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por Leda Maria Flaborea

 

Consciência cósmica


“Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sem cessar, tal é a lei.” 
- Allan Kardec  


Ensinam-nos, quando ainda em tenra idade, mas já capazes de compreender conceitos aparentemente tão complexos – não se iludam os ingênuos –, que é no campo do Espírito, berço dos sentimentos, que acalentamos nossos sonhos, desejos e, dizemos nós hoje, todas as imperfeições morais, que somente mais tarde terão as condições propícias para se manifestarem. E é nesse momento da vida que seres amorosos – às vezes nem tanto – nos conduzem, com relativa segurança – às vezes nem sempre –, a caminhos menos tortuosos, nos propiciando oportunidades em que possamos desenvolver algumas potencialidades que garantirão, em fase adulta, a possibilidade do sustento material e moral.

Ensinam-nos, também, que todos os sentimentos, sejam eles quais forem, devem, necessariamente, passar por um filtro para que possamos viver uma vida comunitária, onde leis sociais regulam as relações entre os homens. Não nos é facultado, assim, exprimir todos os nossos sentimentos - sejam eles bons ou maus - sem corrermos o risco de infringir as leis humanas, não nos importando, por ora, onde e quando essas leis são praticadas, podendo, com isso, sofrer severas punições. Esse filtro, chamam-no razão. Dessa forma, tudo que recebemos e emitimos deve passar por esse crivo para que, com equilíbrio, tenhamos nossos direitos respeitados, e aprendamos a respeitar os do outro.

Avançamos, assim, como que envoltos em uma nuvem densa, vivenciando situações que nos causam, na maior parte do tempo, verdadeiro pânico pelo nosso total desconhecimento do que fazer e como fazer com as dificuldades que, inevitavelmente, surgem – porque são partes da própria vida. Somos, ainda, as crianças de outrora, tateando o mundo ao nosso redor, descobrindo objetos, ensaiando passos, para aprender, mais adiante, a dominar o espaço em que vamos nos movimentar. E lentamente, descobrindo nossos limites, e, com muita dificuldade e pouca tolerância, o limite do outro; testando ações e reações – a nossa e a do outro – para termos a certeza de poder manipulá-las, trazendo algum benefício para nós próprios. Tentativas de ensaio e erro, entre nós e o outro, em jogo de aprendizes, onde imaginar que se pode levar vantagem sempre é perder por antecipação. Brincadeira de crianças que acreditam ser o resultado o objetivo final.

Justamente, por não se saber o que fazer e como fazer, é que permanecemos nessa situação aflitiva de errar e recomeçar, e errar, novamente, para acertar mais além, que parece interminável. E, por mais angustiante que seja esse momento em que nos encontramos, dentro do processo evolutivo, não poderá ser de outra maneira por ora. Ainda nos encontramos e nos sentimos como ser dual: de um lado coração e de outro razão. Um, o berço; outro, o filtro dos mesmos sentimentos. Confusão natural para quem busca o Ser Total.

No nosso entendimento, a confusão só se instala na medida em que há dúvida ou desordem. Sabemos todos que a criação obedece a Leis Universais, e que, se vemos desordem na obra divina, ela é apenas aparente, pois nossa visão não alcança a totalidade dessa criação. Desconhecemos, quase que totalmente, a perfeita harmonia entre todos os elementos que estão ao nosso redor – e isso, para falarmos apenas do mundo material que percebemos. E se longe estamos de perceber inclusive o equilíbrio que se faz presente dentro de nós, no nosso próprio corpo físico, o que dizer, então, da Criação! Resta-nos, assim, verificar a dúvida.

Parece-nos claro que, à medida que o homem se percebe ora como razão, ora como coração, não consegue se encontrar como unidade, como Ser criado para evoluir e ser feliz. Quase nunca se dá conta de que ambos os momentos, em alternância contínua na eternidade da existência, representam partes dessa unidade, e que, por essa razão, têm a mesma importância no processo evolutivo. Miríades de oportunidades surgem para que isso ocorra; mas, pelo fato de não se identificar como unidade, estabelece-se a dúvida: será uma coisa, ou será outra? E a confusão instala-se, pois no fundo de sua consciência, ainda que de forma nebulosa, tem certeza dessa sua totalidade como Ser. Essa incerteza é angustiante!

A noção que esse homem parcial tem dessa totalidade, que não consegue apreender, mas que se percebe como tal, encontra explicação na ideia de que o germe da árvore contém a árvore, mas não é ela; dessa maneira, a noção de ser consciência cósmica – Ser Total – e, portanto, infinito, está contida na mente desse homem, sem que seja ela própria essa consciência. Tal conceito, no nosso entender, nos sugere que a mente - limite temporal e espacial -, presa a um corpo físico – limite material – é a representação dela para sua manifestação e evolução infinitas. Enquanto presa a essa matéria densa, essa consciência representa uma totalidade relativa – se levarmos em conta sua capacidade constante de expansão – de todas as experiências vividas até o presente momento.

O homem ter uma consciência cósmica e não ser a consciência cósmica é humanamente compreensível e compreensivelmente humano, na medida em que se identifica, ainda, como criatura humana pelo que possui e não pelo que é. Limitações evolutivas na compreensão da obra divina!...

Lentamente, caminhamos para essa percepção. Movimentos lentos, ainda, ora em direção à razão – necessidade de conhecimento -, ora rumo ao coração – necessidade de sabedoria – a nos possibilitarem avançar sempre, mais rápidos alguns, mais lentos outros, para o cumprimento da Lei do Progresso. Destino nosso? Certamente! E, na verdadeira acepção da palavra, é algo do qual não nos é dado fugir. Poderemos acelerá-lo, retardá-lo, adiá-lo, mas evitá-lo... jamais! E quão tolos somos ao tentar fazê-lo. É da Lei que progridamos e assim será, queiramos ou não. Retardatários somos todos nessa caminhada. E ainda bem que somos forçados a caminhar.




 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita