Verbaliza o que não se cala, silencia o
que não se fala
O relacionamento humano implica em comunicação e, no
tocante a este tema, proponho atentar nas palavras que
saem de nossas bocas. Desde que iniciamos a usar essa
essencial ferramenta - a palavra, para nossa evolução -,
durante a infância, adolescência, juventude e na fase
adulta percebemos o poder que a palavra exerce; aonde
ela nos leva positivamente, ou como nos compromete.
O meio em que vivemos nos oportuniza a seguir na direção
em que as palavras nos levarão. Expressões idiomáticas,
educação, cultura, gírias, palavras nada edificantes com
significados dúbios e controversos... e a tarefa
complicada de conquistar a ponderação e refletir antes
de verbalizar, quando se elege um tom de voz recheado de
sarcasmo, deboche e altivez. É ter o cuidado não só com
o que se diz, mas, também, como se diz: a intenção. Os
mal-intencionados tentam ocultar dos interlocutores, mas
estamos sob nuvens de testemunhas que veem o veneno
escorrendo pelo canto da boca.
Emmanuel nos remete a uma reflexão acerca do assunto na
obra: “Palavras de Vida Eterna” e importa o versículo:
“Quem quer amar a vida, e ver os dias felizes, refreie a
sua língua do mal”.
Em nossa conjuntura, num desafio desse, fácil seria
ficarmos mudos em alguns momentos. Entretanto, há o
pensamento, mesmo que não externemos o que vai na mente
com relação a críticas ou sentenças dos comportamentos
alheios. Estes também causam enfermidades morais:
pensou, sentiu, criou, plasmou. Passa a existir no plano
extrafísico, e percebemos a nossa responsabilidade no
movimento do todo.
O que falo, como ajo, e o que sinto
Curiosa sobre o capítulo 3° do 1° livro de Pedro,
percebi que ele chama a atenção para os comportamentos
nas relações afetivas, daí extraí o versículo anterior e
o posterior, para nos compenetrarmos um pouco mais:
“9. Não tornando mal por mal, ou injúria por injúria;
antes, pelo contrário, bendizendo; sabendo que para isto
fostes chamados, para que por herança alcanceis a
bênção”.
Quando somos insultados, ouvimos algo que nos fere. Por
um motivo que desconhecemos, alguém de nosso convívio
está de semblante sério em seu próprio mundo
introspectivo e nós achamos que é algo conosco e, por
consequência, nos comportamos de igual maneira sem
sequer entender as causas daquele comportamento.
Quando ouvimos uma verdade que não admitimos que seja
dita, quando somos caluniados, o que acontece com nosso
mundo íntimo?
Pedro aconselha que abençoemos tais pessoas, abençoar é
um desafio e tanto, porém, para vencer este desafio, o
perdão é um passo bastante promissor. Não devolver o mal
é considerado um avanço, mas é preciso ir além.
Pedro nos diz que fomos chamados para isto. É ativar, à
vontade, a coragem e a resignação para ter acesso à
herança que está em todas as nossas células, nas fibras
que nos impulsionam a ir pelo caminho da verdade e da
vida: as veredas da evolução. É a aplicação do
ensinamento do Cristo no sermão da montanha: “Bendizei
os que vos maldizem, e orai pelos que vos caluniam”.
Então alcançaremos a bênção do amor, este amor que cobre
uma multidão de pecados, e o que chegar até nós como
algo negativo transformaremos em positivo, como uma
oportunidade de aprendizado, e será muito natural
abençoar.
Analisemos o versículo que Emmanuel ressalta: “Quem quer
amar a vida e ver os dias felizes, refreie a sua língua
do mal”.
Seguem algumas atividades que evidenciam que queremos
amar iniciando por nossa vida: Alimentação saudável e
equilibrada, exercícios físicos regulares, consultas
médicas preventivas ou fidelidade aos tratamentos
médicos, músicas e leituras edificantes, hábito da
gratidão, isenção de qualquer vício, dormir bem, ter um
tempo de qualidade a sós.
Em consequência, os relacionamentos são equilibrados:
compreendendo, tolerando, perdoando e servindo as
pessoas, pois há amor. Não há exasperação com os filhos,
não existe pensamento ou verbalização contrária ao
cônjuge, nada contra o cunhado - dirá da sogra -, e o
vizinho, nem pensar. Tudo em paz com o colega de
trabalho, o subordinado, e principalmente com o chefe.
Quando amo a vida vejo os dias felizes.
É por esse motivo que não existe vontade, muito menos
interesse, em espalhar palavras más. Refreando a língua
do mal, se consegue alcançar o versículo 11: “Aparte-se
do mal, e faça o bem; busque a paz e siga-a”.
Quando as atitudes superam os equívocos experienciados e
finalmente aprende-se com eles, raramente o ser cai no
mesmo erro. Mas, só cuidar das próprias ações para não
errar, não é suficiente, é preciso expandir o olhar ao
semelhante, começando no lar, na instituição religiosa,
no trabalho, e além, nas entrelinhas do cotidiano:
ouvir, silenciar e externar apenas o que há de bom.
A paz, podemos encontrá-la no equilíbrio dos pensamentos
e na consequência dos atos, quando estamos em plena
comunhão com as leis que regem nossas vidas. A paz é
conquistada e a seguimos em contínua evolução.
Cito um trecho da obra referenciada acima, ditada por
Emmanuel:
“Insuflemos nos ouvidos alheios a tranquilidade que
ambicionamos e falemos dos outros aquilo que desejamos
que os outros falem de nós”.
Por mais que compreendamos o quanto a reclamação é
negativa, ainda fazemos muito o uso dela. É cultural,
serve até para puxar assunto, seja na fila do banco, na
espera da consulta médica, sobre o clima, sobre o time
que está na segunda divisão, sobre o Governo, e,
principalmente, das nossas dores físicas ou emocionais,
sempre escapa um pouco.
Desabafar é bom demais, mas ouvir é necessário. O outro
está de fora vibrando para que escutemos as próprias
palavras de forma racional, pontuando aqui e ali no que
precisamos atentar para entender, aceitar e se
comprometer a mudar a situação. Podemos contaminar as
pessoas com as nossas queixas. Temos que ter cuidado.
Quando falamos e há quem nos escute, o primeiro a ouvir
somos nós: as orelhas estão bem próximas da boca, e,
quando externamos, vamos pensando e procurando meios de
solução. A forma e a carga emocional precisam ser
conscienciosas para não contaminar o interlocutor.
Agradeçamos sempre a Deus por ter essas pessoas por
perto e, claro, agradeçamos a elas também.
Quem são os outros?
“Não existem outros” - foi a resposta de um mestre a um
aprendiz, quando este perguntou como temos que
tratá-los. É se ver no outro, lançar apenas o que
ansiamos de bom para atingir o todo, a encarnados e
desencarnados.
Jesus asseverou em uma das suas máximas simples e
profundas: “(...) pois a boca fala do que está cheio o
coração” - um autoexame eficaz para conhecermos o que há
em nós, o que pode ser extirpado e o que pode ser
conquistado. Ações como: apontar, criticar
negativamente, sentenciar seja quem for, mesmo que nosso
senso de justiça indique que a pessoa mereça, impedem de
compreender que somos todos irmãos, inclusive daquela
pessoa cujas ações abominamos. Vivenciar exatamente o
que o nosso irmão maior ensinou: “Sede, pois,
misericordiosos, como também vosso Pai é
misericordioso”.
Ainda não conseguimos praticar o que Jesus pediu: amar
uns aos outros. Vamos ao menos compreender, respeitar,
perdoar e, em breve, abençoar. Assim teremos, através da
comunicação, os relacionamentos que terão vencido os
instintos e as sensações, trilhando pelos melhores
sentimentos até atingir o amor, internalizando a
compreensão sobre o amor que encontramos em O
Evangelho segundo o Espiritismo nas palavras de
Lázaro: “(...) não o
amor no sentido vulgar do termo, mas esse sol interior
que condensa e reúne em seu ardente foco todas as
aspirações e todas as revelações sobre-humanas”.
Referências bibliográficas:
BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. Livro
de Hebreus, cap. 12, versículo 1.
EMMANUEL (Espírito). Palavras de Vida
Eterna, [psicografado por] Francisco Cândido Xavier
– 42º Edição, Uberaba, MG: Comunhão Espirita Cristã,
1964.
BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. 1°
Livro de Pedro, cap. 3, versículo 10.
BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. 1°
Livro de Pedro, cap. 4, versículo 8.
BIBLIA. Português. Bíblia sagrada Livro
de Mateus, cap. 12, versículo 34.
BIBLIA. Português. Bíblia sagrada. Livro
de Lucas, cap. 6, versículos 27 e 36.
Kardec, Allan. O Evangelho segundo o
Espiritismo. Tradução de Matheus Rodrigues de
Camargo. 1° edição. 40° reimpresso. Capivari. São Paulo.
Editora EME. 2000, P. 119.
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