Em 1931 Chico já não sentia a pressão alucinada na
cabeça nem o enrijecimento doloroso no braço. Tinha
aprendido a se entregar, a não criar resistência. Às
vezes, um volume imaterial aparecia diante de seus olhos
e era dali, daquelas páginas invisíveis, que Chico
copiava os textos do outro mundo. Em outras ocasiões,
escrevia como se alguém lhe ditasse as mensagens e,
enquanto colocava as palavras no papel, experimentava no
braço a sensação de fluidos elétricos e, no cérebro,
vibrações indefiníveis. De vez em quando, esse estado
atingia o auge e Chico perdia a sensação do próprio
corpo. Sem medo, já podia ser o instrumento passivo dos
mortos-vivos. Um feiticeiro. Um maluco incapaz de
separar o sonho da realidade.
Os rumores persistiam na cidade. Um padre de Belo Horizonte fez
um discurso inflamado na igreja de Pedro Leopoldo contra o
Espiritismo e encerrou o sermão mandando Chico Xavier para o
inferno. O rapaz, impressionado, correu para o colo invisível da
mãe, contou seu drama e ouviu dela o muxoxo:
- E daí? Ele te mandou para o inferno, mas você não vai. Fique
na Terra mesmo...
Do livro As vidas de Chico Xavier, de Marcel Souto Maior.
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