Brasil
por Ana Moraes

Ano 14 - N° 714 - 28 de Março de 2021

 

Há 82 anos desencarnava José Petitinga

 

Nesta semana o calendário apontou-nos uma data importante para os espíritas do Brasil: o dia em que desencarnou José Petitinga, o fundador da União Espírita Baiana, hoje transformada em Federação Espírita do Estado da Bahia. Corria então o dia 25 de março de 1939.

Dotado de sólida cultura geral, José Florentino de Sena (seu verdadeiro nome) notabilizou-se por suas qualidades no campo jornalístico, literário e espírita.

Nascido no dia 2 de dezembro de 1866 na fazenda denominada Sítio da Pedra, à margem direita do Rio Paraguaçu, em Nazaré, Bahia, seus pais foram Manoel Antônio de Sena e Maria Florentino de Sena.

Cabe a Petitinga a justa glória de fazer com que o movimento espírita se organizasse na Bahia, motivo pelo qual fundou a União Espírita Baiana.

Segundo se sabe, ele teria frequentado e abandonado na mocidade, por falta de recursos financeiros, os estudos acadêmicos, o que não impediu que adquirisse sólida cultura geral e se destacasse nas lides jornalísticas, literárias e espíritas.

Respeitado cultor do idioma português, recebeu importante elogio de seu amigo César Zoma, político, latinista e orador baiano, que afirmou: "Na Bahia, em conhecimentos de latim, eu, e de português, o Petitinga".

Além de colaborar com artigos em diversos jornais da Bahia, Petitinga escreveu os livros de poesias "Harpejos Vespertinos", "Madressilvas" e "Tonadilhas", obras essas que mereceram grandes elogios de vários jornais importantes da época, inclusive do Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro.


Iniciação no Espiritismo

Seu primeiro contato com o Espiritismo se deu em 1887, aos 21 anos de idade, quando leu O Livro dos Espíritos. Algum tempo e muitos estudos depois, ele fundou na cidade de Juazeiro o "Grupo Espírita Caridade", onde foram recebidas,  por meio do médium Floris de Campos Neto, belas e incentivadoras mensagens de uma entidade espiritual que assinava "Ignotus".

Mudando-se em 1912 para a cidade do Salvador, Petitinga reviveu em sua residência o "Grupo Espírita Caridade", aí reunindo companheiros dedicados igualmente aos estudos espíritas. Convidado, logo depois, a participar do "Centro Espírita Religião e Ciência", que passava por uma fase de declínio, ele tudo fez para restaurá-lo, sem nenhum sucesso. Percebeu então que a decadência daquela sociedade se devia em parte à falta de unidade doutrinária e à ausência de uma direção geral.


União Espírita Baiana

Disso lhe veio a ideia de fundar uma sociedade que pudesse orientar o movimento espírita na Bahia, surgindo assim no dia 25 de dezembro de 1915, na sede do "Grupo Espírita Fé, Esperança e Caridade", a União Espírita Baiana, atual FEEB.

No início a federativa não tinha sede definida, tendo de transferir-se inúmeras vezes de local, até que nasceu, cresceu e vingou a ideia da aquisição de uma sede própria. No dia 4 de julho de 1920, a Diretoria recebeu plenos poderes para trabalhar nesse propósito e, em 3 de outubro do mesmo ano, foi solenemente inaugurada a sede própria situada no histórico Terreiro de S. Francisco (hoje Praça Padre Anchieta, número 8).

José Petitinga presidiu a União Espírita Baiana  até a data de sua desencarnação, dando tudo de si -- material e espiritualmente -- para o engrandecimento daquela tradicional instituição e para a difusão do Espiritismo no estado em que nasceram vultos espíritas de destaque, como Deolindo Amorim, Carlos Imbassahy, Leopoldo Machado, Divaldo Franco, entre muitos outros.


Um episódio marcante na vida de Petitinga

No livro Nos Bastidores da Obsessão, Manoel Philomeno de Miranda, pelas mãos de Divaldo Franco, narra um episódio que nos mostra perfeitamente como era e como se comportava José Petitinga.

Certa vez, numa reunião pública na União Espírita Baiana, Petitinga pregava e sua palavra harmoniosa vibrava em tons de consolo, focalizando a lição de Simeão sobre "Perdão das Ofensas", constante do cap. X d' O Evangelho segundo o Espiritismo. Algumas pessoas tinham os olhos coroados de lágrimas quando, de repente, conhecido senhor de respeitável família local, obsidiado contumaz, adentrou a sala pública da sessão e, avançando em direção da tribuna, ruidosamente, bradou:

- "Hipócrita! Quem és para pregar? Imperfeito como tu, como te atreves a falar da verdade e ensinar pureza, possuindo largas faixas de desequilíbrio íntimo, que ocultas dos que te escutam?"

O constrangimento foi geral. Petitinga, empalidecendo, levantou os olhos claros e transparentes, fitou o obsessor que falara pela boca do atormentado cavalheiro, e respondeu, humilde:

- "Tens toda a razão e eu o reconheço. O tema em pauta, hoje, que o caro irmão não ouviu, se refere exatamente ao `Perdão das ofensas'..." 

A entidade não parou com as ofensas e disse que Petitinga não tinha condições morais de ensinar; por fim, o desafiou a que abandonasse a tribuna religiosa ou a vida que levava...

Petitinga, imperturbável, retomou a palavra e disse à plateia atenta que o amigo espiritual tinha toda a razão e contou que lutava com dificuldades para aprimorar-se intimamente, lapidando grossas arestas e duras angulações negativas de sua personalidade enferma. Dizia, porém, que jamais abandonaria o arado, apesar de suas imperfeições e que preferia a condição de enfermo ajudando doentes, a ser ocioso buscando a saúde para poder ajudar com eficiência... "Embora imperfeito – disse Petitinga –, deixo luzir minha alma quando contemplo a Grande Luz; vasilhame imundo, aromatizo-me ao leve rocio do perfume da fé; Espírito infeliz, mas não infelicitador, banho-me na água lustral da esperança cristã..."

O auditório, compungido e emocionado, chorava comovido, e lágrimas transparentes adornavam a face do servidor do Cristo. De repente, o perturbador espiritual arrojou ao chão o médium de que se servia, e, dominado por crua emotividade, bradou:

- "Perdoa-me, tu! A tua humildade vence-me a braveza, velhinho bom! Deus meu! Deus meu! Blasfemo! O ódio gratuito cega-me. Perdoa-me, velhinho bom, e ajuda-me com a tua humildade a encontrar-me a mim mesmo. Infeliz que sou. Tudo mentira, mendacidade inditosa, a que me amarga os lábios. Ajuda-me, velhinho bom, na minha infelicidade..."

José Petitinga desceu os degraus da tribuna, aproximou-se do sofredor e, falando-lhe bondosamente, envolveu o médium com gesto de carinho, convidando-o a sentar-se. "Perdoe-nos o Senhor de nossas vidas!", falou em discreto pranto. E levantando a voz, rogou: "Oremos todos a Jesus, pelo nosso irmão sofredor, por todos nós, os sofredores". (Obra citada, cap. 11, págs. 213 a 217.)

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita