Um
programa
de
educação
Entre os documentos históricos do movimento espírita
brasileiro, existem aqueles que merecem nossa atenção,
nosso estudo, por serem não apenas importantes, mas por
trazerem conteúdo relevante e atual. É o caso, por
exemplo, da tese O Espiritismo é Obra de Educação,
de Leopoldo Machado, apresentada no ano de 1939, durante
a realização do 1º Congresso de Jornalistas Espíritas,
de 15 a 24 de novembro, na cidade do Rio de Janeiro.
Dessa tese já fizemos abordagem em outro texto, mas,
naquela ocasião, deixando para futura oportunidade o
estudo de seus três últimos itens, que agora vamos
destacar. Remetemos o leitor para esse outro texto,
introdutório, publicado pela revista O Consolador, para
mais dilatada compreensão sobre a tese e, igualmente,
seu autor.
Vejamos, portanto, com mais detalhes, os últimos itens
da tese defendida por Leopoldo Machado há mais de
oitenta anos.
Esboço de um programa de educação
Tendo a preocupação de não ficar apenas no plano
teórico, o autor apresenta no item 19 um programa
prático a ser desenvolvido pelas instituições espíritas,
afirmando:
“A Doutrina Espírita, como obra de educação, exige,
além de programas, escolas e mestres diferentes”.
Devemos concordar com a afirmativa, pois o Espiritismo,
ou Doutrina Espírita, trazendo a ideia de Deus como Pai
e Criador, a imortalidade da alma com a vida futura, a
reencarnação, a comunicabilidade entre as dimensões da
vida e a lei de evolução, nos remete a uma nova visão
sobre o ser e a vida, assim, programas, escolas e
mestres devem compreender e apreender o alcance e
profundidade desses princípios, requerendo posturas e
práticas diferenciadas.
Leopoldo Machado divide o programa em: Aulas de Moral;
Aulas de Civismo; Evangelho para as Crianças; Processo
das Aulas; Estímulos dos Alunos; O Decálogo do Bom
Aluno; União da Mocidade Espírita e A Maior Dificuldade.
Sobre as Aulas de Moral, destacamos de seu texto:
“As aulas de moral devem ocupar lugar de relevo à
margem das de instrução, esforçando-se o professor na
demonstração prática, através de fatos e exemplos”.
Sobre as Aulas de Civismo, destaca:
“As aulas de civismo devem ser também diferentes.
Devem demonstrar às crianças que devemos amar e servir à
Pátria, porque não foi sem motivos fortes que Deus
consentiu renascêssemos nela, mas sem ódios,
hostilidades e rebaixamentos das pátrias alheias: amar a
Pátria como se ama e se gosta da casa em que se mora”.
Sobre o Evangelho para Crianças, discorre:
“Nos centros espíritas que mantenham ou não escolas
primárias, mas que consagrem no estudo da Doutrina o
primeiro lugar – que outra coisa não devem fazer centros
bem organizados –, deve existir, uma vez por semana,
aula de Evangelho para as crianças”.
Como se vê, Leopoldo Machado antecipou, em 1939, o
movimento da evangelização espírita infantojuvenil dos
nossos dias.
Sobre o Processo das Aulas, temos:
“Uma aula de Evangelho para crianças colimará,
podemos dar disto eloquentíssimo testemunho, sua alta
finalidade com esta aplicação: prece inicial; exposição
de um ponto da Doutrina em linguagem própria à
compreensão das crianças; uma historieta; números de
declamação, de teatro etc.; revisão do que foi ensinado;
caderno de boas ações e prece final”.
Sobre os Estímulos dos Alunos, merece destaque o
Decálogo do Bom Aluno:
“É pontual às aulas; presta muita atenção às lições;
respeita os mestres e é obediente; porta-se bem sempre;
é amigo de seus colegas; não se esquece dos deveres
escolares; traz sempre as lições sabidas; zela por seus
objetos escolares; não danifica o mobiliário e objetos
escolares; fala pouco, escuta bem e aprende muito”.
Sobre a União da Mocidade Espírita, destaca:
“Como desdobramento deste programa até os moços, que
se organizem e estimulem uniões de moços, através de
programas atraentes e eficientes”.
É sabido no movimento espírita que Leopoldo Machado foi
o grande criador e incentivador das mocidades ou
juventudes espíritas, tanto que no ano de 1948 realizou
o 1º Congresso de Mocidades Espíritas do Brasil.
A maior dificuldade
No encerramento da tese, Leopoldo Machado dedica
primoroso texto aos professores, hoje, no âmbito do
Centro Espírita, chamados de evangelizadores. Temos que
ter em mente que, para o autor, o processo de
evangelização espírita deve ser compreendido como uma
escola em pleno funcionamento, mesmo que apenas semanal.
