A ponte de luz
É natural que os religiosos de todos os cantos
do mundo aguardem, após a passagem de um plano a
outro, pelo que sempre sonhou na vida, que se
resume na sua condução pelos caminhos mais
iluminados, mais floridos, onde anjos e arcanjos
circulem volitando entre a exuberante
Natureza... É assim que muitos imaginam, criando
em suas mentes poderosas o quadro e a paisagem
com a cor que desejam... Contudo,
durante nossa jornada na Terra nos envolvemos em
demasia com as benesses que encontramos e
acabamos nos esquecendo das lições do Evangelho,
nos lembrando que poucos, como disse Jesus, se
acertam com a porta estreita. Por isso, vale a
pena sonhar como vale a pena mudar nossa conduta
enquanto ainda estivermos a caminho.
Maria Dolores, por meio da mediunidade de Chico
Xavier, enviou-lhe pela psicografia esta bela
página que conta, em versos, o diálogo de Pedro
com Jesus, interrogando o Mestre sobre os
caminhos que nos levarão às regiões da eterna
felicidade junto dos entes queridos. 'A ponte de
luz':
Terminara Jesus a prédica no monte. Nisso, o
apóstolo Pedro aproxima-se e lhe diz: "‒ Senhor,
existe alguma ponte// Que nos conduza ao Alto,
ao Céu que brilha muito acima?// Conforme ouvi
de tua própria voz,//Sei que o Reino do Amor
está dentro de nós...// Mas deve haver, no Além,
o País da Beleza,// Mais sublime que o Sol, em
fulgor e grandeza...// Onde essa ligação,
Senhor, esse divino acesso?
Jesus silenciou, como entrando em recesso// Da
palavra de luz que lhe fluía a jorro...//
Circunvagou o olhar pelas pedras do morro// E,
depois de comprida reflexão,// Falou ao
companheiro: ‒ Ouve, Simão,// Em verdade, essa
ponte que imaginas// Existe para a Vida
Soberana,// Mas temos de atingi-la por estrada//
Que não é bem a antiga estrada humana.
‒ Como será, Senhor, esse caminho?// Tornou
Simão a perguntar.// E Jesus respondeu sem
hesitar: ‒ Coração que a escolha, às vezes, vai
sozinho,// E quase que não tem// Senão renúncia
e dor, solidão e amargura...// E conquanto
pratique e viva a lei do bem,// Sofre o assédio
do mal que o vergasta e procura// Reduzi-lo à
penúria e ao desfalecimento.
Quem busca nesta vida transitória// Essa ponte
de luz para a eterna vitória// Conhecerá, de
perto, o sofrimento// E há de saber amar aos
próprios inimigos.
Não contará percalços nem perigos// Para servir
aos semelhantes,// Viverá para o bem todos os
instantes// E mesmo quando o mal pareça o
vencedor,// Confiando-se a Deus, doará mais
amor...
E ainda que a morte, Pedro, se lhe imponha,// Na
injustiça ferindo-lhe a vergonha,// Aceitará
pedradas sem ferir,// Desculpará injúria e
humilhação// Se deseja elevar o coração// À
ponte para o Reino do Porvir...
Alguns dias depois, o Cristo flagelado,//
Entregue à própria sorte// Encontrava na cruz o
impacto da morte,// Silencioso, sozinho,
desprezado...
Terminada que foi a gritaria// Da multidão feroz
naquele dia,// Ante o Céu anunciando aguaceiro
violento,// Pedro foi ao Calvário, aflito e
atento,// Envergando disfarce...
Queria ver o Mestre, aproximou-se// Para
sentir-lhe o extremo desconforto...// Simão
chorou ao ver o Amigo morto.
E ao fitá-lo, magoado, longamente// Ele ouviu,
de repente,// Uma voz a falar-lhe das Alturas: ‒
Pedro, segue, não temas, crê somente!...//
Recorda os pensamentos teus e meus...// Esta
cruz que me arrasa e me flagela// É a ponte que
sonhavas, alta e bela,// Para o Reino de Deus."