Ainda no ano de 1993 os motivos do sumiço repentino de
Chico Xavier de Pedro Leopoldo esquentavam as conversas
entre um café e outro. Alguns acusavam o padre Sinfrônio.
Muitos jogavam a culpa na família dele, "exploradora
demais". Outros se lembravam do escândalo provocado por
Amauri Pena. Alguns se culpavam. Podiam ter tratado o
conterrâneo melhor, com mais respeito. O santo da casa
não fez milagre...
A razão alegada pelo próprio Chico Xavier nem era levada em
consideração. Chico Xavier jogou a culpa pela mudança em uma
labirintite, iniciada naquele ano. Incomodado por barulhos no
ouvido e por fortes dores de cabeça, ele teria seguido conselho
dos médicos e dos benfeitores espirituais para procurar um clima
temperado. Pedro Leopoldo era fria demais. Chico foi mesmo em
busca de um clima menos frio, mas não no sentido meteorológico
da expressão. Aos amigos mais íntimos, ele daria uma outra
explicação. Uberaba, então com dezessete centros kardecistas,
estaria mais protegida espiritualmente.
Deitada em sua cama, paralítica, Nair Tarabau Pinto, colega de
escola de Chico Xavier, deixaria nas páginas de um caderno puído
uma declaração de amor ao ex-companheiro: "Chico, você é o amigo
de infância que não posso esquecer por mais que a vida dure. Às
vezes, pergunto a mim mesma: quem é este homem? Um gênio, um
predestinado? Ou um precursor?" Chico já estava longe. A nova
atração de Uberaba, Chico Xavier, se refugiou no meio do mato a
oito quilômetros do centro de Uberaba. Sua casa, que dividia com
Waldo Vieira, era um barraco. Quarto, sala, cozinha, banheiro,
chão de cimento, paredes sem pintura. Nenhum ônibus passava por
ali. Quem quisesse chegar até o porta-voz dos mortos no Brasil
precisava atravessar o matagal, driblar bois e vacas, pular
cercas de arame farpado. Sem telefone, com os parentes a
seiscentos quilômetros de distância, livre de Rômulo Joviano e
do padre Sinfrônio, às vésperas da aposentadoria, Chico
experimentava a privacidade e tomava fôlego para recomeçar.
Precisava chegar ao centésimo livro. Agora, pelo menos, já tinha
um parceiro.
No dia seguinte à sua chegada, ele abriu a porta aos primeiros
visitantes. Sete amigos participaram da primeira sessão espírita
comandada por Chico Xavier no novo endereço. Na noite de 5 de
janeiro de 1959, todos se sentaram em volta da mesa, na cozinha.
Os bancos eram tábuas equilibradas sobre pilhas de tijolos.
Do livro As vidas de Chico Xavier, de Marcel Souto Maior.
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