Perdão exemplar
“... Se teu irmão pecar contra ti, vai, e corrige-o
entre ti e ele somente; se te ouvir, ganhado terás a teu
irmão. Então, chegando-se Pedro a ele, perguntou:
Senhor, quantas vezes poderá pecar meu irmão contra mim,
para que eu lhe perdoe? Será até sete vezes?
Respondeu-lhe Jesus: Não te digo até sete vezes, mas
setenta vezes sete vezes.” (Mateus, XVIII: 15, 21, 22.)
A dificuldade de perdoar as ofensas ainda é uma das
grandes dores da humanidade sofredora. O orgulho mostra
suas pegadas nesses episódios de dor, que são uma sombra
que ainda se estende na Terra. Há que deixar os clarões
de luz do amor dissiparem as sombras e iluminarem as
trevas. Trevas interiores, dolorosas, que precisam ser
sanadas.
Perdoar é divino. Nessas horas em que tantos revelam
suas angústias, provocadas pelo egoísmo humano, gerador
dos males no mundo, há que se lembrar de edificantes
casos anônimos, que nos ajudam a meditar em nosso
próprio crescimento.
Algum tempo atrás, não muito tempo, por sinal, ouvíamos
uma palestra de uma senhora, professora universitária
aposentada, no Centro Espírita que frequentamos em
Cambé.
Enaltecia ela as qualidades de seu pai, espírita, homem
de bem, que lhe passou valores sólidos das virtudes e
uma vivência como a do verdadeiro espírita retratado n’O
Evangelho segundo o Espiritismo. Disse ela que ele tinha
sido motorista de táxi numa cidade pequena e que tinha
sido assassinado por ladrões. Enquanto ela falava das
qualidades de seu pai, como homem de bem, nós
pensávamos: Será que essa senhora é a citada no livro
“Abnegado Servidor” que conta os casos e experiências de
Hugo Gonçalves, saudoso amigo e espírita modelo?
Prestando atenção no que ela falava, também fomos
lembrando o caso narrado no livro e que Hugo Gonçalves
tinha mantido no anonimato, para preservá-la. Foi um dos
maiores exemplos de perdão que pudemos presenciar nessa
encarnação.
Ao terminar a palestra e irmos cumprimentá-la pelo
brilhantismo da explanação, em particular, a sós com
ela, lhe perguntamos se a situação contada no livro se
referia a ela. Humildemente ela disse que sim e nós
pudemos pessoalmente agradecer-lhe pelo ensinamento
deixado. Ficou entre nós sua identidade no fato que Hugo
tão bem descreveu como marcante e belo para ele.
Disse Hugo que certa ocasião uma jovem foi procurá-lo e
contou-lhe sua história, que lhe revelou a grandeza
moral dela. Seu pai era motorista de táxi e houve um
roubo e morte do taxista, com posterior perseguição da
polícia. Um dos ladrões foi seriamente ferido enquanto o
outro não resistiu aos ferimentos. O jovem sobrevivente
confessou que foi ele o autor do crime. Foi internado na
época no Hospital Universitário de Londrina, em estado
grave. Quando melhorou foi transferido para uma
enfermaria isolada. A polícia montava guarda na porta do
quarto. Um dia, no horário das visitas, essa jovem foi
visitá-lo. Ninguém ia visitá-lo, nenhum parente, pois
ele era de outra cidade.
Ao chegar à porta, a jovem perguntou ao guarda se era
permitida visita e esse disse que sim, mas que precisava
verificar sua bolsa, para ver se ela não portava alguma
arma para ele.
A jovem, sorrindo, disse que portava a mais poderosa de
todas as armas. E mostrou-lhe “O Evangelho segundo o
Espiritismo”. Visitou o rapaz todos os dias. Lia para
ele “O Evangelho”. Pegou seu endereço, escreveu para a
família dele, deu notícias, disse que ele estava bem.
Foi todos os dias vê-lo. O rapaz então, um dia, chorando
lhe disse que ele estava mudado, que se soubesse antes
aquilo que sabia com o contato com ela, jamais teria
cometido o crime. Estava arrependido. Quando teve alta
do hospital e prestes a ser transferido para a prisão,
agradeceu muito a ela. Foi a única visita que recebeu. E
mudou seu modo de pensar. Ela despediu-se, deu a ele de
presente “O Evangelho segundo o Espiritismo” e se
retirou sem que ele soubesse, nem a sua família, que ela
era a filha do motorista de táxi que havia sido
assassinado.
Durante muitos anos meditamos nessa história. Pensávamos
se fôssemos nós, no lugar dessa jovem. Será que teríamos
essa capacidade que ela teve? Não sabemos. Somente a
experiência revela o saber. O que sabemos é que foi de
profunda grandeza essa atitude dela. Um Espírito que
entendeu e viveu o perdão.
Tivemos a oportunidade de conhecê-la pessoalmente,
agradecidos a ela pelo ensinamento, mais de 25 anos após
conhecer esse fato.
São os anônimos do mundo, conhecidos pelo Cristo de
Deus, por cumprirem seus ensinamentos.
Nessa hora em que o perdão se faz necessário em tantos
corações, bom lembrar esse fato e esse exemplo
verdadeiro de caridade para com o próximo.
Lembramos aqui nestas linhas, de um texto constante d´O
Evangelho segundo o Espiritismo, de Elizabeth de
França - Caridade com os Criminosos -, em que ela diz:
... Aproximam-se os tempos, ainda uma vez vos digo, que
a grande fraternidade reinará sobre o globo. Será a lei
do Cristo que regerá os homens. Somente ela será o freio
e a esperança, e conduzirá as almas às moradas dos
bem-aventurados. Amai-vos, pois, como os filhos de um
mesmo pai: não façais diferenças entre vós e os
infelizes, porque Deus deseja que todos sejam iguais:
não desprezeis a ninguém. Deus permite que grandes
criminosos estejam entre vós, para vos servirem de
ensinamento. Brevemente, quando os homens forem levados
à prática das verdadeiras leis de Deus, esses
ensinamentos não serão mais necessários, e todos os
Espíritos impuros serão dispersados em mundos
inferiores, de acordo com suas tendências.
O amor um dia há de triunfar na Terra.
Até lá, casos como o dessa senhora são lições de amor
para nós. Que possamos aprender com elas e amar um pouco
mais.
|