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por Sandro Drumond Brandão

 

Allan Kardec era racista?


Anátemas da politicagem contra a Doutrina Espírita


Recentemente, foi publicado no Uol coluna intitulada 
Grupo espírita lança versão antirracista das obras de Allan Kardec[1] de autoria de Chico Alves.

Segundo o colunista, o combate ao racismo no Brasil reforçou-se com as investidas do grupo progressista Espíritas à Esquerda[2], que lançou no Dia da Consciência Negra a obra O evangelho segundo o espiritismo - Edição antirracista.

Citado movimento defende a necessidade de atualização da forma como os textos espíritas foram escritos.

Das redes sociais de aludido grupo, depreende-se o uso da imagem de Jesus Cristo[3] destacada nas cores vermelha e preta e vestindo uma boina com os símbolos da foice e do martelo[4].

Pois bem. Considerando a delicadeza do tema e, fazendo nossas as palavras de Léon Denis, nos apressamos em ressaltar que[5]:

 

“Não foi um sentimento de hostilidade ou de malevolência que ditou essas páginas. (...) Quaisquer que sejam os erros ou as faltas dos que se acobertam com o nome de Jesus e sua doutrina, pensamento do Cristo em nós não nos desperta senão um sentimento de profundo respeito e admiração. Educados na religião cristã, conhecemos tudo o que ela encerra de poesia e grandeza.”

 

Conforme nos foi revelado pelo Evangelho de Cristo, Deus contemplaria a humanidade com novo Consolador, o Santo Espírito, o Espírito de Verdade, enviado em nome do Mestre para nos ensinar todas as coisas e nos recordar tudo que o Nazareno nos disse.[6]

No capítulo VI d’ O Evangelho segundo o Espiritismo, Kardec nos ensina que a Doutrina Espírita é esse Consolador Prometido, cujo advento é presidido pelo Espírito de Verdade:

 

Assim, o Espiritismo realiza o que Jesus disse do Consolador prometido: conhecimento das coisas, fazendo que o homem saiba donde vem, para onde vai e por que está na Terra; atrai para os verdadeiros princípios da Lei de Deus e consola pela fé e pela esperança.[7]

 

Sendo missão do Espiritismo levantar o véu intencionalmente lançado por Jesus sobre suas lições morais, não poderia seu conteúdo informar procedimento discordante da lei de amor.

O ensino evangélico nos concede a firmeza necessária para concluirmos que a Doutrina Espírita certamente não conheceria sua longevidade se procedesse de forma diversa:

 

“Toda planta que meu Pai celestial não plantou será arrancada.” (Mt, 15:13)


Ademais, é cediço que a missão do Codificador o conduziu à máxima cautela na construção das obras básicas da Doutrina, garantindo sua excelsa autoridade. Todo ensino transmitido a Kardec pelos Espíritos foi submetido a rigoroso controle pela razão humana e ao confronto dos conteúdos, visando a concordância universal:

 

O primeiro exame comprobativo é, pois, sem contradita, o da razão, ao qual cumpre se submeta, sem exceção, tudo o que venha dos Espíritos. Toda teoria em manifesta contradição com o bom senso, com uma lógica rigorosa e com os dados positivos já adquiridos, deve ser rejeitada, por mais respeitável que seja o nome que traga como assinatura (...)

Uma só garantia séria existe para o ensino dos Espíritos: a concordância que haja entre as revelações que eles façam espontaneamente, servindo-se de grande número de médiuns estranhos uns aos outros e em vários lugares[8]

 

Na seara da universalidade do ensino dos Espíritos, destacamos dois importantes excertos extraídos da obra O Evangelho segundo o Espiritismo:

 

As instruções que promanam dos Espíritos são verdadeiramente as vozes do Céu que vêm esclarecer os homens e convidá-los à prática do Evangelho.[9]

De tudo isso ressalta uma verdade capital: a de que aquele que quisesse opor-se à corrente de ideias estabelecida e sancionada poderia, é certo, causar uma pequena perturbação local e momentânea; nunca, porém, dominar o conjunto, mesmo no presente, nem, ainda menos, no futuro.[10]

 

A alteração de forma do conteúdo espírita, com o intuito de atualizá-lo, não pode conduzir à reforma de suas características iniciais, muito menos à edição de nova obra cujo título destaca escopo diverso do inicialmente aventado.

Isto também se vê no abandono da temperança quanto ao uso de regras interpretativas mínimas a considerar o momento histórico, sociológico e cultural da época da codificação, pela adoção do discurso da politicagem[11] tão presente nos dias hodiernos e tão nefasta às mentes mais frágeis[12].

A criação do livro "O evangelho segundo o espiritismo - Edição antirracista" nos remete inelutavelmente à lição divina ministrada a Pedro antes do convite para a casa de Cornélio: “As {coisas}que Deus purificou não {as tornes} tu comuns.”[13]

É preciso nos acautelarmos dos nossos interesses pessoais, deixando de lado caprichos e melindres, para que disso não resulte prejuízo à obra divina.

O orgulho reivindica do homem a aprovação do outro; a influência sobre o outro[14] e a condição de sua referência. Distancia-o do Criador e o transforma em adversário das boas obras.

O apóstolo da gentilidade nos alertava a esse respeito: “Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda?” Paulo (I Coríntios, 5:6)

Kardec não era racista. A Doutrina Espírita não possui conteúdo racista. Sobre todas essas coisas o Codificador nos ensinou:

 

O homem de bem é bom, humano e benevolente para com todos, sem distinção de raças, nem de crenças, porque em todos os homens vê irmãos seus[15].

Não é preciso jamais perder de vista, Senhores, o objetivo essencial do Espiritismo, que é a destruição do materialismo pela prova experimental da sobrevivência da alma humana. (...)

(...) Hoje o Espiritismo penetrou por toda a parte, tem adeptos em todas as classes da sociedade; reuniões de grupos mais ou menos numerosos se organizam em todas as cidades, grandes ou pequenas, esperando a vez das aldeias; [...]

(...) Provemo-lhes que, graças aos ensinos daqueles que chamam Demônios, compreendemos a moral sublime do Evangelho, que se resume no amor de Deus e de seus semelhantes, na caridade universal. Abracemos a Humanidade inteira, sem distinção de culto, de raça, de origem, e, com mais forte razão, de família, de fortuna e de condição social. (...) (KARDEC, 2000a, p. 59-62)[16]

 

Referências bibliográficas:

DIAS, Haroldo Dutra (Trad.), 1971- O novo testamento, tradução de Haroldo Dutra Dias. – 1. ed. – 11. imp. – Brasília: FEB, 2020.

DENIS, Léon. Cristianismo e Espiritismo. Trad. Leopoldo Cirne. Rio de Janeiro: FEB, 2010

KARDEC Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018.

 

[4] E não apenas isso. Em sua homepage dentre os tópicos em destaque há: bolsoespiritismo; bolsoespíritas; desgoverno; marxismo etc.

[5] DENIS, Léon. Cristianismo e Espiritismo. Trad. Leopoldo Cirne. Rio de Janeiro: FEB, 2010. p. 7.

[6] João, 14:15 a 17 e 26

[7] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. p. 107.

[8] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. p. 21-22.

[9] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. p. 19.

[10] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. p. 24.

[11] Há clara tentativa de esquerdização do Espiritismo, fomentada por frágeis reivindicações imediatistas oriunda de pequeno segmento descompromissado com a autoridade da Doutrina Espírita. Assim nos dizia o Mestre Jesus Cristo: “Acautelai-vos do fermento dos fariseus, que é a hipocrisia” Lc 12.1.

[12] Desgoverno ainda não é efeito da aplicação de determinada ideologia política, mas, da fragilidade do Espírito na presença do poder e do dinheiro. Terá a humanidade avançado de forma considerável o dia em que erros e acertos de determinada ideologia for o único desafio. Por ora, devemos ultrapassar primeiro as escolhas do Espírito diante das propostas do mundo.

[13] Atos, 10:15.

[14] Acaso pode um cego guiar {outro} cego? Não cairão ambos no fosse? Lc 6:39

[15] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2018. p. 232.

[16] KARDEC, A. Revista Espírita 1863. Araras, SP: IDE, 2000a.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita