O perfil de Guerra Junqueiro, escrito pelo indignado
Quintão em 1932, em introdução aos versos atribuídos ao
poeta, mudou de tom na edição seguinte do Parnaso.
O "bardo" português, definido como “notável por sua
hostilidade à Igreja de Roma" na versão original, passou
a ser admirável por sua "veia combativa e satírica". Era
o início da censura na literatura espírita. Era também
uma alteração adequada a quem, como Chico, passaria a
vida repetindo: Não vim para brigar com ninguém. Não vim
para dividir. Mas dividia.
O romancista mineiro João Domas Filho, por exemplo, se irritaria
com os poemas assinados por Olavo Bilac na nova edição do Parnaso:
"Ele, que nunca escreveu um verso imperfeito, nem em sua pior
fase, depois de morto ditou ao médium sonetos inteiros abaixo do
medíocre".
O ferino Osório Borba, autor de A Comédia Literária,
decidiu assistir a uma sessão no Centro Espírita Luiz Gonzaga.
Sem se identificar, viu Chico espalhar versos pelas páginas em
branco em velocidade surpreendente, mas não se convenceu. Após o
"espetáculo", ele conversou com o autor do Parnaso e foi
honesto: duvidava da possibilidade de os espíritos se
manifestarem com sua ajuda, mas acreditava na sua honestidade.
Chico seria apenas uma vítima inconsciente de fenômenos ainda
pouco estudados.
Os poemas e poetas recém-chegados à nova edição do Parnaso geraram
boatos mirabolantes. Os católicos mais empedernidos chegaram a
acusar a Federação Espírita Brasileira de manter uma comissão de
escritores encarregada de inventar todos aqueles versos em
sigilo absoluto. A causa era nobre: convencer os incrédulos da
existência de espíritos. Chico Xavier desempenharia o papel do
ignorante sem tempo nem cultura para escrever os poemas, mas
capaz de ser porta-voz dos mortos, em troca de dinheiro e em
nome da divulgação do Espiritismo.
Os rumores eram tão fortes que Chico tratou de arquivar, com
cuidado, os originais de todos os textos vindos do "outro
mundo". Quando lhe sugeriram transferir a papelada de Pedro
Leopoldo para a sede da Federação Espírita, no Rio, ele recusou.
Precisava ter seus garranchos sempre à mão para mostrar aos
céticos. Fez bem. Mais tarde, ele mostraria suas "provas" a dois
padres e três protestantes interessados em desmistificar a
"fraude mineira".
Do livro As vidas de Chico Xavier, de Marcel Souto Maior.
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