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por Sandro Drumond Brandão

 

A inutilidade eleita


A infecundidade é uma escolha do Espírito. Iniciamos todos a vida na carne investidos de missão comum: instruir os homens, auxiliando-os em seus progressos e de suas instituições[1].

A ciência de tal missão é bastante para concluirmos que Deus não pode ser fonte de criação do prescindível. Não há ninguém inútil neste mundo.

A lição Divina nos lembra que:

“Cada um administre aos outros o dom como o recebeu, como bons dispensadores da multiforme graça de Deus.” Pedro (I Pedro, 4:10)

A lei do progresso nos informa o serviço como a via de aperfeiçoamento do Espírito, sendo suas faculdades e talentos as ferramentas para o bom desempenho do trabalho.

Na seara da cooperação nos tornamos representantes do Alto na vida dos irmãos mais pequeninos[2], contribuindo com o seu avanço e, por conseguinte, com o equilíbrio geral.

A todo momento a Vida, em sua infinita sapiência, nos convida à missão de auxílio ao próximo[3] e ao bom desempenho do encargo inerente ao cargo que fomos investidos.

Não há quem seja órfão de oportunidade ou que seja tão carente a ponto de não conseguir dar nada de si.

Como nos é ensinado no Livro dos Espíritos[4]:

643. Haverá quem, pela sua posição, não tenha possibilidade de fazer o bem?

“Não há quem não possa fazer o bem. Somente o egoísta nunca encontra ensejo de o praticar. Basta que se esteja em relações com outros homens para que se tenha ocasião de fazer o bem, e não há dia da existência que não ofereça, a quem não se ache cego pelo egoísmo, oportunidade de praticá-lo. Porque, fazer o bem não consiste, para o homem, apenas em ser caridoso, mas em ser útil, na medida do possível, todas as vezes que o seu concurso venha a ser necessário.”

Pela diretriz da sublime fraternidade, recomenda a Palavra Divina:

“A manifestação do Espírito é concedida a cada um, visando um fim proveitoso”. – Paulo (I Coríntios, 12:7).

Emmanuel nos ensina:

“Ninguém está privado do ensejo de auxiliar o próximo, elevar, consolar, instruir, renovar. Não te detenhas.

O amparo do Senhor é concedido a cada ser humano, visando ao proveito da todos. Considera a indicação que recebeste para servir, segundo as possibilidades que te enriquecem o coração e as mãos.

O cargo vem à nossa esfera de ação, por efeito da Providência Divina, mas a valorização do encargo parte de nós.”

Sendo a caridade rota sublime de arrimo e progresso dos Espíritos seria antinatual existir alguma criatura destituída de propósito e carente de ofertas de socorro[5]. Tal ser estaria fatalmente condenado à turva inércia, assistindo o progresso de seus irmãos através das boas obras.

Emmanuel nos lembra que:

“A Natureza, em toda parte, é um laboratório divino que elege o espírito de serviço por processo normal de evolução.”

Incontendível, portanto, que a inutilidade é condição eleita pelo Espírito.

Muitos renunciam a oportunidade de ajuda, desconhecendo que “(...) responderá por todo mal que haja resultado de não haver praticado o bem.”[6]. Outros consideram-se inaptos para a tarefa, quando apenas “(...) cerram-se entre as paredes da própria mente, cristalizados no egoísmo ou na vaidade, negando-se a partilhar a experiência comum”[7]E há aqueles que estão à procura de melhores condições para iniciar o trabalho, olvidando o alerta de Tiago:

Eia agora, vós que dizeis... amanhã...” (Tiago, 4:13)

A promoção do bem não deve ser adiada, para que não corramos o risco de fazê-la tardiamente, no inverno da vida.

Razoável se torna que o trabalhador aproveite a primavera da mocidade, o verão das forças físicas e o outono da reflexão, para a grande viagem do inferior para o superior; entretanto, a maioria aguarda o inverno da velhice ou do sofrimento irremediável na Terra, quando o ensejo de trabalho está findo.[8]

Chico Xavier nos lembra que “(...) se fosse esperar melhores condições espirituais para servir, até o presente momento eu não teria começado.”[9]

Cumpre, também, destacar as lições extraídas do Evangelho segundo o Espiritismo em que Kardec, interpretando os ensinos de Cristo no tópico “O óbolo da viúva”, assevera[10]:

Muita gente deplora não poder fazer todo o bem que desejara, por falta de recursos suficientes, e, se desejam possuir riquezas, é, dizem, para lhes dar boa aplicação. É sem dúvida louvável a intenção e pode até nalguns ser sincera. Dar-se-á, contudo, seja completamente desinteressada em todos? Não haverá quem, desejando fazer bem aos outros, muito estimaria poder começar por fazê-lo a si próprio, por proporcionar a si mesmo alguns gozos mais, por usufruir de um pouco do supérfluo que lhe falta, pronto a dar aos pobres o resto? Esta segunda intenção, que esses tais porventura dissimulam aos seus próprios olhos, mas que se lhes depararia no fundo dos seus corações, se eles os perscrutassem, anula o mérito do intento, visto que, com a verdadeira caridade, o homem pensa nos outros antes de pensar em si. O ponto sublimado da caridade, nesse caso, estaria em procurar ele no seu trabalho, pelo emprego de suas forças, de sua inteligência, de seus talentos, os recursos de que carece para realizar seus generosos propósitos. Haveria nisso o sacrifício que mais agrada ao Senhor.

Cada filho do Pai é um obreiro em sua vinha, que tem a liberdade de escolher entre o trabalho desinteressado e caridoso, e o malbaratamento de seu tempo, em nome de imerecido e infecundo repouso, que lhe é agradável.

 

Referências bibliográficas:

EMMANUEL (Espírito). Fonte viva. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Rio de Janeiro: FEB, 2000.

EMMANUEL (Espírito). Vinha de luz. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Brasília: FEB, 2019.

KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 161. ed. São Paulo: 2005.

KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018.

 


[1] KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 161. ed. São Paulo: 2005, p. 240.

[2] “Em verdade vos digo que quantas vezes o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes.” Jesus (Mateus, 25:40)

[3] “Dai antes esmola do que tiverdes.” Jesus (Lucas, 11:41)

[4] KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 161. ed. São Paulo: 2005, p. 263.

[5] “O filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir” Jesus (Marcos, 10:45)

[6] KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. 161. ed. São Paulo: 2005, p. 263.

[7] EMMANUEL (Espírito). Vinha de luz. Psicografado por Francisco Cândido Xavier. Brasília: FEB, 2019. p. 157.

[9] BACCELLI A., Carlos. O Evangelho de Chico Xavier. 5 ed. Votuporanga: 2002, p.145.

[10] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 131. ed. Brasília: 2018, p. 181.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita