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por Maria de Lurdes Duarte

 

Espíritas a caminho


"Espíritas! amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo."
 - O Espírito de Verdade (O Evangelho segundo Espiritismo, cap. VI.)


Vamos refletir. O que nos diz este conselho d' O Espírito de Verdade sobre a maneira como nos vemos a nós próprios, relativamente às nossas vivências enquanto espíritas?

Se pretendermos sintetizar em poucas palavras o lugar em que cada um se enquadra relativamente à sua posição no que respeita à crença no Espiritismo, podemos talvez definir, de um modo simples: "Não Espírita", "Espírita da Fé", "Espírita do creio-me", "Espírita a caminho". Não pretendo, de modo algum, rotular seja quem for, pretendo, muito simplesmente, trazer pontos de reflexão, encaixando-me também eu, principalmente eu, diria mesmo, nesta necessidade premente de refletir para me aperfeiçoar. Alerto também que estas definições são pessoais, para meu uso próprio, que achei por bem partilhar como recurso simples para atingir o objetivo das considerações que pretendo apresentar.

Comecemos por colocar de parte o "Não Espírita", ou seja, aquele que ainda não se identifica com a Doutrina, esperando, como Deus espera também, e respeitando a crença de cada um, ou, até mesmo, a falta dela. Cada um de nós tem seu tempo, seu modo de caminhar e sua forma de chegar à meta.

O que podemos então entender por "Espírita de Fé"? Penso que será, em princípio, o primeiro passo deste caminho que devemos percorrer para nos tornarmos Espíritas em toda acepção da palavra. Espíritas que acreditam nos conhecimentos e informações trazidos pelos Espíritos. Bastará para nos considerarmos Espíritas o fato de acreditarmos? O que fazemos com esse conhecimento? Como vemos os conselhos dados pelas Entidades comunicantes? A nossa primeira tendência, e penso que quase todos nós passamos por essa fase, quando tivemos o primeiro contato com a Doutrina, é aplicarmos, de imediato, o que ouvimos ou lemos a alguém que conhecemos, geralmente os nossos familiares ou amigos mais próximos. Esquecemos, quase sempre, de que, se Deus nos concede a benesse de tomar conhecimento do Espiritismo, não é exatamente um prêmio por bom comportamento. É mais uma oportunidade de aprendizagem, de que necessitamos para nos fortalecermos e ensejarmos a dura batalha contra os defeitos e vícios a que nos prendemos e entravam a caminhada no sentido do Bem. Tudo o que a Doutrina nos traz aplica-se, antes de mais nada, a nós mesmos, devemos sentir-nos muito gratos ao Pai, não porque ser Espírita seja o bastante, ou condição imprescindível e essencial, para sermos perfeitos. Mas porque nos fornece recursos para olharmos para dentro de nós, com maior conhecimento de causa, e respondermos às grandes questões que a Humanidade faz há bastante tempo: quem sou? de onde venho? para onde vou? qual o objetivo da minha existência? o que fazer para alcançar a felicidade? e tantas, tantas outras que nos habituamos a fazer no nosso íntimo.

Então..., que fazer com esse conhecimento? Se nos limitarmos à Fé, se não a transformarmos em obras de aperfeiçoamento, pouco valerá. Seremos os "Espíritas de Fé," mas ainda nos faltará o ser "Espíritas de ação". Já dizia S. Paulo que "posso ter muita Fé, mas, se não tiver caridade, nada sou". Estendamos esta noção de caridade a nós próprios, porque, como já nos alertava Moisés nos mandamentos, é necessário "Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos". Antes de mais, temos de nos amar a nós mesmos, para podermos amar os outros. Este amar a nós mesmos, no sentido desta nossa reflexão, significará o tudo fazermos para ser pessoas de bem, cumprir a finalidade para que Deus nos criou, trabalharmos pelo aperfeiçoamento espiritual e intelectual, condição para cultivarmos e atingirmos a felicidade.

Atingido esse patamar, podemos tentar o conselho d' O Espírito de Verdade: Amar-nos (entre espíritas) e estender esse amor a todos (o nosso próximo são todos os que compartilham o caminho conosco). Em seguida, o "Espíritas, instruí-vos". Alargar o conhecimento para perceber como alargar também o nosso campo de ação neste percurso que a atual existência nos permite.

Posto isto, o que podemos entender como "Espíritas do creio-me"? Pessoalmente, dou comigo, vezes demais do que gostaria que fosse a realidade, a inserir-me neste grupo. "Creio-me Espírita". "Creio-me pessoa de bem". "Creio-me, quem sabe até, melhor do que os outros porque sou Espírita". "Creio que estou na posse de informações que outros não têm, por não serem Espíritas". "Creio-me detentor da verdade, porque no Espiritismo está a verdade". "Creio-me merecedor de um futuro, no além, fora dos percalços que estão destinados aos ignorantes da Doutrina". "Creio-me entendido e com pleno direito de discutir assuntos de Fé e Religião, porque acredito na Doutrina dos Espíritos e aqui é que está a verdade". "Creio-me na obrigação e direito de disseminar a minha Fé, seja a que custo for, mesmo à custa do desrespeito das verdades e Fé dos outros". E por aí adiante…

Serei apenas eu que me "distraio" e caio nestas incongruências com a própria Doutrina Espírita, que é amor, respeito, caminhada pessoal, sacrifício pessoal dos defeitos íntimos, luta contra as próprias imperfeições? Por que continuamos a cair "nestas tentações", perdendo-nos em divagações que a lado nenhum nos conduzem? Simplesmente porque é o mais fácil. Ser "Espírita de Ação", de verdadeira ação, é o passo mais difícil de ser dado, mas que urge.

Neste momento que atravessamos, em que a Humanidade terrena está sendo posta à prova de modo tão intenso e doloroso, não esperemos que haja contemplações especiais para conosco, por nos dizermos Espíritas. Não esqueçamos do aviso de Jesus de que serão muitos os chamados mas poucos os escolhidos. E também não esqueçamos de que "A quem muito foi dado, muito será exigido".

Sejamos, pelo menos, "Espíritas a caminho", ou seja aqueles que, por acreditarem e se identificarem com a Doutrina, e reconhecendo humildemente a sua pequenez e as suas dificuldades e imperfeições, se servem do conhecimento e da Fé para trabalharem o seu íntimo e enfrentarem a vida com força, alento, reconfortados com a ideia de que Deus a todos ama e a todos dá os recursos para atingirem os objetivos a que se propuseram ao programarem a atual existência.

O caminho é longo e passa pelo autoconhecimento e pelo autoaperfeiçoamento. Se a luz do Espiritismo já nos ilumina a caminhada, se somos os “Espíritas da Fé”, lancemos a semente ao nosso redor, a começar pelo nosso coração. Transformemo-nos nos “Espíritas da Ação”. A sementeira é nossa; a colheita também o será. “A cada um segundo as suas obras”, como avisou o Mestre Jesus.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita