
cérebro não seja o órgão das faculdades
intelectuais. Examinemos-lhe a estrutura. Esta,
diz Carl Vogt[i],
é extremamente complicada. Não há no corpo
humano nenhum órgão que, com um número
proporcionalmente tão diminuto de elementos
anatômicos a lhe constituírem a substância,
possua tamanha quantidade de partes
diferentemente conformadas e provando, à
evidência, por sua forma exterior e estrutura
interna, sua posição e relações mútuas, que elas
presidem a funções especiais, que ainda não foi
possível fixar.
(Deus na Natureza
– Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
566. Quanto às partes elementares, componentes
da substância cerebral do homem e dos animais,
formam elas dois grupos principais: – uma
substância cinzenta, mais ou menos escura, ou
amarelada, que oferece a olho nu uma aparência
bastante homogênea, e uma substância branca na
qual podemos distinguir feixes mais ou menos
aparentes, projetando-se em direções
determinadas. A substância parda forma,
certamente, o núcleo principal da atividade
nervosa, e a branca, ao contrário, parece ser a
parte condutora. Se cogitarmos de conceber as
relações da estrutura cerebral com o
desenvolvimento intelectual, é, sobretudo, na
substância parda e nos pontos em grande parte
formados por ela, que importa atentar, de
preferência. (Deus na Natureza – Terceira
Parte. A Alma. O Cérebro.)
567. O cérebro divide-se em dois hemisférios
laterais por um sulco profundo, que segue sua
linha mediana e na qual se intermite uma dobra
da dura-máter, chamado foice do cérebro. Uma
segunda prega dessa membrana, tenda do cerebelo,
estende-se horizontalmente na região posterior
do crânio e separa o cerebelo dos lobos
posteriores do cérebro, servindo-lhe de suporte.
O cérebro propriamente dito forma, assim, um
todo completo, que, conforme o comprovam o
desenvolvimento embriológico e a anatomia
comparada, avoluma-se e acaba comprimindo e
avassalando as demais partes. Esse aumento de
volume, nos animais, corresponde à sua elevação
na escala, com acentuada tendência para o tipo
do cérebro humano. (Deus na Natureza –
Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
568. Examinando por cima, cada hemisfério parece
formar uma massa distinta, apresentando à
superfície uma porção de sulcos de contorno,
permeando cordões intestiniformes, ou
circunvoluções. Comumente, os dois hemisférios
são semelhantes e se dividem em três segmentos
sucessivos, de diante para trás: – os lobos
frontal, parietal e occipital. Visto de lado,
haveria que juntar o lobo inferior temporal e,
além deste, um pequeno lobo oculto, chamado
ilha, ou lobo central. Os anatomistas antigos
pouca atenção ligaram às circunvoluções, ainda
porque tardaram em reconhecer que os dois
hemisférios não são inteiramente simétricos.
Assim, consideravam fortuita a distribuição das
ditas circunvoluções, ou, conforme diz um
observador, como um punhado de intestinos
lançados ao acaso, de sorte que os desenhistas
costumavam fantasiá-los assim nas suas estampas
anatômicas. (Deus na Natureza – Terceira
Parte. A Alma. O Cérebro.)
569. As observações mais aprofundadas destes
últimos tempos ensinaram-nos, entretanto, que
essa bela desordem é um efeito artístico da
Natureza e que existe um plano definido, uma
certa lei que então não fora notada, de vez que
as investigações se haviam limitado quase
exclusivamente ao homem. Dá-se com os
naturalistas o mesmo que com os homens pouco
versados em Arquitetura, os quais, no meio da
profusão de elementos que sobrecarregam um
estilo, não podem decifrar o plano fundamental.
Segundo as últimas investigações, estas
circunvoluções cerebrais teriam capital
importância e delas trataremos antes de nos
ocuparmos com as relações de peso e volume.
(Deus na Natureza – Terceira Parte. A Alma. O
Cérebro.)
