O verdadeiro poder
O
maior no Reino dos Céus é aquele que haja sido o
mais humilde na Terra
“(...) E o que a si mesmo exaltar será
humilhado.” - Jesus.
(Mt., 25:12.)
Numa
singular mescla de medo, covardia e presunção,
Pilatos disse a Jesus: “Não
sabes Tu que tenho poder para Te crucificar e
tenho poder para Te soltar?”
Jesus, flagelado
e indefeso, ante as sanhas imperial, farisaica e
sacerdotal, respondeu: “nenhum
poder terias contra mim, se de ‘Cima’ te não
fosse dado”.
Jesus, que era
todo poder, amor e bondade, afirmou com
humildade: “(...)
nada faço por mim mesmo; mas falo como o Pai me
ensinou”.
Amarrando as
pontas das frases acima, concluímos que tudo
procede de Deus, tudo está submetido à Sua santa
volição. Portanto, a vaidade, o orgulho e o
estrelismo não se justificam a não ser como
apanágio da mediocridade. Só temos
verdadeiramente em abundância os equívocos
enquanto parcas são as virtudes. De que podemos
nos envaidecer então?! Qual a justificativa para
a busca dos holofotes do mundo?!
Kardec,
juntamente com os Espíritos Superiores deixaram
um aviso bem claro: “(...)
Os Espíritos deixam cada homem na sua esfera.
Daquele que só é apto a cavar a terra, não farão
depositário dos segredos de Deus; mas sabem
tirar da obscuridade aquele que seja capaz de
lhes secundar os desígnios”.
O verdadeiro
poder e os legítimos títulos de nobreza estão,
segundo Lacordaire,
na caridade e na humildade.
Não poucas são as criaturas que não perdem
oportunidade para se colocarem sob os faróis da
autopromoção. Comprazem-se, prazenteiras, com as
luzes da ribalta da mediocridade erguidas no
pedestal da vaidade, do qual caem fragorosamente
em pouco tempo, quando, ao contrário, deveriam
ter procurado enriquecer suas vidas sendo
realmente úteis e fiéis à causa do Bem com
Jesus. Ontem como hoje, continuam a se servirem
d`Ele em vez de servi-lO.
Não foi sem
motivos que o “discípulo amado” deixou
registrado de forma claríssima nos escritos
neotestamentários, esta frase do Batista: “é
necessário que Ele cresça e que eu diminua. O
homem não pode receber coisa alguma, se lhe não
for dada do Céu”.
Quando João Batista cunhou essas frases, parecia
que seus olhos alongavam-se além do seu tempo e
enxergavam os magotes de “servidores” do
Cristo no futuro distante, agindo de forma
equivocada, portanto, incompatível com o “modus-operandi
e vivendi”de Jesus, esquecidos de que o
Mestre a Quem dizem servir foi o Vexilário Maior
da humildade.
Parafraseando a nobre Mentora Joanna de Ângelis,
poderíamos dizer, sem receio de equívocos, que o
estrelismo anda de mãos dadas com o orgulho e a
vaidade, sob os “spotlights” da
imbecilidade, enquanto a humildade caminha sutil
e silenciosamente, na semiobscuridade do
anonimato desinteressado, da abnegação e do
devotamento...
O homem sempre se preocupou com as questões da
hierarquia, naturalmente ambicionando os seus
patamares mais elevados, embora em
contrapartida, nada fizesse por merecê-los. É a
velha doutrina dos privilégios tão acoroçoada
pelos poderes temporais civis e religiosos! Isso
ocorreu até mesmo dentro do próprio Colégio
Apostólico.
Quando Seus
discípulos Lhe perguntaram quem é o maior no
Reino dos Céus, Jesus respondeu:“aquele
que se tornar humilde como uma criança, esse é o
maior no Reino dos Céus”.
Adolfo, bispo de
Argel pergunta:“(...)
por que há de cada um querer elevar-se acima de
seu irmão?”
Ele mesmo
responde: “(...)
quando o orgulho chega ao extremo, tem-se um
indício de queda próxima, porquanto Deus nunca
deixa de castigar os soberbos. Se por vezes
consente que eles subam, é para lhes dar tempo à
reflexão e a que se emendem, sob os golpes que
de quando em quando lhes desfere no orgulho para
adverti-los. Mas, em lugar de se humilharem,
eles se revoltam. Então, cheia a medida, Deus os
abate completamente e tanto mais horrível lhes é
a queda, quanto mais alto hajam subido.
Pobre raça humana, cujo egoísmo corrompeu todas
as sendas, toma novamente coragem, apesar de
tudo. Em sua misericórdia infinita Deus te envia
poderoso remédio para os teus males, um
inesperado socorro à tua miséria. Abre os olhos
à luz: aqui estão as almas dos que já não vivem
na Terra e que te vêm chamar ao cumprimento dos
deveres reais. Eles te dirão, com a autoridade
da experiência, quanto as vaidades e as
grandezas da vossa passageira existência são
mesquinhas a par da Eternidade. Dir-te-ão que,
lá, o maior é aquele que haja sido o mais
humilde entre os pequenos deste mundo; que
aquele que mais amou os seus irmãos será também
o mais amado no céu; que os poderosos da Terra,
se abusaram da sua autoridade, ver-se-ão
reduzidos a obedecer aos seus servos; que,
finalmente, a humildade e a caridade, irmãs que
andam sempre de mãos dadas, são os meios mais
eficazes de se obter graça diante do Eterno”.
Com sua aguçada
perspicácia e não menos superlativa
sensibilidade, o Espírito Eros aduz com
propriedade e sabedoria:
“(...) O verdadeiro poder é aquele que se
irradia em vibrações de paz, irrigando a vida
com o amor; o que se caracteriza pela suavidade
da sua força; que se deixa conduzir por toda
parte sem causar preocupação nem temor; que
oferece confiança e concede proteção; que está
presente e não impõe ostentação; é natural,
porque se conhece, resistindo a todas as
investidas do mal através da não violência.
No mundo, o poder corrompe vidas, envenena
almas, dilacera sentimentos, entorpece o
caráter, macula as virtudes... Quanto atinge,
contamina, terminando por vitimar aquele que o
utiliza, quase sempre desordenadamente.
Apresenta-se no disfarce da beleza, da fortuna,
da sociedade, da política, da cultura vaidosa,
da religião temerária...
Com a facilidade que alça ao pináculo da glória,
da fama, da dominação, conduz ao corredor
sombrio e estreito da loucura, do abandono, do
crime e da morte...
O poder humano, considerado e temido, é nevoa
que o calor do tempo dilui. Consiste em um
empréstimo-provação das Soberanas Leis, para ser
usado de forma edificante na construção do
progresso e na sustentação das vidas. Os seus
usuários, entretanto, raramente utilizam-no com
sabedoria, sucumbindo sob a sua tormentosa
constrição.
O homem que realmente pode é aquele que se
domina, sem aos outros submeter; que se supera,
sem aos demais vencer; que se liberta, a todos
oferecendo campo para a própria ventura.
O único poder real é Deus.Transitórios,
são todos os demais, que resultam da ilusão de
amealhar, de dispor de servidores e áulicos, de
soldados e bajuladores, pois que a morte a todos
vencerá, igualando-os na horizontal do túmulo.
O poder do Espírito sobre si mesmo, haurido na
meditação, na prece, na ação do bem, na
autoiluminação, é o que nunca se perde, nem se
decompõe, nem aflige. O poder moral, este sim,
fomenta vida”.
-
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 71.
ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, 2ª
parte, cap. XXVI, item 294, § 29.