Cinco-marias

por Eugênia Pickina

 

Infância e experiências afetivas


Helena Kolody me avisa: Deus dá a todos uma estrela. Uns fazem da estrela um sol. Outros nem conseguem vê-la.


Considerei, faz muitos anos, que, no lugar da escola, alunos deveriam passar primeiro por uma cozinha e uma horta ou um pomar. Os cozinheiros e suas hortas e seus pomares podem dar lições importantes às crianças.

Na minha infância, vez por outra, minha família e eu visitávamos uma parente distante do meu pai. Embora de poucas palavras, vestidos discretos, voz das velhas damas, suas atitudes eram divertidas e criativas (e seu cachorro marrom, adorável).

Não admitia, por exemplo, que uma criança comesse uma comida que não fosse feita na hora. Mas antes de mexer com as panelas, pegava na mão da criança mais nova e nos conduzia em fila para a horta, aquele mundo vivo de agrião, rúcula, azedinha, cenoura, tomate, alface, abóbora, tomilho, capim-limão…, convidando-nos, com atenção, a colher apenas as hortaliças que seriam consumidas no instante da refeição. Eu e meus irmãos, movidos pelo desejo e o entusiasmo, corríamos em direção aos canteiros e o momento da colheita era uma experiência muito feliz. E eu me lembro que, voltando para casa, essa parente ia nos explicando com paciência o nome e as propriedades de cada coisa, provocando informação e fome em nossos corpos infantis.

Eu era menina. Na fazenda do meu avô havia um pomar enorme. Pois acontecia uma árvore cobrir-se de amoras brilhantes. A simples visão daquelas frutinhas incitava minha fome e, de um jeito ou de outro, eu convencia meus irmãos a passarmos um longo pedaço da tarde pertinho daquela árvore, brincando e comendo. Suspeito, hoje, que meu amor pela botânica foi despertado por essas primeiras amoras. Da vivência lúdica na horta e no pomar incorporei meu respeito pela natureza, meu conhecimento sobre estações e consciência ecológica, sem esquecer as lições importantes sobre cooperação e desapego…

De todos os modos, na infância, toda experiência de aprendizagem se inicia com uma experiência afetiva. Porque aprender está implicado com afeto, que motiva o desejo, a atenção, e permite cada ser humano aflorar qualidades e talentos. Por isso afeto, do latim affetare, significa ir atrás, pondo corpo e mente guiados pela atenção curiosa e, com isso, a criança desenvolver-se com (mais) plenitude para, no tempo devido, saber fazer alegremente e servir bem à sociedade.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita