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por Marcus Vinicius de Azevedo Braga

 

No tempo em que eu era menino


A infância, em especial da década de 1970/1980, é mitificada. Vista como um tempo idílico, nas palavras de um mundo atual que é fruto de muitas transformações nas décadas seguintes. Foi muito bom esse tempo de “Sessão da tarde”, mas tem coisas de que devemos nos envergonhar, necessitando ajustes sim. A lei de progresso nos recorda essa necessidade de mudar, em especial sobre algumas coisas que não nos deixam nenhuma saudade.

É fato que o mundo pode não ter evoluído tanto assim nesses quesitos que serão tratados aqui, mas o repúdio dessas práticas, ainda que no discurso, mostra que já foi dado um primeiro passo, de uma longa caminhada. O progresso é uma força inexorável, mas depende de nós como se dá o seu ritmo.

Quando eu era menino o desrespeito se materializava pelas palavras que ofendiam pessoas pela cor da sua pele ou pela sua orientação sexual, nas piadas ou nos xingamentos. A escola era um lugar de ofensas por características pessoais, fazendo do espaço de aprendizado um local de sofrimento.

Quando eu era menino, se prendia passarinho em gaiola. E se matava eles com atiradeira; se maltratavam gatos e cães como uma cultura de curiosidade mórbida sobre os animais e as suas reações. Como reis da natureza, nos sentíamos no direito de destruir as coisas, de sermos causadores de sofrimento coletivo, patrocinando desde balões de festas junina até jogar lixo indiscriminadamente em rios ou no mar.

Quando eu era menino, ter deficiências de aprendizagem era ser tachado de burro. Ter problemas psicológicos era ser chamado de maluquinho. Ser deficiente era ser apelidado de aleijado e outras alcunhas. Sair do normal era ser rotulado, o que fazia muitas dessas pessoas se esconderem nas suas casas, se privando do convívio social. Mais sofrimento!

Quando eu era menino, não se usava cinto de segurança, não se respeitavam regras de trânsito, semáforos ou coisas similares. Não tinha assentos segregados para deficientes, prioridades em filas para idosos e assim vivíamos, contando com a boa vontade de quem tinha alguma consciência coletiva, para dar o lugar no ônibus, entendido como um sinônimo de cavalheirismo o ato de mitigar o sofrimento do próximo.

Encantados por uma ideia de um mundo chato, de um conceito difuso de politicamente correto, minimizamos avanços na fraternidade e na mitigação do sofrimento na vida em sociedade, esquecidos da lição de “O Livro dos Espíritos”, na sua questão 766, que nos impõe um dever: “Deus fez o homem para viver em sociedade”.

Mas esse viver coletivo precisa ter progressos coletivos, que se espelham no indivíduo. Uma felicidade presa no passado de nossa memória pode se mostrar postiça, aprisionada em uma visão individualista, que não respeita outros indivíduos. Não é por isso que os Espíritos trazem o contido na pergunta 777 do mesmo livro, que deixamos de fecho neste texto, para a reflexão:

777. Tendo o homem, no estado de natureza, menos necessidades, isento se acha das tribulações que para si mesmo cria, quando num estado de maior adiantamento. Diante disso, que se deve pensar da opinião dos que consideram aquele estado como o da mais perfeita felicidade na Terra?

Que queres! é a felicidade do bruto. Há pessoas que não compreendem outra. É ser feliz à maneira dos animais. As crianças também são mais felizes do que os homens feitos.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita