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por Maria de Lurdes Duarte

 

Suicídio, um penoso equívoco


De todas as almas sofredoras que povoam o mundo espiritual inferior, arrastando consigo as sucessivas tragédias em que transformaram a sua própria existência, num acumular de enganos e frustrações, podemos, sem estar muito longe da verdade, ter os suicidas entre aqueles em quem as dores são mais acentuadas e difíceis de suportar.

O maior crime, perante a nossa consciência, é o de atentarmos contra a própria vida, destruindo o corpo que nos foi dado como bênção sublime, planeado e estruturado com todo o rigor, de modo a servir-nos na experiência terrena e ser nosso grande aliado nas expiações, provas, lições, aprendizagens, que nos deverão conduzir à redenção de nós mesmos e ao crescimento espiritual. Quando da preparação de cada reencarnação, visando proporcionar-nos uma situação terrena que nos permita superar as provas e dificuldades que tenhamos de enfrentar, tudo é rigorosamente e cuidadosamente planeado: os lugares que nos servirão de cenário, a família que nos receberá, os companheiros que encontraremos pelo caminho, para os mais diversos fins, e com quem teremos algo a aprender… e, indubitavelmente, o corpo que melhor servirá a esses fins. Diz Jesus que “o corpo é o santuário do espírito”. O dom da vida é o maior dom que Deus nos deu, dom esse do qual decorrem todos os outros, porque são eles desenvolvidos ao longo da vida, que tem de ser bem aproveitada para a reforma íntima que objetivamos.

Ora, essa Vida que nos foi dada por Deus, jamais nos será tirada. A partir do instante, do qual não mantemos a mais pequena memória, mas que ficou nos confins dos tempos, é eterna e ininterrupta. Vai-se desenrolando cá e lá; cá, no plano físico, material, terrestre ou outro; lá, no plano espiritual, seja em colônias, hospitais espirituais, umbral, ou outra situação, sem o corpo físico, mas sempre em companhia do corpo espiritual (perispírito) e da consciência que nunca nos abandona e serve de nível aos nossos atos e pensamentos. Não há interrupções, nem intervalos entre duas vidas, porque, simplesmente, Vida só temos uma, imortal e eterna. O que temos são esses vários cenários em que ela se desenrola, e a que chamamos existências. Há perfeita articulação entre elas, porque somos um e apenas um, sempre, com todo o peso do que acumulamos, quer de bem quer de mal.

É devido a esse fato inalienável que afirmamos que a dor do suicida deve ser uma das maiores dores (se não mesmo a maior) de quantos povoam as zonas de sofrimento, nos planos extrafísicos. Imaginemos a frustração daqueles que, pensando fugir dos problemas e aflições, através da morte, chegam do outro lado e se veem tão vivos ou mais do que estavam quando na Terra. Imaginem o medo e a confusão, ao permanecer diante dos seus olhos a forma como optaram terminar a vida, sem conseguir, com todo o instrumental de que se serviram para o fazer, e com as mesmas sensações dos instantes que pensavam ser os últimos, mas que perduram, em geral, por muito tempo, meses, anos, fazendo-os crer serem tais penas eternas. Por que falam alguns Espíritos de dores eternas? Simplesmente porque se veem em sofrimento há tanto tempo, a juntar à falta de Fé e Conhecimento, ao ponto de acreditarem mesmo serem dores irremissíveis. Imaginemos ainda os que sentem, ouvem mesmo, o choro dos que por cá deixaram, as lamentações, por vezes até as acusações de abandono (já que na ânsia de fugir dos problemas pessoais, muitas vezes deixam os familiares a braços com a resolução do que não se sentiram aptos a enfrentar). O sentimento de culpa, o arrependimento, a certeza de que não valeu a pena porque, na realidade, não há como pôr fim ao que é infindável, são, como facilmente se deduz, um forte acréscimo de dor às que procuraram, inutilmente, suprimir.

Será ainda importante acrescentar que, qualquer problema que tenhamos numa dada existência, se não for prova superada, terá de ser repetida noutra existência, geralmente em circunstâncias agravadas. Por quê? Sendo o corpo espiritual, ou perispírito, como o apelidou Allan Kardec, o duplo do corpo físico, o revestimento natural do Espírito, intermediário entre ele e o corpo material/terreno, todos os danos que a este último causarmos, são impressos no primeiro, e acompanham-nos quando do regresso à vida física. Através dele, perispírito, renascemos em condições que, muitas das vezes, não entendemos, por não se situar a sua causa nos erros que lembramos. Perdem-se, nesse caso, com as impressões que transportamos de outras existências e que ainda não logramos ultrapassar. Só através de uma nova experiência física temos condições de empreender a reforma de nós mesmos e expurgar os agravos que nos impedem uma saúde física, mental, psicológica, em suma espiritual, que podemos considerar ser a soma e combinação de todas as outras, e que se traduz pelo bem-estar, paz interior e equilíbrio que resultam da consciência livre e consonante com as Leis Divinas.

É muito importante que saibamos reagir, face às inúmeras dificuldades e entraves que vamos encontrando no caminho. Ao reencarnar, sabíamos que não nos iríamos deparar com facilidades. Ninguém reencarna como prêmio de bom comportamento, antes pelo contrário, só reencarnamos porque somos imperfeitos e porque necessitamos dessa escola abençoada e desse hospital de almas que é a Terra. Só pelo simples fato de estarmos num mundo físico, e na Terra especialmente, como mundo de provas e expiações que é, temos de esperar um justo número de pedras e obstáculos naturais que devemos superar. Mas temos de encarar a vida terrena como uma bênção que a misericórdia do Pai nos concede e da qual não nos podemos fazer desmerecedores, abandonando as provas que nos reerguerão a mundos mais felizes.

Não estamos em condições de julgar ninguém. Devemos abstermo-nos de o fazer. Não sabemos o que ia na alma de cada um que, porventura, tenha tomado resolução tão infeliz. Sabemos, isso sim, que a dor, o arrependimento, a confusão, a necessidade de compreensão e amparo são, com toda a certeza, enormes. São irmãos carenciados de tudo. Careceram de fé, de esperança, de coragem. Careceram, talvez, de uma palavra amiga, um esclarecimento, que os fizesse sentir que não estavam sós na sua dor. Careceram de apoio psicológico, médico, religioso, que os tenha fortalecido e ajudado a seguir em frente, até ao momento em que a dura prova fosse superada e a hora da libertação deste mundo fosse chegada. Careceram da certeza na vida futura, espiritual, da crença absoluta na continuidade da vida, que os teria impedido de tentar cortar-lhe o fio.

São muitos e variados os motivos que podem levar ao suicídio: depressões, dificuldades financeiras, doenças do foro psíquico, desânimo da vida, solidão, desgostos diversos, muitas vezes até, obsessão espiritual de entidades sofredoras ou vingativas com quem sintonizamos e que, a certa altura, passam a dominar-nos. As razões íntimas sabe-as quem sofre. E Deus que nos conhece melhor do que nós mesmos. Só a Ele cabe julgar e adequar os frutos à sementeira. Mas Deus jamais dá uma prova maior do que a nossa capacidade de superação. Ao ter-nos sido permitido planear um determinado padrão de vida, com as consequentes dificuldades que daí adviriam, havia grandes esperanças na nossa força e empenho, da parte dos amigos espirituais que colaboraram nesse empreendimento. Dispuseram-se a, ao longo da nossa existência, estar ao nosso lado, amparar-nos, intuir-nos ao bem, reforçarem em nós a vontade de nunca desistir. No entanto, por mais firmes que tenham sido as nossas resoluções, em contato com a matéria, recomeça a tendência em buscar facilidades, não nos preparamos suficientemente para uma vontade firme, não buscamos a Fé esclarecida que nos poderia servir de couraça e, na hora em que os maiores embates surgem, sentimo-nos fracos e impreparados.

No momento atual da evolução terrena, temos vindo a assistir a um acréscimo de dificuldades de todo o tipo. É fácil de ver que o nosso mundo está a atravessar um momento crucial e que nos estão sendo dadas oportunidades cruciais, talvez as últimas neste estádio evolutivo, de libertação dos erros e imperfeições mais graves e que serão entrave à nossa permanência por aqui, quando a Terra evoluir para mundo de regeneração. É hora de mostrarmos a nós mesmos o que valemos e para onde queremos conduzir os nossos próximos passos. Evidentemente, isso é fator de acréscimo de dores, dificuldades, obstáculos, revoluções naturais e não só, que farão a Terra crescer e nos darão oportunidade de crescer com ela. Infelizmente, temos assistido, mais do que nunca, ao crescimento dos casos de suicídio. A humanidade não se preparou convenientemente. Pensou apenas no bem-estar material, no consumo, no prazer, no prolongamento da vida física, sem a necessária preparação espiritual. As facilidades trazidas pelas conquistas da ciência e da tecnologia não foram devidamente aproveitadas, não serviram, como deveriam, para fazer-nos sentir a grandeza do Pai que a tudo provê. Pelo contrário, criaram ateus e seres solitários sem Deus nem crença espiritual. Tornamo-nos fracos e desprotegidos.

Mas de nada serve ficarmos apenas pela lamentação dos erros. É urgente uma mudança geral de atitude. Aos espíritas, dada uma maior compreensão da vida e das verdadeiras razões que trazemos ao ingressar na matéria, deve caber o papel de, como trabalhadores da última hora, não esconder a luz debaixo do alqueire, ou seja, ser fonte de iluminação das almas que consigo cruzem os caminhos da vida. Às vezes uma palavra de esclarecimento ou um ouvido que sabe escutar os desabafos de dor do outro, pode salvar uma vida. E a Prece. Nunca esqueçamos o recurso valioso que é a Prece, quer pelos suicidas, quer por aqueles que imersos em profundas dores, se poderão sentir compelidos ao abandono de si mesmos, se não tiverem quem os auxilie.

Deus não criou penas eternas, é infinito na Sua misericórdia e permite, mais do que nos apercebemos, que o intercâmbio entre nós e os que partiram se faça e lhes sirva de alívio no meio do sofrimento. A prece é a melhor maneira de os lembrarmos e lhes levarmos o socorro que desejaríamos receber se estivéssemos em circunstâncias semelhantes.

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita