A. Há no
sistema
apresentado
por Darwin
uma certa
reserva
favorável à
ideia de
Deus?
Sim. Isso
está bem
visível em
sua obra,
embora o
fato não
agradasse
aos
materialistas
radicais. A
reação de
sua
tradutora
francesa,
senhorita
Clemência
Royer,
comprova-o
com a
censura que
fez a Darwin
pelo fato de
se deixar
levar pela
ideia de um
Ser supremo.
“O Sr.
Darwin não
me parece
bastante
corajoso” –
disse ela no
prefácio de
sua
tradução.
Ela não
tolerava que
se pudesse
tomar Deus a
sério,
ridiculizava
os teólatras,
sapateava
sobre os
destroços do
teísmo e
fulminava os
defensores
de uma
Entidade
suprema. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
B. Segundo
os mestres,
a ação
constante de
Deus vale
para
explicar
tanto a
origem como
a
sucessividade
das coisas?
Sim. Ao
pensar dos
mestres, não
há solução
de
continuidade
na obra da
Criação;
seus
discípulos,
porém,
pretendem
ultrapassar
os mestres e
desnaturam
as teorias
de que se
dizem
defensores.
Vale a
propósito
lembrar o
que disse o
autor da
teoria da
unidade de
plano,
Geoffroy
Saint-Hilaire.
O sábio
fisiologista
afirmou bem
alto que via
na sucessão
das espécies
“uma das
mais
gloriosas
manifestações
da Potência
criadora,
tanto quanto
um motivo de
maior
admiração,
de
reconhecimento
e de amor”. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
C. Ainda que
admitamos
que os
homens, os
animais, os
seres e as
plantas se
tenham
formado pela
ação de uma
força
natural, em
que isso
prova que
Deus não
existe?
Flammarion
entende que
nada disso
provaria a
inexistência
de Deus, mas
sim, a
contrário,
que Deus
existe. Qual
a origem de
tal força?
Em verdade,
diz
Flammarion,
o que se dá
é que, em
vez de Deus
se nos
revelar como
pedreiro,
ele se nos
revela como
arquiteto –
o grande
arquiteto do
Universo,
cujas leis,
tão sábias,
devemos à
sua
sabedoria e
genialidade.
Com efeito,
é preciso
cerrar
preconcebidamente
os olhos
para que se
não veja
nessa força
íntima da
Natureza o
efeito de um
pensamento
inteligente.
É preciso
ser cego
para
desprezar o
indício
evidente de
uma causa
poderosa e
eterna. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
Texto para
leitura
903. Darwin
não tem
razão de
julgar que a
origem do
órgão visual
importa tão
pouco quanto
a da própria
vida, e nós
gostaríamos
de saber se,
para ele,
essa origem
elementar
oferece
alguma
semelhança
com a
sensibilidade
do iodo à
luz,
verificada
na chapa
fotográfica.
Mas, visto
que ele se
cala, vamos
admitir
provisoriamente
a
possibilidade
do fato, e
ouçamos o
desenvolvimento
da teoria do
progresso:
“Entre os
vertebrados
vivos não
encontramos
grande
variedade de
olhos; nos
articulados,
porém,
podemos
acompanhar
toda uma
série,
partindo do
simples
nervo ótico,
recoberto de
camada
pigmentar e
formando, às
vezes, uma
espécie de
pupila,
embora
sempre
desprovido
de lente ou
qualquer
mecanismo
ótico.
Depois desse
olho
rudimentar,
capaz apenas
de só
diferençar a
luz da
obscuridade,
deparam-se-nos
duas séries
paralelas de
órgãos
visuais,
cada vez
mais
perfeitos,
entre as
quais,
Muller diz
haver
diferenças
fundamentais:
– a dos
olhos
chamados
simples,
providos de
lente e
córnea, e a
dos
complexos,
que excluem
os raios
convergentes
de todo o
campo
visual,
exceto o
pincel
luminoso,
que chega à
retina
seguindo uma
linha
perpendicular
ao seu
plano.” (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
904. O
grande
advogado da
seleção
natural
pensa que,
admitindo
originariamente
nos
primeiros
organismos a
existência
de um nervo
sensível à
luz,
poder-se-á
admitir que
a Natureza,
em virtude
dessa lei
organizadora
do
progresso,
chega
insensivelmente
aos
aparelhos
óticos,
sejam
cônicos,
sejam
lenticulares,
perfeitos. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
905. Os
seres
favorecidos
com esse
nervo
maravilhoso
dele se
utilizaram e
o
aperfeiçoaram
em benefício
próprio. “Se
refletirmos
– diz ele –,
na variedade
de graus que
apresenta a
estrutura
ocular dos
nossos
crustáceos e
nos
lembrarmos
do número de
espécies
extintas,
não vejo
dificuldade
alguma e,
sobretudo,
uma
dificuldade
maior que a
relativa a
outro órgão
em admitir
que a
seleção
natural haja
transformado
um aparelho
simples,
apenas
constituído
de um nervo
ótico
pigmentado e
revestido de
membrana
transparente,
num
instrumento
tão perfeito
qual o podem
possuir
quaisquer
representantes
da grande
família dos
articulados.” (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
906. Parece
muito
natural
comparar o
órgão visual
a um
telescópio.
Ora, sabemos
nós que este
instrumento tem
sido
sucessivamente
aperfeiçoado
graças a
esforços
perseverantes
de
inteligências
humanas, de
ordem
superior, e
assim
inferimos a
formação do
olho
mediante
análogo
processo. “Será
uma indução
muito
presunçosa?”
– pergunta
ele com
alguma
razão. Que
direito
temos de
afirmar que
o Criador
opera com o
concurso das
mesmas
faculdades
intelectuais
do homem? (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
907. Nada
obstante a
advertência,
Darwin
prossegue
aplicando à
obra divina
as ideias
afloradas em
seu cérebro.
Eis como
expõe ele a
formação
lenta, nas
espécies
vivas, do
instrumento
ótico que
nos faz ver.
É uma
hipótese sem
maldade
preconcebida:
“Precisamos
figurar um
nervo
sensível à
luz,
colocado
atrás de
espessa
camada de
tecidos
transparentes,
contendo
espaços
cheios de
fluidos;
depois, aí
poremos que
cada parte
dessa camada
transparente
muda
contínua e
lentamente,
de
densidade,
de maneira a
separar-se
em camadas
parciais,
diferentes
em densidade
e espessura,
colocadas a
distâncias
variáveis
entre si e
cujas duplas
superfícies
mudam
lentamente
de forma.
Além disso,
é preciso
admitir
exista um
poder
inteligente
e esse poder
inteligente
é a seleção
natural,
constantemente
alertada de
toda e
qualquer
alteração
acidental
das camadas
transparentes,
a fim de
escolher,
solícitas,
aquelas que
por
circunstâncias
diversas
podem, de
algum modo e
em grau
qualquer,
favorecer a
produção de
imagens mais
nítidas.
Podemos
ainda supor
que esse
instrumento
foi
multiplicado
por um
milhão, em
cada um
desses
estados de
perfectibilidade,
e que cada
uma dessas
formas se
perpetuasse,
até que se
lhe
apresentasse
ensejo de
melhora,
permitindo o
quase
imediato
abandono e
destruição
da antiga.
“Nos seres
vivos, a
variabilidade
produzirá as
ligeiras
modificações
do
instrumento
natural, a
descendência
multiplicá-la-á
ao infinito,
assim
modificada,
e a seleção
natural
escolherá,
com
infalível
habilidade,
cada novo
aperfeiçoamento
realizado.
Que este
processo
continue
operante por
milhões e
milhões de
anos e, em
cada ano,
influindo
sobre
milhões de
indivíduos
de todas as
espécies, já
não será
impossível
acreditar
possa
constituir-se
assim um
aparelho de
ótica viva,
com
requisitos
superiores
aos de nossa
manufatura,
ou seja, com
a
superioridade
característica
das obras
divinas em
relação às
humanas.” (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
908. Os
observadores
podem
assinalar no
sistema
darwiniano
uma certa
reserva
favorável a
Deus, mas
essa reserva
não quadra
aos
materialistas
radicais.
Até a sua
tradutora
francesa,
senhorita
Clemência
Royer,
censura-o
com
veemência,
por
desviar-se
em tão bela
rota e ainda
se deixar
levar pela
ideia de um
Ser supremo.
“O Sr.
Darwin não
me parece
bastante
corajoso –
diz ela no
seu
prefácio. –
Será por
prudência
que não vai
ao fim do
seu sistema,
detendo-se a
meio da
cadeia das
respectivas
consequências?
Quando
espíritos
ardorosos,
senão mais
lógicos,
formularam
consequências
extremas, o
mundo dos
puritanos,
escandalizado
com a tese
de que o
planeta não
descendia em
linha reta
da coxa de
algum deus,
protestou em
altos
brados”.
Essa moça,
ao menos,
vai até o
fim; não
tolera que
ainda se
possa tomar
Deus a
sério,
ridiculiza
igualmente
os
teólatras,
sapateia
sobre os
destroços do
teísmo e
fulmina os
defensores
de uma
Entidade
suprema.
Vira a cara
a todo e
qualquer
sintoma de
ideia
religiosa e
abre os
braços aos
declamadores
alemães. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
909. Só há
um pequeno
defeito de
lógica
nesses
exímios
pensadores,
qual o de
ser essa
presumida,
rigorosa
lógica,
soberanamente
ilógica,
ainda mais
quando os
fatos e
teorias
consignados
pelos
darwinistas
não
comportam as
consequências
ridículas
que lhes
atribuem. E
o mais
curioso em
tudo isto é
que esses
espíritos
fortes –
atordoados
com a sua
exaltação –
não percebem
a lacuna,
que
persistem em
manter,
entre as
premissas e
conclusões
do seu
raciocínio.
Sua maneira
de falar
compara-se a
uma rota
traçada em
altiplano e
seccionada a
meio do seu
curso por um
abismo
profundo,
qual os que
soem separar
bruscamente
duas
galerias. As
extremidades
da rota não
estariam mal
feitas nem
mal
traçadas,
mas,
infelizmente,
não se pode
caminhar de
ponta a
ponta, de
vez que o
abismo as
isola
irremediavelmente.
E isso
porque
lançar aí
uma ponte é
mais difícil
do que
parece. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
910. Ao
pensar dos
mestres, não
há solução
de
continuidade
e a ação
puramente
constante de
Deus vale
para
explicar
tanto a
origem como
a
sucessividade
das coisas:
os
discípulos,
porém,
pretendem
ultrapassar
os mestres e
desnaturam
as teorias
de que se
dizem
defensores.
Pobres
defensores!
Temos já
visto como
raciocinam
os
experimentadores.
Vamos
registrar a
opinião do
autor da
teoria da
unidade de
plano,
Geoffroy
Saint-Hilaire.
Ao invés de
pender para
as negações
que hoje nos
opõem, o
sábio
fisiologista
se julga no
dever de
afirmar bem
alto que,
antes, vê na
sucessão das
espécies
“uma das
mais
gloriosas
manifestações
da Potência
criadora,
tanto quanto
um motivo de
maior
admiração,
de
reconhecimento
e de amor”[ii]. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
911.
Digamo-lo
com firmeza:
mesmo
admitindo,
sem
reservas,
todos os
fatos
invocados
pelos
materialistas;
mesmo
perfilando-nos
ao lado de
Darwin,
Owen,
Lamarck,
Saint-Hilaire
e,
sobretudo,
com estes
(porque há
sempre gente
mais
realista do
que o rei),
para supor
que os
olhos, os
sentidos, os
homens, os
animais,
seres e
plantas
vivos, em
suma, se
tenham
formado pela
ação
permanente
de uma força
natural, nem
por isso se
provaria a
inexistência
de Deus,
mas, ao
invés, que
Deus existe.
Na
realidade, o
que se dá é
que, em vez
de se nos
revelar como
pedreiro,
ele se nos
antolha como
arquiteto. E
com isto,
cremos, nada
perde, nem
muito, nem
pouco. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
912. Em
nosso estudo
geral da
Força e da
Matéria
acompanhamos
essa
metamorfose
da ideia de
Deus. Do
ponto de
vista da
destinação
dos seres e
das coisas,
a ideia
correlativa
sofre a
mesma
progressão;
longe de
enfraquecer
a antiga
beleza do
plano
criador, ela
o desenvolve
e reforça
grandemente.
Se, em vez
de uma mão a
construir o
protótipo de
cada espécie
animal e
vegetal,
admitirmos
uma força
íntima,
aplicada à
matéria,
isso em nada
afeta a
ideia de uma
inteligência
criadora e
da
finalidade
da Criação.
Porque, na
verdade, é
preciso
cerrar
preconcebidamente
os olhos,
para que se
não veja
nessa força
íntima da
Natureza o
efeito de um
pensamento
inteligente.
É preciso
ser cego
para
desprezar o
índice
evidente de
uma causa
poderosa e
eterna. (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
913.
Pretender
que a
Natureza se
forme de si
mesma e
progrida
instintivamente,
numa direção
constante
para
resultados
cada vez
mais
perfeitos, é
confessar em
parte que
ela se
encaminha a
esse ideal
devido a uma
causa
inteligente.
Como poderia
a matéria
inerte ter
tido a ideia
de se
enformar
sucessivamente
como
vegetal,
como animal,
como homem,
engendrando
todos esses
órgãos que
constituem o
ser vivente
e conservam
a vida
através dos
séculos?
Como
construir
esses
aparelhos
mediante os
quais o ser
vivo se
comunica
permanentemente
com as
causas que o
não
constituem?
Por que
capricho do
acaso esses
órgãos se
teriam
gradativa e
lentamente
formado para
essa
comunicação
dos
sentidos,
ligados ao
cérebro
pensante,
que, só ele,
conhece e
julga? Como
explicar a
técnica
perfeita
dessas
construções?
Por que
completos e
não falhos,
esses
aparelhos,
em sua
grande
maioria?
Como, em sua
integridade,
por geração,
se perpetuam
esses
organismos
vivos? Por
que a
Criação
composta de
gêneros, de
espécies, de
família? Por
que pode o
espírito
humano
estabelecer
classificação
baseada no
conjunto dos
seres? Como
reconhecemos
em tudo isso
uma ordem
geral? Por
que a
Natureza não
representa
um caos de
monstruosidades? (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.)
914. A todas
estas
perguntas
respondem-nos
com a lei de
seleção
natural.
Explicam
todos os
problemas
repetindo
que a
Natureza é
arrastada a
um progresso
incessante,
que despreza
o mau pelo
bom e tende
sempre a
realizar
formas mais
perfeitas.
Mas, em
suma, que é
que vem a
ser essa
tendência,
esse
progresso
instintivo,
essa
necessidade
de
engrandecimento,
senão o ato
de uma força
universal
dirigindo o
mundo para o
ideal? Que
significa
essa marcha
simultânea
de todos os
seres para a
perfeição,
senão a
revelação
eloquente de
uma causa,
que sabe
onde e como
conduz o
carro, sem
que a
matéria
servil
pudesse
jamais
opor-lhe o
mínimo
obstáculo? (Deus
na Natureza
– Quarta
Parte. Plano
da Natureza
- Construção
dos Seres
Vivos.) (Continua
no próximo
número.)
[i] Principes
de
Philosophie
Zoologique.
[ii] Principes
de
Philosophie
Zoologique.