570. Na opinião de Gratiolet, essa conformação
cerebral é peculiar ao macaco e ao homem, e
existe ao mesmo tempo nas túnicas cerebrais,
quando surgem, uma ordem geral, uma disposição
típica e comum às duas espécies. “Essa
uniformidade na disposição das pregas cerebrais,
no homem e nos símios, diz esse fisiologista,
merece a mais acurada atenção dos filósofos. Há
também um tipo particular de pregas nos makis,
nos ursos, felinos, caninos, etc.; enfim, para
todas as famílias animais. Cada qual tem suas
características, sua norma, e em cada grupo
podemos facilmente reunir as espécies pela só
confrontação das túnicas cerebrais”.[ii]
(Deus na
Natureza – Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
571. Parece que o pensamento é proporcional ao
número e à irregularidade das circunvoluções. O
homem, o orangotango e o chimpanzé têm
circunvoluções no lobo médio, ao passo que nas
outras espécies de macacos e nos outros animais
esse lobo é absolutamente liso. A figura desses
sulcos e dos que descrevem meandros irregulares
nos outros lobos é tanto mais irregular, quanto
mais caracterizado o pensamento. Os animais
gregários como a foca, os elefantes, cavalos,
renas, carneiros, golfinhos, apresentam um
desenho menos regular que o dos outros animais.
Deste ponto de vista, o que sobretudo distingue
o cérebro humano do simiesco é que, entre as
circunvoluções que se dirigem do lobo occipital
para o temporal, duas há, no homem, que não se
encontram no macaco, sendo este um dos maiores
contrastes que separam os dois cérebros[iii].
(Deus na
Natureza – Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
572. Nas espécies animais e na humana, a
superioridade da inteligência parece tanto mais
elevada quanto mais sinuosas sejam as
anfratuosidades do cérebro, mais profundos os
sulcos e mais numerosas as impressões e
ramificações, a assimetria e irregularidade. As
estrias, muito visíveis no cérebro do adulto,
não se evidenciam no da criança. O cérebro de
Beethoven apresentava anfratuosidades duplamente
mais profundas que os cérebros comuns[iv].
Poderão alguns anatomistas responder que grandes
animais muito broncos, tais como o asno, o
carneiro, o boi, apresentam maior número de
circunvoluções que animais de maior inteligência
quais o cão, o castor, o gato. Mas, é preciso
não esquecer os matemáticos e considerar que os
volumes são, entre eles, como os cubos dos
diâmetros; ao passo que as superfícies são como
os quadrados entre si.
(Deus na Natureza
– Terceira Parte. A Alma. O Cérebro.)
573. O volume do cérebro do tigre está para o
seu corpo na mesma razão que o do gato; mas a
superfície é proporcionalmente menor e, para
atingir um igual desenvolvimento, é preciso que
ela se retraia e se enrole. Estas circunvoluções
têm, sem dúvida, a sua importância, mas era
natural se imaginasse que o peso comparativo do
cérebro das diferentes espécies deve ter não
menor importância e que as suas variantes na
espécie humana devem ser tomadas em
consideração. De fato, parece que os seus
efeitos estejam em proporção com a massa. Assim
é que, na criança e no velho, ele é menor que no
homem maduro. A alma da criança como que se
desenvolve, à medida que aumenta a substância
cerebral. (Deus na Natureza – Terceira Parte.
A Alma. O Cérebro.)
574. O peso normal de um cérebro humano é de
três a três meia libras[v].
O peso do cérebro dos cretinos desce, por vezes,
a uma libra (453 gramas). O de Cuvier pesava
mais de 4 libras. O tamanho, a forma, o arranjo
da composição do cérebro, são também invocados
pelos anatomistas como correlatos à inteligência[vi].
A Anatomia comparada mostra-nos, em toda a
escala animal, inclusive o homem, que a energia
da inteligência está em relação constante e
ascendente com a constituição material e o
tamanho do cérebro. Os acéfalos são os que
ocupam o primeiro grau da escala. O homem,
supõe-se, tem o maior cérebro real, pois, ainda
que o de alguns animais, no conjunto, sejam mais
volumosos, o humano é o mais considerável nas
partes que dizem com as funções do pensamento. O
resultado geral das operações anatômicas
demonstra que a diminuição do cérebro animal
aumenta à proporção que baixa a escala
zoológica, e que os animais dos primeiros
degraus, como sejam os anfíbios e os peixes, são
os de menor cérebro.
(Deus na Natureza – Terceira Parte. A Alma. O
Cérebro.)
575. Esses fatos gerais não deixam de ter
exceção, como veremos daqui a pouco, mas
cumpre-nos expô-los conscienciosamente, antes de
os discutir ou explicar. A convicção da grande
importância que tem a conformação cerebral, nos
mamíferos, chegou a ensejar a proposta de uma
nova classificação baseada nessa conformação. A
nós nos parece, contudo, que não é tanto no peso
absoluto do cérebro, como na sua relatividade
com o peso do corpo, que devemos atentar. Seja o
cérebro do elefante ou do hipopótamo mais pesado
que o de qualquer rapariga, não há nisso nenhum
caráter distintivo, favorável aos primeiros. É
mais razoável considerar as relações, sem chegar
a concluir daí que o cérebro de um magro
pensaria melhor que o de um gordo. Sob este
aspecto, os macacos e as aves ocupam a primeira
linha. O cérebro do asno não pesa mais que 250
partes do corpo; ao passo que o do rato dos
campos corresponde a trinta e uma partes, o que
levava o espirituoso Andrieu a dizer que os
ratos tinham um focinho muito espiritual.
(Deus na Natureza – Terceira Parte. A Alma. O
Cérebro.)
576. Como circunvoluções, peso absoluto, peso
relativo, deixassem grandes incertezas sobre as
relações do cérebro com o pensamento, supuseram
que a superioridade do ser estaria em relação
com a quantidade de gordura contida no cérebro.
O homem tem no cérebro mais gordura que os
mamíferos, e estes mais que as aves. A massa
cerebral do bovino não atinge a 1/6 da do homem[vii].
O que caracteriza o cérebro do feto, durante a
gestação, é o fato de não conter quase gordura,
sobretudo fosforada. Nos recém-nascidos a
gordura já se encontra assaz aumentada e, daí
por diante, avulta rapidamente com a idade. A
distinção racial não se nota no cérebro da
criança, branca ou preta. São crânios que
apresentam as maiores semelhanças.
(Deus na Natureza – Terceira Parte. A Alma. O
Cérebro.)
(Continua no próximo número.)
[i]
Leçous sur I’Homme, 3º.
[ii]
Gratiolet – Anales des Sciences Natur,
3ª série, t. 14º página 186.
[iii]
Tiedemann – Das Hirn des Negers mit
dem des Europaers und Ouran-Outang
verglichen.
[iv]
Wagner – Procès-verbal de dissetion.
[v]
Veja-se Vogt, Hoffmann, Tiedemann e
Lauret. Schneider avalia-o em 3 libras;
Pozzi em 3 libras e 8 onças; Sennert
atribui-lhe 4; Arlet 4 e 3 onças, Haller
4, Bartholin 4 a 5, Picolhuomini mais de
5. Lelut admite 1 quilo, 320 gramas para
os cérebros comuns, de 20 a 25 anos, e
Parchappe 1 quilo e 325 gramas.
[vi]
Preciso é, com efeito, reunir estes
diferentes caracteres para poder
estabelecer uma relação entre o cérebro
e o Espírito. Não bastaria, para tanto,
o peso real. “Afirmou-se outrora, diz
Charles Vogt, que, de todos os animais,
o homem era o que tinha o cérebro mais
pesado. É uma verdade, mas não absoluta,
porquanto não tardou que os colossos
inteligentes do reino animal, quais o
elefante e os cetáceos, demonstrassem o
exíguo valor dessa proposição. Disseram
então que, não sendo o peso absoluto,
seria, ao menos, o relativo. Em média, o
peso do corpo humano está para o do
cérebro na razão de 36:1, ao passo que
nos mais inteligentes ele raramente
passa de 100:1. Entretanto, se os
gigantes contrariam a primeira
proposição, temos que os anões afirmam a
segunda. A chusma de pequenas aves
canoras apresenta uma relação de peso
muito mais favorável do que a cifra
normal humana e os pequenos macacos
americanos oferecem um peso muito
superior ao do rei da criação.” Vogt
pensa, com razão, que, se o peso do
cérebro pudesse ser comparado com
qualquer outro fator numérico tomado do
corpo humano, esse fator só poderia ser
uma extensão, que, inteiramente sujeita
à flutuação, seria, por isso mesmo,
muito limitado. Melhor conviria, talvez,
tomar o comprimento da coluna vertebral
para termo de relação com o peso do
cérebro. Homens que nos parecem estar no
mesmo nível intelectual, podem,
certamente, ter cérebros de peso
desigual; homens notáveis podem
apresentar pesos inferiores aos de
craveira medíocre; mas isso não impede
que haja uma relação aproximativa do
peso com o grau da inteligência e que a
determinação dessa relação seja um fator
que se deva, de qualquer forma,
desprezar.
[vii]
Von Bibra – Vergleichend
Untersuchungen über das Gehirn des
Menschen und der Werbetihiere, 129.