A leitora Maria Lúcia N. Tavares, em mensagem enviada à
revista, indaga-nos:
Qual é, na verdade, a posição de Allan Kardec com
relação aos ensinamentos espíritas face ao avanço da
ciência? Se a doutrina dos espíritos ficar estagnada no
que foi estabelecido em meados do século 19, existe
algum perigo de se ver ridicularizada ou paralisada no
tempo, como acontece com determinadas igrejas que
parecem agir na contramão do progresso científico?
São duas as proposições apresentadas pela leitora.
Quanto à posição de Kardec com relação ao avanço
científico, eis o que ele escreveu:
“O Espiritismo (...) não estabelece como princípio
absoluto senão o que se acha evidentemente demonstrado,
ou o que ressalta logicamente da observação. Entendendo
com todos os ramos da economia social, aos quais dá o
apoio das suas próprias descobertas, assimilará sempre
todas as doutrinas progressivas, de qualquer ordem que
sejam, desde que hajam assumido o estado de verdades
práticas e abandonado o domínio da utopia, sem o que ele
se suicidaria. Deixando de ser o que é, mentiria à sua
origem e ao seu fim providencial. Caminhando de par com
o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado,
porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em
erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria
nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a
aceitará.” (A Gênese, cap. I, item 55.)
O entendimento acima foi reiterado pelo codificador da
doutrina espírita em outro momento da mesma obra,
quando, linhas adiante, afirmou que as religiões, e não
apenas a doutrina espírita, devem caminhar lado a lado
com a Ciência.
Em um texto que ele inseriu no cap. IV, Kardec lembra
que as religiões jamais ganharam coisa alguma em
sustentar erros manifestos.
O raciocínio é muito simples. A missão da Ciência é
descobrir as leis da Natureza. Ora, sendo essas leis
obra de Deus, não podem ser contrárias às religiões que
se baseiem na verdade. Dessa forma, lançar anátema ao
progresso, por atentatório à religião, é lançá-lo à
própria obra de Deus.
Trata-se, aliás, de um trabalho inútil porque nem todos
os anátemas do mundo são capazes de obstar a que a
Ciência avance e a verdade abra caminho. Se a Religião
se nega a avançar com a Ciência, esta avançará sozinha.
Somente as religiões estacionárias podem, pois, temer as
descobertas da Ciência, as quais só são funestas àquelas
que se deixam distanciar pelas ideias progressistas,
imobilizando-se no absolutismo de suas crenças. Agindo
assim, demonstram fazer mesquinha ideia da Divindade,
visto que não compreendem que assimilar as leis da
Natureza, que a Ciência revela, é glorificar a Deus em
suas obras. (Cf. A Gênese, cap. IV, itens 9 e
10.)
Quanto à segunda proposição, entendemos que é um exagero
dizer que o Espiritismo possa ser um dia ridicularizado
pela Ciência, uma vez que seus fundamentos, ao
contrário, têm sido fortalecidos e não enfraquecidos com
o passar dos anos.
Imortalidade da alma, pluralidade das existências,
comunicação com os mortos, existência de vida em outros
mundos – são princípios fundamentais do Espiritismo que
ganham a cada dia novos adeptos, pela força dos
fenômenos e pelo avanço do conhecimento científico. As
pesquisas conduzidas seriamente, os filmes, as novelas,
as séries de TV, livros de autores encarnados e
desencarnados, tanto quanto os congressos na área
médico-espírita, provam isso.
Não podemos ignorar que a Doutrina Espírita foi
codificada há mais de 160 anos em uma época em que nem
luz elétrica havia. Surgiram depois disso a eletrônica,
a teoria da relatividade, a física quântica, o avião, as
viagens espaciais, a TV, o cinema, o rádio, o
computador, a internet... Nada, porém, foi capaz de
balançar um só dos fundamentos espíritas, contrariamente
ao que ocorre com as chamadas religiões dogmáticas, que
têm dificuldade em conciliar seus dogmas com o avanço
vertiginoso do conhecimento científico e tecnológico.