Fé ou Esperança
Nesta altura do ano, com a época natalícia à porta e o
início de um ano novo, crescem em nós sentimentos de Fé
e de Esperança. As imagens de mudança aparecem
sistematicamente, as promessas são imaginadas e o futuro
idealizado com as alterações que pensamos serem
necessárias. Acabamos por misturar a Fé com a Esperança,
parecendo-nos o complemento uma da outra ou até
aparentando o mesmo.
A Fé em maioria das pessoas está associada à Esperança,
à confiança, à saúde e a muitas outras coisas que nos
parecem boas.
A meu ver, a verdadeira Fé é Viver, viver sem escolha.
Nós temos dificuldade em ver o que é Fé, então, eu
sugiro que possamos colocar de lado o que não é.
A palavra Esperança, tal como indica, é esperar algo,
“tenho esperança que corra desta maneira” ou “tenho
esperança que corra bem”. Se eu espero algo, então eu
espero algo que possa imaginar, que possa ser projetado
pela minha mente. A vida é muito rica e muitas vezes
traz-nos o que não imaginamos, situações novas
imprevistas, e, como tal, não se deu o que se esperava.
Esperar algo, muitas das vezes é o início da frustração,
quando temos Esperança e as coisas não ocorrem como
imaginamos, a carruagem seguinte desse comboio é a
frustração.
Será que na Fé poderá existir Frustração?
Quem cria a Esperança somos nós, imaginando a forma como
a vida irá correr, quem a torna em frustração também
somos nós, porque não correu como queríamos. Imaginamos
o futuro e frustramo-nos quando já é um passado
diferente do imaginado.
Estes são dois movimentos em que nós vivemos e temos
dificuldades em nos libertarmos deles. Na verdade, a
vida decorre em um tempo diferente, o presente, e a Fé
acontece neste tempo, porque o passado é uma memória e o
futuro é uma imaginação, ambos sustentados pelo
pensamento, tal como a Esperança e a Frustração.
Poderemos ter Fé e sentirmo-nos indignados?
Também penso que não, a indignação é a não aceitação do
que se sucedeu, o choque do que queremos com o que nos
deparamos. Das duas uma, ou nós temos a certeza que
“Alguém” comanda o Universo, tornando-o harmonioso e de
forma Justa e poderemos ter Fé no seu funcionamento, ou
pensamos que tudo é obra do acaso, e esta perfeição, que
poderemos chamar de harmonia perfeita, que se dá no
cosmos, é também obra do acaso. Aí seria uma sequência
de número inimaginável de acasos felizes que formaram o
nosso Universo, o que é impossível de se imaginar.
Então, se temos consciência da harmonia do Universo, e
que tudo o que acontece é perfeito, ter Fé é passar em
silêncio sem que nada nos indigne, porque sabemos da
Justiça Universal e compreendemos o caminho que tomamos.
Poderemos ter Fé e Raiva ou Agressividade?
Também não me parece. A raiva e agressividade aparecem
após a indignação; é uma forma de reação depois da não
aceitação da situação onde nos sentimos injustiçados,
fazendo desaparecer momentaneamente em nós qualquer
virtude que possamos ter.
Parece-me a mim que qualquer tipo de reação negativa por
nossa parte é falta de Fé, incluída a amargura que
possamos sentir, seja temporária ou já em forma de
carácter.
Então poderemos dizer que a Fé é aceitação?
Se é algo que aceitamos temos que ter a hipótese de não
aceitar, mesmo que não o façamos. A aceitação também é
criada pela nossa mente, por nós. Foi algo que aconteceu
e eu afirmo, a mim próprio, “eu aceito o que me
aconteceu”. Parece-me que a Fé ultrapassa a aceitação,
porque para determos este sentimento em nós tem que se
dar a plena consciência, sem qualquer dúvida, da
perfeita movimentação da vida, então, não cabe a
aceitação.
Nós apanhamos a estrada para um determinado destino onde
queremos chegar, não existe a indignação, frustração,
raiva, agressividade, injustiça, por irmos naquela
estrada, nem sequer aceitação, é a estrada correta,
ponto final, não há que questionar, e isto parece-me Fé,
ter consciência de que o movimento da vida é o correto,
incluindo os negativos trazidos pela própria vida ou
pelos outros. Temos que entender estes cenários
negativos com que nos deparamos, não em uma teoria, mas
como uma realidade em que está a acontecer um
aprendizado importante que nos modificará para melhor.
Então, não existirá uma reação negativa, mas um
aproveitamento de um aprendizado.
Por que não somos capazes de chegar a este nível de
humildade e resignação?
Nós somos demasiadamente apegados ao nosso ser na Terra,
então criamos o que nos dá jeito para nós, não
permitimos que ele passe por “humilhações” ou
maus-tratos, temos demasiado medo e queremos apenas
coisas boas. Quando as “más” acontecem, ficamos
indignados e frustrados pelo enorme apego que temos a
nós próprios, não percebendo que nos aproximamos da
matéria e nos afastamos da Fé.
Pelo Natal, o meu pedido este ano para o sapatinho é a
atenção para vigiar o meu ser e compreender o meu apego
e, assim, sei que para o próximo ano diminuirei os
impulsos dos vícios morais e físicos, abandonarei a
exigência de que as coisas corram como eu quero, o que
me fará reduzir a indignação e a frustração; conhecerei
o caminho da Paz e a virtude da Fé.
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