Cinco-marias

por Eugênia Pickina

 

Útil desocupação


Férias de escola implicava para nós um tempo de liberdade.

Sem o roteiro da escola, e gestantes de nossas atividades lúdicas, havia espaço para mil invenciones, olho liberado para analisar a ordem das abelhas e das formigas no jardim ou, ainda,  tomar emprestado o avental na cozinha para brincar de casinha no gramado e só o instante de agora.

De manhã cedinho? Ajudávamos a preparar com aplausos o café da manhã. Espremer laranjas dava trabalho! E aguardar o bolo de cenoura esfriar? Um exercício virtuoso.

Na hora do almoço? Enquanto a Rosa paciente fazia a comida, ficávamos sentados à mesa explorando parlendas ou cantando música a três bocas. E repetíamos sem vergonha aquelas que eram as preferidas…

À tarde? Nada para fazer? Corríamos para o fundo do quintal para ajudar o trabalho no varal – e os pregadores ganhavam vida em nossa imaginação: ilha perdida, tesouro, divertidos piratas…

À noite, depois do jantar, ouvíamos interessantes histórias e sentíamos medo, tristeza, raiva, assombro, alegria, felicidade… Tão valioso o bom sono depois do curioso passeio intermundo…

Nas férias, havia tempo para viver tranquilamente o dia, espiar a borboleta perdida. À margem do riozinho, escutar um renque de vozes e, no entardecer, notar na praça, pertinho de casa, um animalzinho estranho, uma árvore que nos acolhia em seu silêncio.

Criança, nas férias, exercita a desocupação – está liberada do roteiro escolar – e por isso tem direito a experimentar outras coisas... Na varanda do apartamento, por exemplo, cabem cabana e bolha de sabão. No final de semana, com a mãe, com o pai, cantar e dançar, segundo os ritmos próprios da infância, pois, creio eu, ainda somos gerados da mesma maneira…

A vida é assim. Em janeiro, com o tempo livre, as crianças querem brincar e em certos momentos não fazer nada. Em determinados dias, simplesmente ficar eufórico o meninozinho descendo a escada daquele antigo edifício público, quando a mãe vai ao centro da cidade pagar conta e comprar flores.

 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita