Natural de Cachoeiro do Itapemirim (ES), onde
reside, Gabriel de Oliveira Mathias (foto) é
o nosso entrevistado. Advogado na vida
profissional, há anos ele oferece sua
experiência com a música em favor da divulgação
espírita. Organizador entre 2012 e 2019 da
Mostra Musical Espírita, evento realizado
anualmente em sua cidade, é também o criador do
site Acervo Espírita, que tem por objetivo
divulgar a música espírita.
Como e quando se tornou espírita?
Apesar de ao menos em tese ter nascido
relativamente em berço espírita, só passei a
frequentar o Movimento Espírita aos 20 anos,
chegando de forma tardia à mocidade, quando passei
a frequentar a COMEERJ (Confraternização de
Mocidades Espíritas do Estado do Rio de
Janeiro), Polo I Betânia (Campos dos
Goytacazes).
De onde veio seu interesse específico para a
música espírita?
O interesse pela música espírita foi uma
consequência natural do meu interesse pela
música. Sempre fui bom ouvinte de música - do
jazz ao rock pesado. E durante algum tempo tive
bandas de rock com amigos fora do movimento
espírita. Quando cheguei à COMEERJ, comecei a
ver que existia a música espírita e em 2007 fui
convidado a integrar a equipe de música do polo.
Já sendo apaixonado por música, a música
espírita uniu o útil ao agradável,
possibilitando mais uma ramificação nos variados
gêneros e temas musicais que já me interessavam.
Como surgiu o Acervo Espírita?
O Acervo Espírita surgiu de uma forma no mínimo
inusitada. A princípio não existia exatamente a
proposta de um site. Ocorre que em 2009, que
tocava contrabaixo há quase 10 anos, comprei meu
primeiro violão e descobri que a facilidade de
memorização que eu tinha enquanto baixista numa
banda de rock, eu não possuía enquanto
violonista em qualquer circunstância. Diante
disso, iniciei uma pequena coleção das músicas
tocadas no Polo I da COMEERJ e disponibilizei em
um formato de site estático, mas que já possuía
ao menos uma organização alfabética. Alguns
amigos da cidade de Campos dos Goytacazes,
dentre eles os compositores Junior Vidal e
Evaldo Junior, acharam interessante incluir suas
músicas no site, que então começou a crescer. A
notícia foi-se espalhando e recebi mensagens
amigas de pessoas maravilhosas como Mário
Joanoni (Araras), Lirálcio (São Paulo), Silvio
Sodré (Brasília), Adelquis Monteiro (Teresina) e
vários outros que, interessados em
disponibilizar seu trabalho no site, iniciaram o
que seria a transformação do Acervo Espírita de
uma apostila pessoal em forma de site em um
portal de divulgação da música espírita aberto a
todos os artistas que estivessem interessados em
divulgar seu trabalho.
Em números aproximados quantos autores e músicas
ali estão reunidos?
Atualmente são aproximadamente 1.750 pessoas
(compositores e intérpretes) cadastrados, 7.000
músicas e 550 álbuns.
O site permite uma busca bem detalhada, por
autor, música, álbum. Também há contagem de
acessos por autor e por música? E qual é o
gênero mais procurado?
Permite, sim. Há uma contagem interna de acessos
para cada subpágina e, naturalmente, acessos por
autor e por música. O gênero mais consultado na
verdade nem é um gênero musical, mas um uso. As
buscas por músicas para se usar em aulas de
evangelização são as mais frequentes. Em virtude
de um longo período de pouca organização e de um
certo descaso pela nomeação dos autores das
músicas, o público de música espírita ainda tem
pouca afinidade com o nome dos artistas
espíritas e o título das músicas, de modo que a
busca é mais temática do que personificada. As
pessoas acessam o site em busca de um trecho de
música, o nome genérico ou mesmo para ouvir as
músicas da rádio aleatoriamente.
Como é a questão de direitos autorais, no
relacionamento com autores musicais?
Preliminarmente, insta salientar que todas as
músicas presentes no site ou foram enviadas
pelos próprios autores e/ou intérpretes ou
solicitadas a ele. Não há no Acervo Espírita
nenhuma música disponível para audição ou
download que não tenha sido autorizada pelo seu
proprietário. Todavia existem vários pontos
nebulosos na construção de um site como o Acervo
Espírita no que tange respeito à propriedade
intelectual. O primeiro ponto é histórico:
durante décadas para se evitar acusações de
personalismo e vaidade, compositores deixaram de
registrar suas músicas, tornando a localização e
o resgate desse material bastante completo. O
segundo ponto é moral: os artistas espíritas
foram durante muito tempo (e ainda são em menor
intensidade) chamados de personalistas, vaidosos
e até mesmo de obsidiados pelo simples fato de
serem chamados de artistas. Nesse clima de
julgamento prévio, muitos artistas deixaram de
assinar suas músicas, divulgando-as sem a
inscrição de compositor ou com nomes genéricos
como "vários autores" ou "criação coletiva". O
terceiro ponto é, por assim dizer, mediúnico: A
produção cultural espírita é, em grande parte,
intuída ou inspirada, em maior ou menor
intensidade, através da mediunidade. No caso da
música, esse intercâmbio não raro gera uma
produção cultural que vai além da capacidade do
artista em divulgar voluntariamente o seu
trabalho, pois, diferente do livro, que é um
produto com grande aceitação no meio espírita, a
música em muitos casos só é divulgada através da
presença física de seu compositor, o que para a
maioria é inviável. Dito isso, um compositor
espírita geralmente compõe mais músicas do que é
capaz de apresentar e muito mais do que é capaz
de registrar legalmente e simplesmente não é
capaz de gravar a maioria de suas músicas, pois
os investimentos são altos e, geralmente, correm
a expensas do próprio artista. O quarto ponto é
estrutural: Sendo quase a totalidade dos
artistas voluntários da arte com outras
profissões fora do movimento espírita, uma
ínfima quantidade de músicas compostas chega a
ser gravada em estúdio. Com a inexistência de
registros formais de proteção legal e com a não
gravação de fonogramas, muitas músicas ficam
protegidas apenas pela boa-fé, que, embora seja
até certo ponto uma regra no movimento espírita,
gera dificuldades legais para divulgação da
própria cultura, pois quando se busca divulgar
algo profissionalmente a informalidade passa a
ser um fator complicante. Por fim, o quinto
ponto é de uso e disponibilidade de tempo.
Apesar de o Acervo Espírita ser protegido pela
grande maioria das possibilidades de ação que
gere algo dano material ou mesmo criminal ao
compositor pelo fato de não existir qualquer
tipo de movimentação financeira, anúncio,
marketing ou patrocínio, alguns cuidados são
necessários. O ideal seria que cada compositor
ou intérprete enviasse um termo escrito de
autorização ou cessão de direitos para
divulgação das músicas no site, mas considerando
que a grande maioria dos artistas é formada por
voluntários que mal possuem tempo para divulgar
suas próprias músicas, a exigência de um
documento formal no melhor uso da lei para se
disponibilizar a música no site muitas vezes
equivaleria a um impedimento, pois não sendo um
comercializador de fonogramas como plataformas
digitais, o Acervo Espírita não oferece uma
contrapartida ao investimento em documentação
legal. Além disso, não há exatamente meios
seguros e formais de autorizar o uso ou ceder os
direitos de algo de que não se possui registro.
É uma espécie de limbo onde a informalidade e o
mundo jurídico se chocam sem soluções prontas e
aplicáveis a todos os casos e onde a boa-fé e o
contato via e-mail e WhatsApp formam as
manifestações de vontade que norteiam as
autorizações.
Como é a interatividade com os navegadores do
site?
A comunicação dos usuários do site é pequena. Na
maioria das vezes se restringe a pedidos de
música ou para lembrar o nome de determinada
música e sugestões de novas ferramentas para
tornar o site mais completo na visão do usuário.
A maioria da interatividade parte dos próprios
artistas que buscam o site para divulgar seu
trabalho.
Quando o Acervo Espírita foi lançado na
internet?
O site foi lançado no dia 7 de dezembro de 2010
e continua sendo abastecido, embora a demanda em
alguns momentos supere a capacidade de
atendimento visto que é um trabalho solitário
realizado quase que na totalidade por mim na
alimentação de banco de dados e por Francisco na
parte de programação e layout. (1)
De suas lembranças com autores ou músicas, qual
a mais marcante?
Correndo grave risco de esquecer alguém e ser
injusto, posso nomear dois momentos distintos e
uma aquisição de conhecimento que tive nesse
período. O primeiro momento foi a primeira vez
que recebi um e-mail do amigo Mário Joanoni, de
Araras, buscando divulgar o trabalho do grupo
que integra, o Toque Na Alma, pois foi o
primeiro artista totalmente fora do meu círculo
social de amigos presenciais que buscou
voluntariamente o Acervo Espírita para divulgar
seu trabalho. O segundo momento é bem recente.
Ocorreu quando fui apresentado pelo amigo
Clayton Prado, de Americana, ao grande
compositor Roberto Ferreira e seu incrível
trabalho mediúnico de mais de 2.200 músicas,
que, se Deus permitir, ainda teremos a
oportunidade de divulgar em sua integralidade no
Acervo Espírita. A aquisição de conhecimento a
que me refiro se deu gradualmente quando passei
a ter acesso aos artistas espíritas dos estados
do Nordeste. A riqueza cultural e a diversidade
de estilos e ritmos musicais que esses
trabalhadores trouxeram à música espírita é
tamanha que ampliou as possibilidades de
comunicação e divulgação da Doutrina através da
arte, falando através do estilo musical a todas
as pessoas, pois nenhum estilo musical foi
desprezado.
Algo mais que gostaria de acrescentar?
Primeiramente gostaria de agradecer pela
oportunidade de falar um pouco sobre esse
trabalho que transformou a minha vida e minha
relação com o movimento espírita. Em segundo
lugar, pedir aos amigos que mandam mensagens nas
redes sociais do Acervo Espírita, ou via e-mail,
que tenham paciência, pois a demanda para
solicitações de informações e inclusão de dados
no site em diversos momentos supera minha
disponibilidade de tempo para atender a todos,
mas que aos poucos eu tento responder todo
mundo, sempre pedindo desculpas quando a
resposta demora a ser enviada. Ainda assim deixo
o e-mail acervoespirita@gmail.com para
todos aqueles que quiserem entrar em contato
para tirar dúvidas, enviar críticas, sugestões
ou divulgar seu trabalho. Fiquem com Deus!
(1) Para acessar o Acervo Espírita clique em: http://www.acervoespirita.com.br/
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