Útil desocupação
Férias de escola implicava para nós um tempo de
liberdade.
Sem o roteiro da escola, e gestantes de nossas
atividades lúdicas, havia espaço para mil invenciones,
olho liberado para analisar a ordem das abelhas e das
formigas no jardim ou, ainda, tomar emprestado o
avental na cozinha para brincar de casinha no gramado e
só o instante de agora.
De manhã cedinho? Ajudávamos a preparar com aplausos o
café da manhã. Espremer laranjas dava trabalho! E
aguardar o bolo de cenoura esfriar? Um exercício
virtuoso.
Na hora do almoço? Enquanto a Rosa paciente fazia a
comida, ficávamos sentados à mesa explorando parlendas
ou cantando música a três bocas. E repetíamos sem
vergonha aquelas que eram as preferidas…
À tarde? Nada para fazer? Corríamos para o fundo do
quintal para ajudar o trabalho no varal – e os
pregadores ganhavam vida em nossa imaginação: ilha
perdida, tesouro, divertidos piratas…
À noite, depois do jantar, ouvíamos interessantes
histórias e sentíamos medo, tristeza, raiva, assombro,
alegria, felicidade… Tão valioso o bom sono depois do
curioso passeio intermundo…
Nas férias, havia tempo para viver tranquilamente o dia,
espiar a borboleta perdida. À margem do riozinho,
escutar um renque de vozes e, no entardecer, notar na
praça, pertinho de casa, um animalzinho estranho, uma
árvore que nos acolhia em seu silêncio.
Criança, nas férias, exercita a desocupação – está
liberada do roteiro escolar – e por isso tem direito a
experimentar outras coisas... Na varanda do apartamento,
por exemplo, cabem cabana e bolha de sabão. No final de
semana, com a mãe, com o pai, cantar e dançar, segundo
os ritmos próprios da infância, pois, creio eu, ainda
somos gerados da mesma maneira…
A vida é assim. Em janeiro, com o tempo livre, as
crianças querem brincar e em certos momentos não fazer
nada. Em determinados dias, simplesmente ficar eufórico
o meninozinho descendo a escada daquele antigo edifício
público, quando a mãe vai ao centro da cidade pagar
conta e comprar flores.
|