O texto é vigoroso alerta aos dirigentes das
instituições espíritas e àqueles que ingressam nessa
tarefa junto às crianças e aos jovens. Conheçamos agora,
quase na íntegra, esse texto:
“A maior dificuldade a vencer não está na elaboração
do programa e na sua realização. Muito menos nos alunos,
crianças e moços, que podem aparecer, e aparecerão
fatalmente. Ainda menos, na sede. Está no mestre. É,
pois, o mestre, o maior problema a solucionar. O mestre
que, não a escola e os alunos, é o essencial. Pouco
adiantam prédios suntuosos, aparelhamentos moderníssimos
e exigências pedagógicas, se dentro da escola,
manobrando seu aparelhamento e aplicando as exigências
da pedagogia, não estiver um mestre de capacidade moral
e intelectual. De capacidade moral, principalmente. (…)
E o mestre que não der à profissão que escolheu, que é
um sacerdócio, um pouco da própria alma, senão a alma
inteira, não é digno desse nome (…)”.
De fato, o professor/evangelizador é da máxima
importância. Em nossa experiência de trabalho no meio
educacional, temos visto que não faltam bons programas
educacionais, bons projetos pedagógicos, boas propostas
metodológicas, bons recursos didáticos. Mas faltam,
muitas vezes, bons professores, que amem o que fazem e
estejam sempre prontos para realizar novos aprendizados.
Isso é essencial diante do Espiritismo.
Repercussão da tese
À época de sua publicação, a tese O Espiritismo é Obra
de Educação, de Leopoldo Machado, mereceu elogios
publicados na imprensa espírita, como na Revista
Internacional de Espiritismo, no jornal A Vanguarda e no
jornal O Clarim, com as assinaturas, por exemplo, de
Carlos Imbassahy, Deolindo Amorim, Delfino Ferreira.
Destaquemos a opinião de Carlos Imbassahy, publicada na
Revista Internacional de Espiritismo:
“Sustenta a tese do Prof. Leopoldo Machado que só a
espiritualização do homem, a recristianização, enfim,
trará a felicidade à Terra. Esta, portanto, a grande
obra reformadora do Espiritismo. E, depois de apresentar
uma argumentação lógica e evidente, o Prof. Leopoldo
Machado situa, como educador que é, o Espiritismo no
campo educacional. Fá-lo para mostrar que o caráter da
Doutrina Espírita se enquadra bem, por sua natureza e
finalidade, na verdadeira educação que moraliza e
reforma o homem interiormente. Só a educação, que reside
e age no espírito, é capaz de reformar, de verdade, o
homem. É o que os fatos estão demonstrando. Se o leitor
acompanhar com atenção o desenvolvimento da tese,
chegará à conclusão de que, inegavelmente, o Espiritismo
é obra de educação, como afirma o Prof. Leopoldo Machado”.
Conclusão
À frente do Colégio Leopoldo e do Lar de Jesus (obra
beneficente de amparo às meninas pobres e órfãs), na
cidade de Nova Iguaçu/RJ, Leopoldo Machado logo
compreendeu que, acima de tudo, o Espiritismo é doutrina
de educação do Espírito imortal e reencarnado,
dedicando-se de corpo e alma à educação, trabalhando
para a implantação nos centros espíritas da
evangelização das crianças e dos grupos de jovens.
Sua tese O Espiritismo é Obra de Educação merece
de todos os espíritas a leitura, o entendimento e a
aplicação, mormente na atualidade, em que vemos, apesar
das campanhas de estudo sistematizado da Doutrina
Espírita e de evangelização espírita infantojuvenil, um
desvio de finalidade do centro espírita, com muitos
dirigentes mais preocupados com o serviço de tratamento
espiritual, do que com a educação e reeducação das
pessoas em bases morais, tendo como roteiro o Evangelho
esclarecido pelos princípios da Doutrina Espírita.
Está na hora, de forma urgente, que nós espíritas
tenhamos melhor compreensão sobre o Espiritismo e sua
finalidade de transformar moralmente a Humanidade, o que
somente pode acontecer através da educação, a grande
prioridade, a essência do trabalho a ser realizado, sob
as bênçãos do Mestre Jesus!
Bibliografia:
MACHADO, Leopoldo. Espiritismo é Obra
de Educação, O. Tese apresentada ao 1º Congresso de
Jornalistas Espíritas, realizado de 15 a 24 de novembro
de 1939. Colégio Leopoldo: Nova Iguaçu/RJ, 2ª edição,
1991.
Marcus De Mario é do Rio de Janeiro/RJ, onde coordena o
Grupo Espírita Seara de Luz; mantém o canal Orientação
Espírita no YouTube; criador e diretor do Ibem Educa;
palestrante e escritor com mais de 30 livros publicados.