O espírita e Leymarie
Existem provas inequívocas no movimento espírita
de que o espírita anda apressado em suas
críticas a terceiros. Aliás, tais críticas nem
deveriam existir para um espírita, no entanto, a
força de velhos hábitos parece ser superior à
proposta de mudança desses hábitos.
Não é a primeira vez que o movimento espírita
interpreta estudos sérios, bem fundamentados,
científicos e a partir daí faz inferências
quanto à moral das pessoas.
Pintaram a “caveira” de Pierre-Gaëtan Leymarie
no movimento espírita como se fosse o próprio
“judas”. Quem, em sã consciência, se encontra em
condições de atirar um “grão de areia” sequer,
em direção a Leymarie, apontando-lhe as
possíveis fragilidades? Se essa atitude – que
equivale ao “olho por olho; dente por dente” –
fosse uma prática verdadeiramente cristã,
estaríamos quase todos em maus lençóis.
Observamos pessoas que praticaram o “beijão-mão”1 na
Federação Espírita Brasileira durante muito
tempo, criticando duramente o (des)serviço de
Leymarie. A própria federação sempre foi um poço
de incoerências com o seu secular
roustainguismo, mandos e desmandos.
No passado, grandes polemistas brasileiros, como
Carlos Imbassahy, jamais escreveram uma linha
para criticar o “opositor”. Tanto que Carlos
Imbassahy discutiu profundamente sobre o
Espiritismo e as críticas formuladas pelos
detratores, sobretudo com o Padre Álvaro
Negromonte, sem nenhuma acusação pessoal, nem
muito menos alusões de que estivesse o Padre
movido por “obsessores”.
O movimento espírita perdeu a inteligência e o
charme das discussões em torno da doutrina e
passou a adotar críticas pessoais agressivas,
destemperadas e inconsequentes.
De fato, comentar e conversar com um amigo mais
estreito sobre as incongruências do movimento
espírita não só é válido, quanto é necessário,
até para que um auxilie o outro a não cair nas
esparrelas proporcionadas pelos problemas de
relacionamento existentes no movimento espírita.
Sim, os espíritas também têm problemas de
relacionamento!
Evidentemente que, ao expor essas fragilidades,
não nos colocamos na condição de quem não as
praticou e de quem é isento. De forma alguma.
Talvez hoje, um pouco amadurecido e decepcionado
pelas relações no movimento espírita, consiga
falar o que incomoda muitas pessoas. Com isso,
não estamos dizendo que Leymarie não tenha feito
nada errado. Existem indícios de que talvez
pudesse ter conduzido um processo de atualização
doutrinária. Mas não há indícios, e mesmo que
houvesse, para se falar sobre a moral de
Leymarie como se as pessoas que o criticam na
moral, fossem diferentes dele ou de qualquer um
de nós.
Dessa forma, instituições seculares aproveitam
tais sandices do movimento espírita para colocar
as “manguinhas de fora”, na tentativa de
obnubilar erros do passado que comprometeram
profundamente a divulgação doutrinária.
Mas então, qual a diferença entre não falar mal
de um espírita e criticar uma instituição? A
crítica a uma instituição não é a crítica à
moral dos seus profitentes. Os erros de
divulgação de uma instituição refletem o nível
de conhecimento e concordância com a linha
estratégica adotada para divulgar a doutrina
espírita. O que cada um fez ou faz de esforço
para mudar isso, ou para insuflar os problemas
vivenciados pelo movimento espírita, é de foro
íntimo, e nem deveria ser questionado.
Por isso, entendemos que há muita gente ocupada
em explicar “fatos históricos” (entre aspas
porque nem sempre são fatos), e pouca gente
preocupada em esclarecer a respeito do
Espiritismo, ainda mais em tempos tão bicudos
como os atuais.
Fora a reedição da religião formal que fracassou
moralmente com a humanidade em sua tentativa de
hegemonia, o que o movimento espírita tem feito
de diferente que justifique ser o Espiritismo o
recurso que projetará Luz em nossa jornada rumo
ao Cristo?
Enquanto isso, acho que seria de bom tom mudarem
o discurso quanto aos erros cometidos por
aqueles que de alguma forma tentaram fazer algo,
além do policiamento doutrinário. Mas este texto
não seria também um policiamento doutrinário?
Doutrinário não porque não se discute doutrina.
Policiamento no sentido de vigilância, de fazer
patrulha absolutamente. O que fazemos é um
protesto educado quanto a práticas que são
desnecessárias, nos posicionando, mesmo que isso
não agrade. “Morno” não somos.
1 Beija-mão:
tradição de reverência a personalidades
eminentes, praticada em várias culturas desde
tempos remotos. Na cultura lusófona suas origens
são medievais, sendo um costume da monarquia
portuguesa em Portugal depois herdado pela corte
imperial brasileira. (...) Fonte: Wikipedia