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por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

 

A importância da Hipótese SAL

 

É normal, desejável e aconselhável que qualquer pessoa, ao longo da sua vida: se esforce por construir a sua própria imagem, a sua personalidade, o seu caráter; que adote e pratique princípios e valores; que não se envergonhe de exteriorizar os seus sentimentos e emoções, mesmo que outras pessoas pensem que tudo isto é sinal de fraqueza, lamechices, designadamente quando existentes num homem que, ainda segundo certas mentalidades, deve transmitir e revelar comportamentos ditos e tidos por virilidade, coragem, força, superioridade e outras adjetivações próprias, também, de um certo culto masculino de forte personalidade, assim considerada quando reúne aqueles qualificativos.

Quando se reflete sobre princípios, valores, sentimentos e emoções, gestos, atitudes, comportamentos, e se pretende adotá-los para construir uma identidade cívico-profissional e ético-moral, entre outras dimensões da constituição da pessoa verdadeiramente credível e respeitável, pensa-se numa perspectiva civilizacional moderna, irredutivelmente humanista, em ordem ao bem público e, legitimamente, em benefício próprio, de todo um agregado familiar e coletivo.

É claro, e ninguém prova o contrário, por nenhum recurso técnico-científico, político-religioso, ético-moral e socioprofissional que é totalmente perfeito ou que é o que parece e vice-versa, por muito boas que sejam as opiniões públicas e/ou a opinião publicada a nosso respeito, porque durante a vida aprende-se que, por circunstâncias diversas, em muitos casos incontroláveis, alteramos, conscientemente, a nossa própria imagem, embora tal modificação não seja perceptível à análise de qualquer pessoa.

No decurso da nossa existência, de fato vamos construindo uma imagem que vai sendo aceita, valorizada, credibilizada, apontada, quantas vezes, como exemplo a seguir. Conquistam-se amizades, a boa reputação vai-se consolidando, as pessoas confiam cada vez mais e até, eventualmente, nos convidam para determinadas funções que aceitamos, ou não.

Daqui podem nascer, presumivelmente, pelo menos, duas novas identidades, que até podem ser mitigadas por uma terceira: ou nos tornamos vaidosos, egocêntricos, arrogantes, prepotentes e insensíveis perante situações sociais, dificuldades diversas, que as pessoas, algumas das quais até seriam nossas amigas, e começamos a agir como se de repente o mundo tivesse de girar à nossa volta, convencidos de que somos os melhores do planeta; ou então adotamos comportamentos de humildade, que por vezes até se configuram como próximos da autodesvalorização, baixa autoestima, rejeitando honrarias, benefícios e convites aliciantes, ainda que, possivelmente, rentáveis do ponto de vista material e no contexto de uma sociedade complexa, nem sempre justa, frequentemente inverdadeira. Acredita-se que é possível o meio-termo.

É muito provável que uma forte imagem de dignidade impoluta, de credibilidade irrefutável, de sociabilidade agradável, de competências diversas reconhecidas, construídas ao longo de décadas, venham a ser alteradas, precisamente porque este SAL da vida, cuja sigla significa: Solidariedade, Amizade e Lealdade, seja perturbado, e nos leve a cometer atos contrários à auréola que nos tem envolvido, e nos colocava no pedestal dos insuspeitos, do que quer que seja de criticável e até de condenável.

Com efeito, pode acontecer que para mantermos certos princípios, valores, sentimentos e emoções, perante uma dada situação, pessoa, grupo ou instituição, optemos por comportamentos incorretos, para com outras pessoas, sempre que estas atentam, precisamente, contra a dignidade, honra, reputação, bom nome e profissionalismo de nós próprios, dos nossos amigos, grupos e instituições, porque nós sentimos e exercemos, naturalmente, solidariedade, amizade, lealdade (o tal SAL da vida), bons e nobres sentimentos.

Em tais circunstâncias a imagem credível, da boa exemplaridade, de nobres valores, de excelentes colegas em quaisquer atividades, acaba por ser prejudicada e, paradoxalmente, até com notória ingratidão, pelas opiniões das pessoas, grupos e instituições, em relação aos quais nós nos vinculamos solidariamente. Ou seja: para que os princípios, valores, sentimentos e emoções sejam verdadeiros, em relação a uma dada pessoa, grupo ou instituição, deixamos de ter o mesmo comportamento para com as pessoas que de alguma forma molestam ou prejudicam aquelas com quem nos solidarizamos.

Novamente resultam, pelo menos, duas posições: ou continuamos fiéis para com as pessoas, grupos e instituições, com quem nos solidarizamos e afastamo-nos de todas as outras que lesaram, ou são hipócritas para com os nossos amigos, grupos e instituições e assumimos as consequências; ou então fazemos um jogo duplo com todo o mundo, traindo, simultaneamente, todas as pessoas que sobre nós formularam e divulgaram uma opinião positiva.

Por vezes, o “preço” a pagar pelo exercício de determinados valores, pela dádiva generosa de sentimentos, pela demonstração permanente e humilde de algumas emoções é muito alto porque: as pessoas, grupos e instituições com quem nos solidarizamos e apoiamos, incondicionalmente, incompatibilizando-nos com outras, acabam por nos abandonar, a tal ponto de: por um lado, nem sequer quererem saber da nossa situação, ao nível da saúde, trabalho, família, projetos e situação financeira; por outro lado, a nossa própria consciência acaba por nos julgar, por vezes, com assertivas e máximas bem justas e acertadas.

Coloca-se então a questão: teria valido a pena indispormo-nos contra determinadas pessoas, grupos e instituições, para mantermos a nossa solidariedade, amizade, lealdade e sentimentos com outras, verificando-se, depois, que estas, quando julgam que já não precisam de nós nos afastam e nos trocam, e/ou se mantêm ligadas e, eventualmente, interagindo, paradoxalmente, ou não, com as que estiveram na origem das nossas tomadas de posição, justamente para mantermos a consideração, a estima e o respeito por elas?

Afigura-se, cada vez com mais evidência, que é difícil desenhar-se uma personalidade de exemplaridade positiva, de bons princípios, valores, sentimentos e emoções, isto por vários motivos: primeiro, todos nós somos extremamente vulneráveis a situações que não controlamos, seja no âmbito racional, seja no quadro emocional; segundo, porque nos enganamos, frequentemente, em relação a quem demos todo o SAL da nossa vida – Solidariedade, Amizade e Lealdade – da nossa própria imagem, construída, quantas vezes, ao longo de uma vida; terceiro, porque com muita facilidade certos interesses, situações e pessoas conseguem influenciar, contra nós, aqueles por quem tudo demos, a quem tudo confiamos e que, pensando eles que somos humildes, aparentemente fracos, que não temos nenhum tipo de influências sociomateriais, já não servimos para mais nada, passam-nos, então, para o grupo dos indesejáveis, descartáveis.

Quando alguém é contemplado com avaliações positivas, gerais e/ou específicas, isso não quer dizer que a pessoa beneficiária de tal apreciação seja perfeita, que não tenha cometido erros, que seja inatacável. As opiniões favoráveis até podem ser amplamente consensuais, mas haverá sempre alguém que sabe, eventualmente, que aquela pessoa tem falhas, seja na família, nas amizades, no trabalho, nos estudos, na sociedade, mas também poderá ser verdade que tais falhas e erros se ficam a dever, justamente, ao preço do tal SAL – Solidariedade, Amizade e Lealdade – que essa mesma pessoa sabe que foi por causa dela, que a primeira cometeu erros, porque de resto, a pessoa aureolada com uma boa imagem pessoal, pública ou privada é merecedora deste prestígio.

Se pensarmos o seguinte: Se uma determinada pessoa é muito querida na sociedade, no seu círculo de amigos, de colegas de trabalho e na família, é porque ela tem manifestado e exercido princípios, valores, sentimentos e emoções que justificam o seu prestígio, mas eu sei que, por minha causa, tal pessoa traiu parte do seu comportamento cordial para com outras pessoas, para poder estar sempre do meu lado, solidária, amiga, leal, então, eu devo expressar-lhe, em quaisquer circunstâncias e tempos da vida, amizade, consideração, estima e iguais valores, bem como a minha ilimitada gratidão.

Quando assim não acontece e alguém nos quer mal, e conhece esta nossa fragilidade, de fato pode destruir uma imagem de respeito, credibilidade, honorabilidade, reputação, bom nome e dignidade. Então, é este o “preço” elevadíssimo que se paga quando somos solidários, amigos incondicionais, leais e cúmplices, aqui no bom sentido, mesmo que tenhamos de violar comportamentos gerais, e alterar uma excelente personalidade que fomos construindo ao longo da vida, precisamente para estarmos sempre do mesmo lado, na circunstância, da mesma pessoa, grupo ou instituição.

Como corolário, talvez se possa admitir que: primeiro, somos merecedores de apreciações positivas, apesar da imperfeição de que estamos “inquinados”, da subjetividade de quem as produz e da inacessibilidade à verdade por parte da opinião pública geral; segundo, porque ao tomarmos uma posição solidária, de amizade e lealdade para com alguém, não temos condições objetivas para igual procedimento para com quem é prejudicial à pessoa que nós defendemos (não se pode estar ao mesmo tempo com o amigo e o inimigo do meu amigo); terceiro, somos o que em dado momento as circunstâncias da vida nos impõem, porque em situações-limite temos de decidir, e nenhuma tomada de posição agrada a “gregos e troianos”, quando uma das partes não se identifica com os fundamentos da decisão.

Ignorar que há sempre alguém que conhece fatos, sentimentos, atitudes, erros, ilegalidades e situações diversas, ocorridos em nossas vidas, que não abonam favoravelmente a nosso favor, é uma imprudência e revela alguma ingenuidade, ou então um excesso de aparente firmeza, que só tem paralelo nos comportamentos arrogantes e mesquinhos.

Como muito bem refere a sabedoria popular: “toda a gente tem, pelo menos, uma telha de vidro no seu telhado”. Significa, portanto, que todos temos algo a esconder, todos temos um ou mais segredos, e que sempre haverá alguém que conhece um bocadinho das nossas vidas. Então sejamos cuidadosos, humildes e tolerantes quando estamos a fazer juízos de valor.

É verdade que este SAL - Solidariedade, Amizade, Lealdade -, se “paga”: pela positiva, com a reciprocidade e gratidão, por quem dele é beneficiário; pela negativa, por quem dele se sente prejudicado e não tem a capacidade de separar as diversas situações, retribuindo com valores negativos, como: a injúria, a difamação, a ofensa, a vingança, a perseguição, quantas vezes até a destruição da personalidade e da própria vida, de quem não abdica de ser solidário, amigo e leal, de quem faz, deste SAL, um ideal e uma orientação de vida.

Como diria Jesus: “Este é o Caminho, a Verdade e a Luz”, isto é, sermos compreensivos, tolerantes, abertos ao nosso próximo, ao mundo e a Deus é o procedimento justo, todavia, sem abdicarmos dos nossos princípios, valores, sentimentos, honra, bom nome e dignidade e, quem nos quer bem, quem é, verdadeiramente, nosso amigo, aceita e retribui esta nossa posição, com amizade, carinho e respeito, e até nos ajuda neste rumo de nobreza.


 

 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita