Logo no início das psicografias, os melhores poemas
escritos por Chico Xavier eram obras sem dono. O poeta
negava a autoria dos versos. Estes apareciam quando o
rapaz, aflito, sentia uma pressão na cabeça como se um
cinto de chumbo comprimisse seu cérebro - e um peso no
braço direito, como se ele se transformasse numa barra
de ferro e fosse arrastado por forças poderosas.
Os textos se acumulavam anônimos e repetiam a mesma cartilha:
amor, compreensão, tolerância. Os companheiros do centro liam a
papelada e sugeriam a publicação. Só havia um problema. Quem
assinaria as obras? Chico consultou o irmão, José Cândido, e
eles decidiram pedir conselhos ao diretor do jornal espírita
carioca Aurora, Inácio Bittencourt. O jornalista
convenceu o rapaz de Pedro Leopoldo a colocar seu nome embaixo
dos poemas. "F. Xavier" começou a aparecer em várias publicações
com o consentimento dos escritores invisíveis.
Chico nunca se esqueceu de como o soneto "Nossa Senhora da
Amargura" chegou às suas mãos e se espalhou pelo papel. Uma
noite, ele rezava quando viu aproximar-se uma jovem reluzente.
Ela pediu papel e lápis e começou a escrever. A aparição chorava
tanto que Chico começou a se debulhar em lágrimas também. No
final das contas, ele já não sabia se os seus olhos eram os dela
ou vice-versa. Muito mais tarde identificaria a dona daquelas
pupilas: a poeta Auta de Souza, do Rio Grande do Norte, que
morreu em 1901, com 24 anos. Na época, ele assinou embaixo F.
Xavier - e se sentiu culpado quando recebeu de um crítico
português uma carta recheada de pontos de exclamação e adjetivos
entusiasmados. “Recebi elogios por um trabalho que não me
pertencia”, disse ele.
Do livro As vidas de Chico Xavier, de Marcel Souto Maior.
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