Não se tratava de
pleonasmo
Para receber a palavra divina é necessário
apresentar o coração vazio de resíduos da Terra
“E Ele lhes disse: como não entendeis ainda?” - Jesus.
(Mc., 8:21).
Misoneísta por excelência, a humanidade tem sido
contumaz na atitude de fazer ouvidos moucos a
todo fator ou a qualquer situação que, de uma
forma ou de outra, venha desalojá-la de sua
ancestral quão funesta acomodação. Assim, vão se
forjando as paralisantes tradições na esteira do
tempo, e as criaturas não se sentem motivadas a
se emanciparem do círculo vicioso que as
conservam limitadas entre as inexpugnáveis e
cerceantes muralhas da mesmice...
Profundo
conhecedor das humanas limitações, Jesus não
estava Se valendo de pleonasmos nas expressões
neotestamentárias, quando Se referia a “olhos
de ver” e “ouvidos de ouvir”. Sua
intenção outra não era senão chamar a atenção de
Seus ouvintes. Era como se dissesse: “prestem
atenção!”; “o que eu vou lhes dizer agora é
importante para suas vidas!”; “fiquem atentos!”;
“não deixem passar esta oportunidade de
aprendizado!...”. Tal, também, o sentido de
Sua frase inúmeras vezes repetida: “em
verdade, em verdade vos digo...”
Até mesmo os próprios integrantes do Colégio
Apostólico não conseguiam, algumas vezes,
alcançar o sentido de muitas palavras Suas. Só
mais tarde é que iriam compreendê-las, exceto
aqueloutros ensinamentos que ficariam sob o
encargo do outro Consolador revelar, bem
mais tarde...
Na verdade, hodiernamente, entender, nós já
entendemos. O difícil é transportar o “discurso” teórico
para o “curso” prático de nossas vidas.
Como temos lá as nossas dificuldades, as nossas
idiossincrasias e nossos sofismas, vamos
continuando a nos fazer de desentendidos. É
assim que ainda nos damos ao luxo de conservar
comburentes mágoas em nosso coração, quando Ele
ensinou que devemos levar as expressões do vero
amor até mesmo aos nossos mais ferrenhos
inimigos.
Muitas vezes
Jesus perguntou aos Seus boquiabertos ouvintes: “por
que não me entendeis?”
Ante tão direto
questionamento de Jesus, Emmanuel elucida: “a
linguagem do Cristo sempre se afigurou a muitos
aprendizes indecifrável e estranha... Fazer todo
o bem possível, ainda quando os males sejam
crescentes e numerosos; emprestar sem exigir
devolução; desculpar incessantemente; amar os
próprios adversários; ajudar aos caluniadores e
aos maus...
Muita gente escuta a Boa Nova, mas não lhe
penetra os ensinamentos. Isso ocorre a
muitos seguidores do Evangelho, porque
utilizam a força mental em outros setores. Creem
vagamente no socorro celeste, nas horas de
amargura, mostrando, porém, absoluto
desinteresse ante o estudo e ante a aplicação
das leis divinas. A preocupação da posse lhes
absorve a existência... Reclamam o ouro do solo,
o pão do celeiro, o equilíbrio da carne, o
prazer dos sentidos e a consideração social, com
tamanha volúpia que não se recordam da posição
de simples usufrutuários do mundo em que se
encontram, e nunca refletem na transitoriedade
de todos os patrimônios materiais, cuja função
única é a de lhes proporcionar adequado clima ao
trabalho na caridade e na luz para
engrandecimento do espírito eterno.
Registram os chamamentos do Cristo, todavia
algemam furiosamente a atenção aos apelos da
vida primária. Percebem, mas não ouvem.
Informam-se, mas não entendem. Conservam no
coração enormes potenciais de bondade, contudo,
a mente deles vive empenhada no jogo das formas
perecíveis. São preciosas estações de serviço
aproveitável com o equipamento, porém, ocupado
em atividades mais ou menos inúteis.
Não nos esqueçamos, pois, de que é sempre fácil
assinalar a linguagem do Senhor, mas é preciso
apresentar-lhe o coração vazio de resíduos da
Terra, para receber-Lhe, em espírito e verdade,
a palavra divina”.
Também comentou
com muita precisão o nosso irmão Martins Peralva:
“ante a realidade do túmulo vazio, situado nos
generosos domínios de José de Arimateia, as
mulheres que tinham vindo da Galileia se
lembraram das palavras de Jesus, acerca da
ressurreição no terceiro dia... Enquanto o
Senhor estava com elas, com os discípulos e o
povo, que Lhe desfrutavam a presença sublime, não
Lhe conseguiam guardar os ensinos, pois Lhe
esqueciam as lições, claras algumas vezes,
noutras ocasiões ocultas sob o véu da alegoria e
das parábolas. Ouviam, mas não guardavam. Registravam
a suave ressonância do Seu verbo luminoso, mas
não Lhe absorviam o conteúdo divino e eterno.
Inúmeras vezes, conforme descrevem os
Evangelistas, confundem os Seus ensinamentos,
dando-lhes interpretações em desacordo com o
real sentido deles.
O mesmo fenômeno se verifica com referência às
mensagens que a Espiritualidade Superior nos
está enviando, em sucessivas ondas de luz e
amor, numa demonstração de que as comportas
celestes continuam abertas de par em par.
Jesus retornou ao
mundo para educar e salvar, para consolar e
esclarecer. Trouxe-nos, de novo, fartas messes,
que nos compete assimilar
e reter, ouvir e guardar...
Lições em torno da fraternidade, para que o amor
se expanda; incentivos ao estudo nobre, para que
a cultura dignifique e eleve a criatura humana;
exortações à indulgência, para que a compreensão
e o respeito favoreçam a convivência harmoniosa;
valiosos conceitos sobre o perdão, para que se
não adube a sementeira do ódio; incessantes
alvitres à reforma íntima, em consecutivas
efusões de luz e misericórdia, enlevam-nos o
coração comovido, sempre que as mensagens
surgem, aqui e alhures... Ao suave impulso da
palavra do Alto, indefinível paz invade-nos a
alma, trazendo-nos a confortadora certeza da
presença do Mestre no santuário da nossa
consciência.
Todavia, obediência e fraternidade, estudo e
indulgência, perdão e esforço renovador são,
ainda, os “grandes ausentes” da nossa
caminhada. Mais tarde, contudo, quando se der o
inevitável retorno de nossos Espíritos aos
planos subjetivos, pela desencarnação,
lembrar-nos-emos, surpresos ou desolados, das
palavras desses abnegados instrutores...
A mensagem renovadora é tão necessária ao
Espírito imortal como o pão diário ao corpo
transitório. É imprescindível, contudo, não só
assimilar e reter, ouvir e entender, mas,
sobretudo, guardar e viver o que o Céu tem
enviado, com tamanha prodigalidade, mercê de
instrumentos mediúnicos devotados e seguros.
Guardar o ensino, exemplificando-o, constitui,
em verdade, garantia de aproveitamento e
iluminação, agora e sempre, hoje e amanhã...”