Causas
anteriores
das
aflições
A reencarnação é - antes de tudo - um processo
educacional
“Se as causas das aflições não se encontram na vida
atual, há de estar numa existência precedente.” - Allan
Kardec
Falando a respeito da justiça das aflições, o Mestre
Lionês afirma,
entre outras coisas, algo que devemos acatar como eixo
para os nossos raciocínios: “(...)
as vicissitudes da vida derivam de uma causa e, pois que
Deus é justo, justa há de ser essa causa”.
Evidentemente ninguém sofre porque Deus castiga, mas
simplesmente porque somos as primeiras e infalíveis
vítimas de nossos próprios equívocos, tanto do passado
quanto do presente. As vicissitudes são corolários de
nossos ancestrais desvios do caminho reto e não têm
caráter punitivo, e, sim, educativo. Daí ter Kardec
ensinado: “(...)
interroguem friamente suas consciências todos os que são
feridos no coração pelas vicissitudes e decepções da
vida; remontem passo a passo à origem dos males que os
torturam e verifiquem se, as mais das vezes, não poderão
dizer: “se eu houvesse feito, ou deixado de fazer tal
coisa, não estaria em semelhante condição”.
A quem, então, há de o homem responsabilizar por todas
essas aflições, senão a si mesmo? O homem, pois, em
grande número de casos, é o causador de seus próprios
infortúnios; mas, em vez de reconhecê-lo, acha mais
simples, menos humilhante para a sua vaidade, acusar a
sorte, a Providência, a má fortuna, a má estrela, ao
passo que a má estrela é apenas a sua incúria...
Os males dessa natureza fornecem, indubitavelmente, um
notável contingente ao cômputo das vicissitudes da vida.
O homem as evitará quando trabalhar por se melhorar
moralmente, tanto quanto intelectualmente”.
Assim como Deus não castiga, ao contrário do que muita
gente pensa, ninguém reencarna propriamente para pagar
ou ressarcir... Embora exista a nuança de expiação nas
reencarnações de nosso nível evolutivo, estamos antes
passando por um processo educacional do que pura e
simplesmente por expiação. Nesse passo, atentemos no
raciocínio do psicólogo espírita Adenáuer Novaes: “(...)
é preciso entender que não se paga carma passado. Na
verdade, se aprende o que não se sabia. Não reencarnamos
para pagar ou ressarcir, mas para nos educar quanto ao
nosso processo evolutivo. Pagar débitos é uma
interpretação enviesada do processo evolutivo de acordo
com a noção antiga de pecado e de bem e mal.
Enquanto se aprende se corrige distorções vividas no
passado. A correção do passado não é objetivo da
reencarnação, mas sim a educação do Espírito quanto às
leis de Deus. Portanto, pode-se ter carma positivo ou
carma negativo, isto é, pode-se retornar a um novo corpo
com qualidades já aprendidas, que significam créditos,
ou com “déficit” de capacidades por equívocos cometidos.
O que se conhece como carma significa ação e reação
simultâneas, já que não existem isoladas. O chamado
carma positivo é aquele a cuja ação corresponderá uma
reação passiva, isto é, algo vem de retorno em
benefício. O chamado carma negativo é aquele cuja ação
exigirá uma reação ativa, isto é, seu agente deverá
atuar para merecer.
Ninguém é obrigado a ter sido sempre bom e correto.
Deve-se considerar as circunstâncias, a época e a
cultura e aceitar a execução dos erros como
características naturais do humano, propondo-se ao
aprimoramento interior para libertar-se”.
Nos tempos dos feudalismos, na velha Europa, um senhor
feudal encantou-se por uma de suas campesinas a ponto de
prender a própria esposa no subterrâneo de seu castelo
para poder viver com a sua amada. Hoje em dia estão os
três outra vez reencarnados, e a ex-campesina tornou-se
a filha mais nova do antigo amante com a esposa que fora
aprisionada. Evidentemente, por força do carma negativo
os dois são odiados pela antiga vítima dessa história
passional. Mas, encontram-se outra vez juntos, não por
castigo, sim para o reajuste das emoções e paixões, onde
o amor e o perdão devem agir no sentido de restabelecer
o equilíbrio. Desnecessário dizer quão grande é o
calvário de dores de todos os envolvidos nesse drama que
deu origem a conflitos, depressões e frustrações de
variegado matiz...
Hoje em dia a moderna psicologiavem
ratificando os postulados espiritistas e com relação ao
assunto em tela, podemos ver como essa ciência aborda a
questão do
DETERMINISMO DA CONDUTA
“Um princípio fundamental do desenvolvimento científico,
em todos os campos, é o de que todos os fenômenos estão
determinados, quer dizer, respondem a uma causalidade,
por mais complexa que essa possa ser; em outros termos,
o princípio do determinismo afirma o condicionamento
causal de todos os fenômenos.
No terreno da psicologia, isso tardou a se introduzir e,
consequentemente, ainda mais a se demonstrar. A
complexidade especial dos fenômenos psicológicos fez com
que essa tarefa fosse muito gradual, de tal maneira que,
enquanto outras ciências progrediam em função do
princípio do determinismo, a psicologia girava ainda em
torno da polêmica entre determinismo e livre-arbítrio.
Freud é quem estudou e demonstrou o caráter causal dos
fenômenos psicológicos, de tal maneira que a indagação
dos motivos da conduta é uma de suas grandes
contribuições à psicologia e em tal grau, que uma das
características da psicologia moderna é a de ser
dinâmica, quer dizer, estudar as motivações.
SOBREDETERMINAÇÃO CAUSAL
Pode-se deduzir que toda conduta (normal ou patológica)
acha-se sobredeterminada, quer dizer, que tem uma
policausalidade muito complexa que deriva de distintos
contextos ou múltiplas relações nos quais se acha todo
ser humano em cada uma de suas condutas. Em outros
termos, nunca está operando uma só causa”.
Evidentemente, como se trata de autor não espírita ele
não atinou com as condutas manipuladas por obsessores,
mas podemos entender que quando ele mencionou “policausalidade” aí
se incluem as desse naipe. E aí caímos no terreno dos
conflitos, que também são tipificados pela psicologia.
TIPOLOGIA DOS CONFLITOS
K. Lewin estudou três tipos de conflitos que chama,
respectivamente, de: atração-atração, rejeição-rejeição
e atração-rejeição.
No conflito atração-atração, o sujeito confronta-se com
dois objetos que são atraentes, ou que ele deseja. É o
caso de quem tem que decidir entre duas carreiras que
são ambas atraentes ou interessantes para ele. A esse
tipo de conflito, corresponde a alternativa do asno de
Buridán que, tendo dois fardos de feno, morre de fome
por não poder escolher.
No conflito rejeição-rejeição, o sujeito vê-se obrigado
a escolher entre dois objetos ou situações que são ambos
desagradáveis, perigosos ou rejeitantes. É o dilema de
Caribdis e Escila, nomes de um turbilhão e um recife do
estreito de Mesina, terror dos navegantes que, desejando
evitar um, caíam no outro.
No conflito atração-rejeição, o sujeito enfrenta
tendências ou atitudes contraditórias dirigidas ao mesmo
objeto. Diferencia-se dos dois anteriores em que as
tendências são opostas e recaem, não sobre objetos
distintos, e sim sobre um mesmo objeto.
AMBIVALÊNCIA & DIVALÊNCIA
O conflito que K. Lewin denomina atração-rejeição é o
tipo de conflito que Bleuler chamou de ambivalência, e
que consiste na coincidência sobre o mesmo objeto, ao
mesmo tempo de atitudes, impulsos ou afetos
contraditórios. No caso, por exemplo, do amar e odiar
uma mesma pessoa ao mesmo tempo. Esse tipo de conflito é
acompanhado de grande tensão e/ou ansiedade, de uma
situação de grande insegurança porque periga o objeto
que alguém deseja, pelo ódio ou a rejeição que se lhe
tem ao mesmo tempo. Vai acompanhado de depressão e
culpa. É o tipo de conflito e de relação objetal que M.
Klein chamou de posição depressiva, e à ansiedade que a
acompanha de ansiedade depressiva. Essa última
corresponde ao que habitualmente reconhecemos como
tristeza.
(...) O conflito ambivalente pode resolver-se sobre o
plano de uma integração que permita aceitar aspectos
positivos e negativos ao mesmo tempo, tanto no objeto
como em si próprio. Isso significa uma maior integração
do ego, que coincide sempre com um maior, ou melhor,
sentido de realidade.
Mas o conflito ambivalente (a posição depressiva),
quando não resolvido, é o ponto de partida de todas as
situações conflituosas e das condutas defensivas que
tendem a reduzir ou resolver a tensão ou a ansiedade que
acompanha o conflito. Essas últimas agem, todas,
dissociando o conflito ambivalente nas duas tendências
ou atitudes contrapostas que o compõem; cumpre-se assim
a passagem (a regressão) ao que Pichon Rivière chamou de
divalência, que é a divisão em duas condutas
dissociadas, com dois objetos distintos. Um exemplo
disso é a situação de conflito ambivalente em que se
quer e odeia ao mesmo tempo, por exemplo, a mãe; a
passagem à divalência cumpre-se quando, por exemplo,
retém-se o amor à mãe e o ódio é totalmente transferido
a uma irmã. Cumpre-se, assim, uma dissociação
esquizoide, na qual a relação objetal é agora com
objetos parciais, porque cada um dos objetos está ligado
a uma parte do ego do sujeito e a um só dos termos
parciais do conflito total ambivalente”.
Chamou nossa atenção a observação do autor quando se
referindo à “dissociação esquizoide”, ele afirmou
que a relação objetal, nesse caso, é com objetos
parciais, porque cada um dos objetos está ligado a uma
parte do ego do sujeito.
Na verdade, o que podemos observar aí é o que Allan
Kardec chamou de Causas Anteriores das Aflições, onde
os integrantes das tramas e dramas do pretérito voltam
ao proscênio terrestre imantados uns aos outros para o
devido reajuste que, mais dia menos dia, invariavelmente
chega, saindo das penumbras do pretérito as motivações
que determinam os desajustes atuais.
É auspicioso verificarmos
como os livros da área da psicologia, vindos a lume nas
mais recentes bienais, vêm ratificando os ensinamentos
espiritistas aqui aportados lá pelos meados do século
XIX, provando ser o Espiritismo uma Doutrina de
vanguarda que veio para ficar para sempre, como muito
bem o prognosticou Jesus.
-
KARDEC, Allan. O Evangelho seg. o
Espiritismo. 125. ed. Rio: FEB, 2006, cap.
V, item 6, § 4º.