O prisma colorido de cada um
E o raio de sol atravessava o vidro da janela da
enfermaria, no grande espaço da “ward” (enfermaria em
inglês), onde as camas separadas por cortinas acomodavam
8 pacientes. A cama onde descansava, adormecido, meu
querido amigo, estava na melhor posição ao lado da
janela, o que lhe possibilitava olhar os barcos irem e
virem, atracarem nas margens do rio Tâmisa. Aproveitei o
momento de silêncio para orar. Momentos antes, eu
caminhara aceleradamente em direção ao Hospital,
atravessara jardins amplos, trocando olhares com os que
iam mais acelerados do que eu, quase nos tocando, tal a
quantidade de pessoas que se arvoram nas horas de
visitações de seus entes caros nos mais de dez andares
daquele Hospital.
Terminei a prece, abri os olhos, e maravilhei-me com o
raio de sol que, atravessando a janela, derramava lindas
cores sobre a colcha branca no pé da cama alta. A
decomposição da luz, como um prisma de mil cores, me fez
retornar aos anos escolares, nas experiências saudáveis
das aulas de meu colégio, o Instituto de Educação em
Curitiba, ali perto da Praça Osório. Primava minha
escola pela educação na sua mais pura acepção da
palavra, e posso dizer que me lembro das faces de meus
professores, do entusiasmo nas aulas, as quais eu
esperava com alegria no dia seguinte, para assim repetir
e reforçar aprendizados de dias anteriores.
Olhando a dança das cores sobre a alva colcha,
acompanhei com os olhos o raio de sol, e deparei-me com
um lindo arco-íris sobre o Tâmisa. Um prêmio para meus
pensamentos. Deu-me vontade de escrever uma poesia de
gratidão, pela oportunidade que meu amigo me dava de, ao
ir visitá-lo, ser premiada com aquelas duas situações
inusitadas. Talvez já tenham acontecido momentos como
esses, mas no corre-corre do dia a dia quase não olhamos
para o alto, em dias chuvosos, para ver o arco-íris, ou
prestamos atenção nos raios de sol que atravessam
janelas e que, decompondo a luz branca, enriquecem nossa
visão com o prisma das cores.
Disse-me meu amigo que acordara e estava me observando
em silêncio: - Viu passarinho verde? E eu falei: - Vi
passarinhos de sete cores... um lindo arco-íris se
apresentou por poucos segundos, mas dissipou-se... e
também um raio de sol se decompôs em prisma colorido
pelo vidro da janela. Oramos novamente preparando-nos
para o passe, e o fizemos em seguida. Conversamos,
conversamos, uma visita saudável. Não vi que o sol e
chuva já se haviam recolhido... A luz da ward já se
acendera e o jantar de meu amigo já havia chegado.
Meu amigo me contara casos de outros pacientes internos
daquela enfermaria. A paciência do filho do senhor à
nossa frente, em vir todos os dias, estar ao lado do pai
demente, que briga com ele, porque não se lembra de que
o filho o visita todos os dias e o chama de ingrato
etc. No outro lado, como diz meu amigo, um sinhozinho
que reclama a noite toda, como se estivesse atormentado
por pesadelos. As enfermeiras o medicam, está sempre sem
dor, mas a mente atormentada não o deixa em paz... E
assim aproveitamos para orar novamente, envolvendo a
todos os pacientes do Hospital, onde se verificam tantas
dores e infortúnios ocultos, tantas vivências que nem
sequer temos condições de imaginar, apenas olhando-os
nas condições dos que estão necessitados de auxílio, de
tratamento e um sorriso.
Isso meu amigo faz muito bem... sorrir... encorajar
outros a sorrirem.... Sorrindo ou não, os minutos e
horas passam... E, quando nada se faz, os minutos ficam
eternos.
Terminamos de orar. Mentalizei a luz branca se
derramando em mil cores sobre todos os irmãos daquela
enfermaria, e senti muito amor por todos, pacientes e
enfermeiras, enfermeiros, que laboram no bem.
Desci os andares, elevador lotado, saí para a rua e
andei todo o calçamento entrecortado de jardins, até a
parada do ônibus, aproveitando o início da noite para
meditar, enquanto a paisagem iluminada da ponte, de todo
o trajeto, me enchia de alegria, como sempre acontece em
cidades lindas como Londres.
Elsa Rossi, radicada em Londres, é escritora,
coordenadora da BUSS-British Union of Spiritist
Societies e membro da Comissão Executiva do Conselho
Espírita Internacional.
|