Há 160 anos a
Inquisição
tentou conter a
marcha do
Espiritismo
No século XIX, o periódico parisiense Le Siècle – O
Século -, um jornal intitulado político,
literário e de economia social, na sua Seção
Política, assim registrou, na edição de
segunda-feira, 14 de outubro de 1861, fato insólito
acontecido em uma praça da cidade de Barcelona,
alguns dias atrás:1
[…]
A Igreja da Espanha iniciou uma grande cruzada
contra os espíritos; o tempo não está bom para eles
na Península: espíritos batedores, espíritos
girantes, simples espíritos, estão sendo caçados
como merecem. Enquanto se esperava que ela os
apreendesse fisicamente, o que parece bastante
difícil, a inquisição fez com que os jornais, livros
e revistas espíritas ou espiritistas que circulavam
na Espanha fossem apreendidos e queimados.
No dia 9 de outubro de 1861, às dez e meia da manhã,
na esplanada da cidade, no local onde são executados
os criminosos condenados à morte pelo torniquete,
foram queimados, por ordem do Bispo de Barcelona,
trezentos volumes ou brochuras apreendidas na casa
de um livreiro mais ou menos infestado de
espiritismo.
O auto-de-fé era presidido por um sacerdote vestido
com vestes sacerdotais, carregando a cruz numa das
mãos e a tocha na outra. Um notário e seu escrivão,
responsáveispela redação do processo verbal; um
alto funcionário da alfândega ficou ao lado do
padre, enquanto três moços mantinham a fogueira
acesa.
Quando os trezentos volumes foram consumidos, o
sacerdote e seus acólitos retiraram-se em meio aos
gritos da inumerável multidão que cobria a praça, e,
enquanto o povo clamava com todas as suas forças: Abaixo
a inquisição! o livreiro apreendido conseguiu
aproximar-se da fogueira e recolheu alguns
fragmentos das cinzas deste burlesco auto-de-fé.
Isso é tudo que lhe restou de seus trezentos
volumes.
Há muitos livros queimados; agora é sobre aqueles
que os leram; como a inquisição lidará com eles? Sem
dúvida não os queimaremos: os tempos, Ah...! não o
permitem mais; mas cuidado com a reparação
honorável!2 Em qualquer caso, neste
momento, não somos nós que nos divertiremos fazendo
as mesas girarem na Espanha.
[…]
Considerando mais este infame ato, se denota como a
História está repleta de episódios praticados por
Espíritos retrógrados visando interromper a marcha
evolutiva do planeta.
Neste caso em exame, a Igreja Católica Apostólica
Romana, tentou sem sucesso, mais uma vez, através de
uma prática – a Inquisição -, que, certamente, impôs
pesadas expiações aos seus atores, atrapalhar os
anseios do povo em se libertar das condutas
medievais, que vigoraram durante o milênio em que a
Terra esteve mergulhada nos abismos da superstição,
da ignorância e mesmo da crueldade, e que ainda
insistiam em se fazer presentes no século XIX,
tentando manter pela força e o terror, suas
estruturas caducas e desgastadas por tantas
iniquidades perpetradas.
Em parte, a Idade Média se estabeleceu devido ao
afastamento gradual da vivência na essência dos
ensinos Crísticos, quando interesses materiais e a
ânsia pelo domínio territorial, instigaram o egoísmo
de desorientados religiosos a trabalhar espontânea e
alegremente em nome das forças das trevas, em lugar
de aplicar o amai-vos uns aos outros às suas
próprias vidas e a dos seus partidários, máxima tão
bem divulgada e, principalmente, exemplificada pelo
Meigo Rabi da Galileia.
Este período é considerado como a Idade das Trevas
e, uma das práticas de controle da “fé” adotadas
pela religião dominante no mundo ocidental, era a
morte ou o suplício de todos que não comungassem com
os seus deturpados interesses, pois este seguimento
religioso representado pela Igreja Católica
Apostólica Romana, fez de tudo para destruir os
ensinos de Jesus, culminando com a indecorosa venda
das indulgências, uma das causas motivadoras do
nascimento da Reforma.
Não há dúvida, enfrentamos tempos tenebrosos e, o
Espiritismo, nascido em 18 de abril de 1857, embora
já distante da nociva influência das práticas
medievais, não escapou dos ataques de religiosos
atormentados para, mais uma vez, tentar frear o
progresso moral da Terra.
Como se denota na descrição do periódico O Século,
o povo, cansado de tantas iniquidades perpetradas
pela Igreja, mas ainda impotente para dar um basta a
tanta ignominia, fez o que estava ao seu alcance, e,
espontaneamente, vaiou o ato inquisitório, pedindo o
fim da famigerada Inquisição, o tribunal
eclesiástico instituído pela Igreja católica no
começo do século XIII visando investigar e julgar
sumariamente supostos hereges e feiticeiros, e, os
médiuns estavam incluídos neste rol de infortunados,
acusados de crimes variados contra a chamada crença
católica.
É interessante destacar como a espiritualidade
superior age com sabedoria. Os esclarecidos
Espíritos poderiam ter impedido mais este ato
tresloucado de fanáticos religiosos compromissados
com o mal, contudo, nada fizeram, se limitaram a
assistir, pois sabiam que a queima das 300 obras
espíritas em praça pública provocaria o efeito
contrário ao esperado e, ardentemente desejado
pela Igreja. O ser humano é curioso, é da sua
natureza, e, diante de demonstração tão extemporânea
como aquela, mais uma tentativa vã de proibir o
acesso a um tipo específico de literatura pela força
e não pela dissuasão e o raciocínio, acabou
provocando o interesse geral, e, em consequência,
houve uma procura mais acentuada por obras
espíritas. Fez-se presente o conhecido ditado
popular: deram um tiro no pé, aliás, 300
tiros!
Há uma curiosidade interessante no artigo do
periódico no que tange a nomenclatura dos adeptos da
Doutrina dos Espíritos. O autor do texto demonstrou
conhecer a opção dos seguidores de Allan Kardec se
dizerem espíritas ou espiritistas,3 possibilidade
que nem todos conhecem, entretanto, vale destacar
que o Codificador ainda sugeriu outra palavra, esta
então conhecida por pouquíssimos, para designar os
partidários do Espiritismo: espiritain,4 que
significa espiritano.
Poderíamos aproveitar este inesquecível ato e
tecer alguns comentários, fazendo um paralelo entre
o ocorrido há 160 anos, e a verdadeira enxurrada de
obras, surgindo aqui e ali, insistindo em se dizer
espíritas, contudo, jamais o serão.
No passado, como sabemos, a Igreja se sentindo
ameaçada pela novel Doutrina dos Imortais, ajuizou
que, acendendo o fogo do destempero, destruindo
algumas centenas de livros versando sobre o
Espiritismo, poderia infligir sérios danos à
caminhada, nas plagas europeias, da nova Filosofia
Espiritualista, recém-nascida na França, o coração
da Europa.
Há bom tempo, o movimento espírita brasileiro vem
sendo atacado, fustigado, invadido frontalmente por
obras pseudoespíritas, ou mesmo, totalmente
dissociadas dos postulados espíritas. São duas
grandes correntes de mistificadores e perturbados
médiuns que se associam para produzir uma literatura
apócrifa, contudo, têm sido empregadas largamente
pelos espiritistas, provocando disputas doutrinárias
intermináveis e “ensinando” aos novatos conceitos
errôneos sobre o Espiritismo.
A nossa atitude jamais será queimar tais obras, e,
podemos acrescentar que, se fossemos agir como os
celerados de então, a fogueira alcançaria as
alturas, não, esta nunca será a conduta espírita. A
melhor postura espírita para manter a Doutrina sem
possíveis indesejadas interferências, é estudar as
obras de Allan Kardec, não só as cinco obras
fundamentais, mas todo o conjunto de livros escritos
pelo mestre de Lyon.
Além disso, buscar informações sabidamente
irretocáveis sob o ponto de vista doutrinário, as
ditas obras complementares, tais como: todo o
conjunto de livros psicografados por Francisco
Cândido Xavier, igualmente pela obra de Divaldo
Pereira Franco, ou mesmo de Raul Teixeira. Lembramos
também da literatura produzida pelas médiuns Ivone
do Amaral Pereira e Zilda Gama. Isto só para citar
cinco médiuns.
As obras de Allan Kardec, somadas as destes cinco
médiuns, já somam várias centenas de livros,
oferecendo material para se estudar até o final
desta existência.
Entretanto, há outros autores médiuns ou não que
também escreveram obras irretocáveis: Waldo Vieira
quando esteve militando nas fileiras espíritas, José
Herculano Pires, Cairbar Schutel, Abel Glaser,
Carlos Imbassahy, Hermínio Miranda, Terezinha
Oliveira, Wallace Leal Rodrigues, José Jorge,
Rodolfo Calligaris, Bezerra de Menezes, Alírio
Cerqueira Leite, Vinícius.
Não esquecer os autores clássicos, tais como: Léon
Denis, Gabriel Delanne, Camille Flammarion,
Alexander Aksakof, Ernesto Bozzano, Paul Gibier e
William Crookes.
E, não são todos, há incontáveis nobres e sérios
escritores que dignificam e engrandecem todo o
esforço coordenado pelo Protetor da Terra - Jesus o
Cristo -, em trazer à Humanidade o Consolador
Prometido.
Mas, para facilitar o sincero aprendiz, sugerimos
também consultar este portal O Consolador e o
e-book: Livros que, propositadamente ou não,
denigrem o Espiritismo.5 Neste
trabalho, de autoria do criterioso José Passini,
cita-se uma série de autores, com suas respectivas
obras ditas espíritas, livros estes indignos de
compor qualquer biblioteca, livraria ou feira
espíritas.
Como se denota, não há necessidade de preparar
fogueiras para impedir que as doutrinas apócrifas
atentem contra a Doutrina, basta que os espiritanos não
comprem e não divulguem os autores sabidamente
desvirtuados da excelente Doutrina dos Imortais.
Honremos a memória de Allan Kardec, não queimando
seus ensinos nas fogueiras da vaidade, orgulho e
destempero. A chama da intemperança não deverá
continuar acesa em nossas vidas, pois, por nós acesa
no passado, já arde há bom tempo em nosso íntimo, em
todas as nossas anteriores existências distanciadas
do amor puro do Criador. Contudo, já é hora de
zelarmos por manter a flama doutrinária imaculada,
como tantos outros já o fizeram no passado, alguns,
à custa de suas próprias vidas. Desta forma,
façamos, hoje, este serviço em favor, e pela
libertadora, consoladora e inigualável Doutrina dos
Espíritos.
Seja a nossa Cruzada diversa daquela ocorrida há
tempos longínquos, pois o Rabi da Galileia aguarda
há milênios, pacientemente, que os nossos atos e
palavras carreguem apenas o fogo da verdade e do
amor.
Referências:
1 Acesso
em 19/09/2021: Link-1
2 Acesso
em 19/09/2021: Link-2
Reparação honorável é, na França, e
sob o Ancien Régime – Regime antigo,
nos termos da lei, uma penalidade infame, mais grave
do que a reprimenda, mas menos do que a exposição
pública, o chicote, a mutilação, as galés, o
banimento.
3 KARDEC,
Allan. Instruções práticas sobre as manifestações
espíritas. Tradução Wallace Leal V. Rodrigues.
5ª ed. Editora: O Clarim, 1978. Vocabulário
espírita.
4 _________. O
Livro dos Espíritos. 1ª edição de 18 de abril de
1857 com 501 perguntas. Introdução.
5 Acesso
em 19/09/2021: Link-3