No Corinthian Hall, a primeira
manifestação pública das heroínas de Hydesville
Num dia como hoje (14 de novembro), no ano de 1849, as
irmãs Fox, cuja história está diretamente ligada ao
advento do Espiritismo moderno, foram submetidas ao
primeiro teste público, um ano e meio depois dos famosos
fenômenos ocorridos em sua casa, no vilarejo de
Hydesville. O teste ocorreu em Rochester, no Corinthian
Hall, que era então o maior auditório disponível na
cidade.
Para o leitor não familiarizado com a história das irmãs
Fox, lembremos que foi em Hydesville, localidade pequena
e muito simples situada a 32 km de Rochester (Estados
Unidos), que tudo começou.
Vivia ali uma família de fazendeiros metodistas
constituída então de quatro membros: o pai John Fox, a
mãe Margareth e as filhas menores, Margareth, de 14
anos, e Kate, de 11 anos. Os outros filhos do casal
moravam em outras cidades. Ali, a família residia desde
11 de dezembro de 1847, numa casa típica da região,
feita de madeira, com dois pisos ligados por uma escada
e contendo, nos fundos, uma adega.
Os fenômenos de Hydesville
Em janeiro de 1848 a família Fox notou o surgimento de
ocorrências estranhas – os primeiros raps – que
consistiam de ruídos de arranhadura, às vezes simples
batidas, outras como um arrastar de móveis, sons ora
ouvidos no teto, ora no soalho, ora nas paredes.
Os raps se tornaram habituais naquele lar e
foram-se intensificando de tal modo que, ao chegar o dia
31 de março, a família já não conseguia suportá-los,
visto que em algumas noites as próprias camas das
meninas eram postas a tremer e elas acabavam indo dormir
com os pais.
Numa sexta – 31 de março de 1848 – a família recolheu-se
mais cedo e ainda não eram 7 horas da noite quando os
barulhos começaram.
Kate, a mais jovem, resolveu então,
entre nervosa e medrosa, dizer ao agente invisível que
produzia tanto incômodo: “Senhor Pé Rachado, faça o que
eu faço” e bateu palmas. Imediatamente seguiu-se o som
da resposta, com o mesmo número de pancadas. Quando Kate
parou, o som parou. Margareth pediu então, brincando:
“Agora faça exatamente como eu. Conte um, dois, três,
quatro” e batia palmas enquanto falava. Os ruídos se
produziram como antes, repetindo suas palmadas. A jovem
teve, porém, medo de prosseguir o ensaio; foi quando
Kate disse, na sua simplicidade infantil: “Oh! mamãe, eu
já sei o que é. Amanhã é primeiro de abril e alguém quer
nos pregar uma mentira”.
A mãe, curiosa com o rumo dos acontecimentos, resolveu
então fazer um teste.
“Pedi - disse ela - que fossem indicadas as idades de
meus filhos, sucessivamente. Instantaneamente foi dada a
exata idade de cada um, fazendo uma pausa de um para o
outro, a fim de os separar, até o sétimo, depois do que
se fez uma pausa maior e três batidas mais fortes foram
dadas, correspondendo à idade do menor, que havia
morrido. Então perguntei: - É um ser humano que me
responde tão corretamente? Não houve resposta.
Perguntei: - É um espírito? Se for, dê duas batidas.
Duas batidas foram ouvidas assim que fiz o pedido. Então
eu disse: - Se foi um espírito assassinado, dê duas
batidas. Estas foram dadas instantaneamente, produzindo
um tremor na casa. Perguntei: - Foi assassinado nesta
casa? A resposta foi como a precedente.”
A partir daí, como já foi relatado nesta revista - clique
aqui – o fenômeno se espalhou pelos Estados Unidos
e, em seguida, por outros países, o que acabou
resultando anos depois no advento da doutrina espírita,
cujo marco inicial foi a publicação em 18 de abril de
1857 da primeira edição d´O Livro dos Espíritos,
de Allan Kardec.
O porquê das manifestações no Corinthian Hall
Em novembro de 1849 as irmãs Fox já eram conhecidas, mas
os fenômenos despertavam sentimentos antagônicos,
havendo quem os aceitasse e um número maior de pessoas
que os rejeitavam. Assim nasceu a ideia do teste a que
as irmãs foras submetidas.
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No seu livro The History of Spiritualism,
traduzido para o nosso idioma por Julio Abreu
Filho com o título “História do Espiritismo”,
Arthur Conan |
Doyle relata os pormenores do caso, e é com base
no que ele registrou que apresentamos o relato
abaixo. |
Em uma das primeiras comunicações vindas do plano
espiritual por intermédio das irmãs Fox foi dito que “as
comunicações não se limitariam a elas; espalhar-se-iam
pelo mundo”. Em breve essa profecia se confirmou, visto
que os fenômenos espíritas, em pouco tempo, ocorreram em
muitos outros centros independentes da família Fox,
tanto no Norte quanto no Leste dos Estados Unidos.
As mensagens espíritas insistiam para que o pequeno
grupo de pioneiros fizesse uma demonstração pública de
seus poderes em uma reunião em Rochester, uma ideia que,
obviamente, encheu de espanto as duas desconfiadas
meninas e seus amigos. “Tão irritados ficaram os Guias
desencarnados pela oposição de seus agentes terrenos,
que ameaçaram suspender completamente o movimento
durante uma geração e o interromperam por algumas
semanas”, assim escreveu Conan Doyle.
Ao cabo de pouco tempo as comunicações foram
restabelecidas e os crentes, castigados durante aquele
intervalo, prometeram tudo fazer em benefício da causa,
o que não era nada fácil. Uma parte do clero,
notadamente o reverendo metodista A. Jervis, pôs-se ao
seu lado; mas na sua maioria os líderes religiosos
trovejaram do púlpito contra aqueles e a massa
prontamente os apoiou na tarefa covarde de atacar os
chamados heréticos.
No dia 14 de novembro, o primeiro teste
A 14 de novembro de 1849 realizou-se então a primeira
reunião, tendo por local o Corinthian Hall, em
Rochester.
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A assistência – informa Conan Doyle (foto)
– ouviu
com atenção a exposição feita por Mr.
|
Capron, de Auburn, o orador principal.
Foi então escolhida uma comissão de
cinco cidadãos representativos para examinar o assunto e
fazer um relatório na noite seguinte, em nova reunião da assembleia. Tão certos estavam de que esse relatório
seria desfavorável, que o Rochester Democrat, ao
que se verificou, já havia preparado seu artigo de
fundo, com o título: “Exposição Completa da Mistificação
das Batidas”. |
O resultado, porém, obrigou o editor a sustá-lo,
porquanto a comissão relatou que as batidas eram
indubitavelmente verdadeiras, embora as respostas dadas
às perguntas “nem fossem todas certas, nem todas
erradas”. E acrescentou que as batidas se produziam nas
paredes, nas portas, a alguma distância das meninas,
produzindo uma sensível vibração, não sendo encontrado
nenhum processo pelo qual elas pudessem ser produzidas.
O segundo teste público
O relatório foi recebido pela assistência com sinais de
desagrado; então, em consequência disso, formou-se uma
segunda comissão composta exatamente pelos descontentes.
As investigações foram feitas no escritório de um
advogado. Por qualquer motivo Kate estava ausente e só
contaram com Leah e Margareth. Nem por isso os ruídos
deixaram de se manifestar como antes, apesar de estar
presente o doutor Langworthy, com o objetivo de
controlar a possibilidade de ventriloquia. Conforme dito
no relatório final, os sons tinham sido ouvidos e uma
investigação completa tinha mostrado que nem eram
produzidos por máquina nem pela ventriloquia, embora
não tivesse sido possível determinar qual agente os
teria produzido.
O terceiro e derradeiro teste
A assistência, insatisfeita com essas conclusões,
devolveu o relatório à comissão e escolheu uma nova,
constituída pelos mais extremamente oponentes, um dos
quais jurou que se não descobrisse qualquer truque ia
atirar-se nas cataratas do Genesee. A inspeção realizada
pela comissão foi minuciosa e contou com a participação
de um grupo de senhoras que despiram as meninas,
submetendo-as a investigações aflitivas e até mesmo
brutal. Seus vestidos foram amarrados apertados nos
corpos e elas colocadas sobre vidros e outros isolantes.
Findo o teste, a comissão viu-se obrigada a relatar que
todos haviam ouvido distintamente as batidas, tanto nas
paredes quanto no soalho, e as perguntas propostas às
médiuns, algumas formuladas mentalmente, tinham sido
respondidas corretamente.
A reação do público
Diz Conan Doyle que o público, enquanto olhava o
movimento como uma espécie de jogo, estava preparado
para algo apenas divertido. Quando, porém, os três
relatórios mostraram que se tratava de uma questão muito
mais séria, uma onda de indignação varreu a cidade,
chegando a tal ponto que Mr. Wiletts, um valoroso quaker,
antes que se realizasse uma quarta assembleia pública,
foi obrigado a declarar que “a corja de bandidos que
pretendiam linchar as moças poderia fazê-lo, mas depois
de passar sobre o seu cadáver”. Houve então um grande
tumulto e as meninas tiveram de ser salvas pelas portas
do fundo.
Concluindo, escreveu
Conan Doyle: “Muitos aceitaram as conclusões das
sucessivas comissões como boas e, na verdade, é difícil
ver como os fatos apontados poderiam ter sido mais
severamente verificados. Ao mesmo tempo, esse vinho
novo, forte e fermentado começou a se derramar dos
velhos odres onde havia sido posto, para escusável
desgosto do público”.