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por Rogério Coelho

 
Os construtores do futuro


O Espiritismo mostra que esta vida não passa de um elo no harmonioso e magnífico conjunto da Obra do Criador


"O meu Reino ainda não é daqui." - Jesus. (Jo., 18:36)


Moisés, o grande legislador e guia hebreu, cavou - penosamente - as bases firmes onde Jesus, o Meigo Rabi Galileu, ergueria a Grande Construção à qual o Espiritismo daria o toque final, o acabamento... Na verdade, são (cada um a Seu tempo) os construtores do futuro.

Eis o que aprendemos com Allan Kardec, em apontamentos exarados no livro "O Evangelho segundo o Espiritismo", cap. II, itens 3 a 7: "(...) apenas ideias imprecisas tinham os judeus da Vida Futura. Acreditavam nos anjos, considerando-os seres privilegiados da Criação; não sabiam, porém, que os homens podem, um dia, tornar-se anjos e partilhar da felicidade destes. Segundo eles, a observância das Leis de Deus era recompensada com os bens terrenos, com a supremacia da nação a que pertenciam, com vitórias sobre os seus inimigos. As calamidades públicas e as derrotas eram o castigo da desobediência àquelas leis. Moisés não pudera dizer mais do que isso a um povo pastor e ignorante, que precisava ser tocado - antes de tudo - pelas coisas deste mundo. Mais tarde, Jesus lhe revelou que há outro mundo, onde a Justiça de Deus segue o seu curso. É esse o mundo que Ele promete aos que cumprem os mandamentos de Deus e onde os bons acharão sua recompensa. Aí o Seu Reino. Lá é que se encontra na Sua glória e para onde voltaria quando deixasse a Terra”.

Jesus, porém, conformando Seu ensino com o estado dos homens de Sua época, não julgou conveniente dar-lhes luz completa, percebendo que eles ficariam deslumbrados, visto que não a compreenderiam. Limitou-Se a, de certo modo, apresentar a Vida Futura apenas como um princípio, como uma Lei da Natureza a cuja ação ninguém pode fugir. Todo cristão, pois, firmemente crê na Vida Futura; mas a ideia que muitos fazem dela é ainda vaga, incompleta e, por isso mesmo, falsa em diversos pontos. Para grande número de pessoas, não há, a tal respeito, mais do que uma crença, balda de certeza absoluta, donde as dúvidas e mesmo a incredulidade.

O Espiritismo veio completar, nesse ponto, como em vários outros, o ensino do Cristo, fazendo-o quando os homens já se mostram maduros bastante para apreenderem a Verdade. Com o Espiritismo, a Vida Futura deixa de ser simples artigo de fé, mera hipótese; torna-se uma realidade material, que os fatos demonstram, porquanto são testemunhas oculares os que a descrevem nas suas fases todas e em todas as suas peripécias, e de tal sorte que, além de impossibilitarem qualquer dúvida a esse propósito, facultam à mais vulgar inteligência a possibilidade de imaginá-la sob o seu verdadeiro aspecto, como toda gente imagina um país cuja pormenorizada descrição leia. Ora, a descrição da Vida Futura é tão circunstancialmente feita, são tão racionais as condições ditosas ou infortunadas da existência dos que lá se encontram, qual eles próprios pintam, que cada um, a seu mau grado, reconhece e declara de si mesmo que não pode ser de outra forma, porquanto, assim sendo, fica patente a verdadeira justiça de Deus.

A ideia clara e precisa que se faça da Vida Futura proporciona inabalável fé no porvir, fé que acarreta enormes consequências sobre a moralização dos homens, porque muda completamente o ponto de vista sob o qual encaram eles a vida terrena.  

Para quem se coloca - pelo pensamento - na vida espiritual, que é indefinida, a vida corpórea se torna simples passagem, breve estada num país ingrato. As tribulações dessa vida não passam de incidentes que ele suporta com paciência, por sabê-las de curta duração, devendo seguir-se-lhe um estado mais ditoso.

Nada mais restará à morte de aterrador; deixa de ser a porta que se abre para o nada e torna-se a que dá para a libertação, pela qual entra o exilado numa mansão de bem-aventurança e de paz.  Sabendo temporária e não definitiva a sua estada no lugar onde se encontra, menos atenção presta às preocupações da vida, resultando-lhe daí uma calma de espírito que tira àquela muito do seu amargor.

Pelo simples fato de duvidar da Vida Futura, o homem dirige todos os seus pensamentos para a vida terrestre. Sem nenhuma certeza quanto ao porvir, dá tudo ao presente. Nenhum bem divisando mais precioso do que os da Terra, torna-se qual a criança que nada mais vê além de seus brinquedos. E não há o que não faça para conseguir os únicos bens que se lhe afiguram reais. A perda do menor deles lhe ocasiona causticante pesar; um engano, uma decepção, uma ambição insatisfeita, uma injustiça de que seja vítima; o orgulho ou a vaidade feridos são outros tantos tormentos que lhe transformam a existência numa perene angústia, infligindo-se ele, desse modo, a si próprio, verdadeira tortura em todos os instantes.

Encarando o homem a vida terrestre do ponto de vista da Vida Futura, ele vê que a humanidade, tanto como as estrelas do firmamento, perde-se na imensidade. Ele percebe, então, que grandes e pequenos estão confundidos, como formigas sobre um montículo de terra; que proletários e potentados são da mesma estatura, e lamenta que as criaturas efêmeras a tantas canseiras se entreguem para conquistar um lugar que tampouco as elevará e que por tão pouco tempo conservarão. Daí se segue que a importância dada aos bens terrenos está sempre em razão inversa da fé na Vida Futura.

Deus não condena os gozos terrestres; condena, sim, o abuso desses gozos em detrimento das coisas da Alma. Contra tais abusos é que se premunem os que a si próprios aplicam estas palavras de Jesus: "meu Reino não é deste mundo”.

Aquele que se identifica com a Vida Futura assemelha-se ao rico que perde - sem emoção - uma pequena soma. Aquele cujos pensamentos se concentram na vida terrestre assemelha-se ao pobre que perde tudo o que possui e se desespera.

O Espiritismo dilata o pensamento e lhe rasga horizontes novos. Em vez dessa visão acanhada e mesquinha que o concentra na vida atual, que faz, do instante que vivemos na Terra, único e frágil eixo do porvir eterno, o Espiritismo mostra que esta vida não passa de um elo no harmonioso e magnífico conjunto da Obra do Criador. Mostra a solidariedade que conjuga todas as existências de um mesmo ser, todos os seres de um mesmo mundo e os seres de todos os mundos. Faculta uma base e uma razão de ser à fraternidade universal, enquanto a doutrina da criação da Alma por ocasião do nascimento de cada corpo torna estranhos uns aos outros todos os seres. Essa solidariedade entre as partes de um mesmo todo explica o inexplicável que se apresenta, desde que se considere apenas um ponto.

Naturalmente por perceber todas essas coisas é que Paulo, o Apóstolo dos Gentios, escreveu aos coríntios:"se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens”. (I cor., 15:19).    

Impressiona-nos, sobremaneira, como Paulo, sem possuir àquele tempo as noções que - hodiernamente - o Espiritismo oferece, tenha vislumbrado, de forma lógica, clara e insofismável, uma realidade tão transcendental quão incompreensível até hoje para inúmeras criaturas!...   
 


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita