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por Rogério Coelho

 
Os implacáveis misoneístas de sempre!


A perseguição é o batismo de toda ideia nova, grande e justa


“(...) Perdoa-os Pai, porque não sabem o que fazem...” 
- Jesus. (Lc., 23:43)


É fato comum e notório que toda novidade, no âmbito das ideias renovadoras e das invenções, desperta a repulsa, a aversão das criaturas de mentes engessadas em seus mundinhos frágeis e estagnados. Assim aconteceu perante todos os vanguardistas que tiveram acerbas lutas contra o apoucamento intelectual de seus contemporâneos, pois, em todas as épocas, os grandes vexilários das alterações do “status-quo” sofreram a incompreensão e a onipresente inveja das pessoas que orbitavam em torno de seus passos. 

Sócrates foi obrigado a beber cicuta porque suas ideias eram muito revolucionárias para o entendimento da época de ignorância em que vivia; Franklin, Pasteur, Fulton foram criaturas nobres ridiculizadas pelas academias científicas de suas épocas; Cristo foi crucificado por maquinações da inveja da casta sacerdotal e do farisaísmo hipócrita que se sentiram diminuídos ante a Sua inquestionável grandeza. A lista é grande... E o Espiritismo também experimentou e ainda experimenta a acidez de críticos misoneístas, sempre de plantão em todos os tempos...

Deolindo Amorim aborda[1]magistralmente a atuação maléfica dessas criaturas que apontam seus dardos ferintes para os espíritas, para Kardec em especial, e para a Doutrina Espírita, ao falar sobre o Espiritismo e o problema da crítica. Diz o nobre beletrista: “desde o começo, e é fato histórico, os princípios espíritas sempre foram criticados aprioristicamente, na maioria dos casos... Nenhuma investida crítica, entretanto, invalidou qualquer princípio da Doutrina. No começo, exatamente na segunda metade do século XIX, como acontece com todas as ideias renovadoras, pois a Doutrina havia sido lançada com O Livro dos Espíritos, em 1857, como sabem muito bem os espíritas, as críticas vinham de pontos diversos. Algumas objeções, pela superficialidade das alegações, apenas denunciavam um fenôme­no psicológico muito frequente em todos os tempos: a resistência sistemática a qualquer ideia nova. Criaram-se, dessa forma, diversos sistemas de negação, cada qual tentando explicar o fenômeno da ‘comunicação do além-túmulo’ a seu modo. O fato em si não era novo, pois sempre houve comunicação mediúnica, desde que ‘o mundo é mundo’, como se diz em linguagem popular. Mas a interpretação espírita era realmente uma ideia nova, em contraposição a certas ideias religio­sas ou ainda em desacordo com algumas opiniões, aceitas pelo consenso, sem exame e sem crítica.

O chavão do charlatanismo, a que recorreram alguns adversários iniciais do Espiritismo, não tem argumento. Os fenômenos da mediunidade seriam ‘expli­cados’ apenas pela esperteza ou astúcia de uns tantos indivíduos... Invocou-se a loucura ou alucinação como causa de certos estados especiais, atribuídos à inter­venção de Espíritos. Outras hipóteses, igualmente destituídas de consistência, poderiam ser alinhadas aqui, a título de informação histórica. Mas não é necessário. A impugnação mais veemente, no entanto, e já seria de esperar, registrou-se na área religiosa, exatamente porque a Igreja apresentou logo a hipótese satânica, hoje completamente obsoleta: tudo era ‘arte diabólica’. Os Espíritos comunicantes seriam ‘demônios’ e, por isso mesmo, os médiuns deveriam ser colocados a grande distância, como criaturas perigosas, por serem dominados por ‘forças diabólicas’...

(...) Tendo surgido no ambiente francês do século XIX, a Doutrina Espírita teria de defrontar-se - inevitavelmente - com as ideias em choque: tradicionalismo, positivismo, ecletismo, evolucionismo etc. As objeções filosófi­cas, inspiradas na repulsa à metafísica, têm algum peso no processo crítico, evi­dentemente. Muitos críticos viam no Espiritismo, claro que por equívoco, uma espécie de "metafísica religiosa", uma doutrina que vinha restaurar a crença no sobrenatural. Na realidade, porém, o Espiritismo nada tem de sobrenatural, pois afirma justamente o contrário: os fatos chamados milagrosos ou sobrenaturais estão subordinados a leis naturais; o mundo espiritual, por sua vez, nada tem de imaginário ou fantasioso, pois é um mundo tão real como o nosso.  É o intercâmbio espiritual que no-lo demonstra. São dois planos da vida, sem solução de continuidade, segundo o ensino espírita”.

Não sem motivos, Allan Kardec afirma[2]: “(...) a perseguição é o batismo de toda ideia nova, grande e justa, e cresce com a magnitude e a importância da ideia. O furor e o desabrimento dos seus inimigos são proporcionais ao temor que ela lhes inspira. Tal a razão por que o Cristianismo foi perseguido outrora e pelo qual o Espiritismo o é hoje, com a diferença, todavia, de que aquele o foi pelos pagãos, enquanto o segundo o é por cristãos.

Passou o tempo das perseguições sangrentas, é exato; contudo, se já não matam o corpo, torturam a alma, atacam-na até nos seus mais íntimos sentimentos, nas suas mais caras afeições. Lança-se a desunião nas famílias, excita-se a mãe contra a filha, a mulher contra o marido; investe-se mesmo contra o corpo, agravando-se-lhe as necessidades materiais, tirando-se-lhe o ganha-pão, para reduzir pela fome o profitente”.

Não percamos o nosso tempo e tampouco nos inquietemos com todos esses infelizes palradores que uivam sem resultados, perdidos que se encontram no emaranhado de suas ideias confusas, sem lógica, sem nexo...

Um desses críticos furibundos teve a petulância de perguntar a Kardec qual o milagre que o Espiritismo apresenta para estadear-se como uma nova religião; outros, em seus ataques, vociferam: “onde estão os mártires do Espiritismo que deram seu sangue e sua vida como os cristãos o fizeram pelo Cristianismo nas arenas do circo de Roma?!”. Deixemos a resposta para esses, por conta de Santo Agostinho[3]: “pedistes mártires! Os mártires do Es­piritismo já existem: entrai no interior das casas e os vereis. Per­guntais dos perseguidos: abri, pois, o coração desses fervorosos adeptos da ideia nova, que têm que lutar com os preconceitos, com o mundo, frequentemente mesmo com a família! Como seus co­rações sangram e se prejudicam quando seus braços se esten­dem para abraçar um pai, uma mãe, um irmão ou uma esposa, e que não recebe por preço de suas carícias e de seu trans­porte senão sarcasmos, sorrisos de desdém ou de desprezo. Os mártires do Espiritismo são aqueles que ouvem, a cada um de seus passos, estas palavras insultantes: louco, insensato, visionário!... e terão muito tempo para sofrer estas afrontas da incre­dulidade, e outros sofrimentos mais amargos ainda; mas a re­compensa será bela para eles, porque se o Cristo fez preparar para os mártires do Cristianismo um lugar soberbo, o que pre­para para os mártires do Espiritismo é mais brilhante ainda. Mártires do Cristianismo em sua infância caminham para o su­plício, fiéis e resignados, porque não contavam sofrer senão os dias, as horas ou o segundo do martírio, aspirando depois à mor­te como a única barreira a vencer para viver a vida celeste.  

Mártires do Espiritismo não devem nem procurar, nem desejar a morte; devem sofrer tanto tempo quanto praza a Deus deixá-los sobre a Terra, e não ousarem se crerem dignos dos puros go­zos celestes logo deixando a vida.  Pedem e esperam, murmuram muito baixo palavras de paz, de amor e de perdão por aqueles que os torturam, esperando novas encarnações em que possam resgatar as suas faltas passadas.

O Espiritismo se elevará como um templo soberbo; os de­graus, de início, serão rudes de subir; mas, transpostos os pri­meiros degraus, os bons Espíritos ajudarão a transpor os outros, até o lugar unido e direito que conduz a Deus. Ide, ide, filhos, pregar o Espiritismo! Pedem mártires: Vós sois os primeiros que o Senhor marcou, porque sois mostrados a dedo, e fostes tratados de loucos e insensatos por causa da verdade!  Mas eu vo-lo digo: a hora da luz virá logo e, então, não haverá mais nem perseguidores nem perseguidos, sereis todos irmãos e o mesmo banquete reunirá o opressor e o oprimido!”

Joanna de Ângelis aduz[4]: “(...) Jesus, que era irretocável, não passou isento desses maldosos adversários do progresso, que O seguiam empós, vigiando-O, a fim de utilizarem-se das Suas palavras, as quais distorciam, colocando-as contra Ele. Apesar disso, não Lhe diminuíram o ardor, não O atemorizaram, não conseguiram impedi-lO de realizar o ministério libertador”.

Em sublime peroração, Kardec deixa um recado para os Espíritas[5]: “espíritas, não vos aflijais com os golpes que vos desfiram, pois eles provam que estais com a verdade. Se assim não fosse, deixar-vos-iam tranquilos e não vos procurariam ferir. Constitui uma prova para a vossa fé, porquanto é pela vossa coragem, pela vossa resignação e pela vossa paciência que Deus vos reconhecerá entre os Seus servidores fiéis, a cuja contagem Ele hoje procede, para dar a cada um a parte que lhe toca, segundo suas obras. A perseguição pouco durará... Aguardai com paciência o romper da aurora, pois que já rutila no horizonte a estrela d'alva”. 
 

 


[1] - AMORIM, Deolindo. Doutrina Espírita. 2. ed. Salvador: Círculus, 2002, pp.128-130.

[2] - KARDEC, Allan. O Evangelho seg. o Espiritismo. 121. ed. Rio: FEB, 2003, cap. 28, item 51, § 3º.

[3] - KARDEC, Allan. Revue Spirite. Araras: IDE, 1993, p. 124-125 – Tomo I.

[4] - FRANCO, Divaldo. O amor como solução. Salvador: LEAL, 2006, cap. 2, p. 27.

[5] - KARDEC, Allan O Evangelho seg. o Espiritismo. 121. ed. Rio: FEB, 2003, cap. 28, item 51, § 4º e 5º.


 

 

     
     

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