A serenidade da tentativa
Dentre as muitas belas passagens da vida de Francisco de
Assis, destaca-se aquela na qual ele estava já idoso, um
tanto adoecido, cuidando do seu jardim, quando lhe
perguntaram o que faria se soubesse que ia desencarnar
amanhã. O sol de Assis responde que continuaria,
serenamente, a cuidar de seu jardim.
A serenidade demonstrada por Francisco tem lastro em uma
vida correta, não perfeita. Uma vida na qual se tentou
fazer o máximo, e que mantém o equilíbrio por conta de
uma consciência tranquila advinda de se ter feito o que
pôde ao seu alcance. Isso é que espera de nós a
espiritualidade superior.
A serenidade da tentativa independe de resultados, se
relacionando a nossa tentativa sincera de fazer o
melhor, que às vezes não depende de nós. Claro, é
importante buscarmos os resultados, a concretude, mas
sem o apego e a vaidade de achar que vamos dominar todos
os processos, nas questões por vezes insondáveis dos
desígnios divinos.
Ter tentado fazer o máximo em relação àquele filho,
àquele irmão, é o nosso dever. É o que nos cabe. Difícil
encontrar essa serenidade quando vemos que apesar do
esforço nada deu certo. Mas, é preciso lembrar que as
coisas não dependem apenas de nós. Cada um tem a sua
cota de participação na construção do reino de Deus, e
essa visão nos leva a uma compreensão maior da vida.
Para uma ilustração final, o final de 2021 nos brindou
com uma pérola cinematográfica, o filme “Não olhe para
cima”, exibido pela Netflix, uma comédia dirigida por
Adam McKay, e que causou grande movimentação nas redes
sociais, tratando da vinda de um meteoro na direção da
Terra. Se você ainda não assistiu ao filme, vou revelar
alguns detalhes dele agora, o que pode prejudicar a sua
experiência ao assistir.
Nessa película, com a informação já disseminada de que o
meteoro se chocaria com a Terra e nada havia a ser
feito, os protagonistas, que lutaram durante todo o
filme para reverter essa situação, se reúnem em um
jantar, um sereno jantar, para esperar o fim do mundo.
Nessa refeição, uma das protagonistas, vivida pela atriz
Jennifer Lawrence, destaca que, apesar de estarem ali
aguardando o fim trazido pelo meteoro algoz, eles pelo
menos tentaram. Destaca de forma emocionante a bênção da
tentativa, como o Francisco de Assis de outrora. Mais
que um consolo, é uma certeza de que se fez o que pôde,
e que as coisas aconteceram como tinham de acontecer.
Em tempos tão conflituosos, de crise, de pandemia, de
tensões sociais, é preciso encontrar a serenidade da
tentativa para se enxergar o que nos cabe fazer e em que
momento fizemos o máximo possível, para entender que
somos partes da criação, na construção de um mundo
melhor, e que, como nos assevera o Espiritismo, só
sofreremos o que for relevante para o nosso processo
evolutivo.
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