Vontade
e desejo
Dialogava, certa feita, com um experiente expositor,
hoje desencarnado, quando passamos a refletir sobre
nossas lutas íntimas – a complicada e dolorosa superação
de hábitos inadequados. Em certo momento, perguntei a
ele:
- Mas, afinal, o que nos falta para acertarmos o passo?
Tanto já nos foi dito e mostrado e continuamos presos à
retaguarda espiritual! Todas as grandes tradições
filosóficas e religiosas do passado – no Egito, na
Índia, na Grécia – apresentaram propostas de superação
pessoal; Jesus mostrou, de forma simples e didática,
como devemos agir em cada situação da vida; Kardec, como
embaixador do Mundo maior, adequou todas essas ideias à
mentalidade do homem moderno, mas nós persistimos no
erro, continuamos fazendo escolhas menos felizes,
ferindo corações amigos, desconsiderando o bem coletivo
por excessivamente apegados ao bem pessoal! O que nos
falta, afinal?!
A sua resposta, dada em uma só palavra, surpreendeu-me
pela precisão:
- O que nos falta é decisão! Decisão para
fazermos o que deve ser feito!
Esse pensamento nos remete ao item novecentos e nove de
O Livro dos Espíritos, onde identificamos uma das
afirmações mais contundentes da codificação:
Poderia sempre o homem, pelos seus esforços, vencer as
suas más inclinações. O que lhe falta é a vontade. Ah!
Quão poucos dentre vós fazem esforços!
A palavra central no texto parece ser vontade,
que, filosoficamente, difere de desejo.
Desejo evoca
um querer projetado para o futuro, que não se
concretiza, que espera um dia vir a acontecer. Vamos
encontrá-lo no fumante que deseja deixar de
fumar, mas não o faz.
Vontade,
por sua vez, evoca um querer que se fez, que aconteceu,
que não é uma promessa, mas que já está se dando. Se
identifica com o indivíduo com excesso de peso que,
fazendo valer sua vontade, perdeu dez quilos.
Deixar a dimensão do desejo e nos identificarmos
com a vontade é fazer prevalecer a decisão, única
ferramenta que pode nos habilitar a uma condição
espiritual melhor.