Dentro
de ti mesmo
Em Minas Gerais há uma característica
peculiar na divulgação da Doutrina
Espírita. Trata-se do estudo minucioso
do Evangelho, prática que ganhou o país
nos últimos tempos, de forma
sistematizada, e que carinhosamente é
chamada de “miudinho”.
Essa mesma virtude de difundir o estudo
minucioso do Evangelho fez com que
autores espirituais, sobretudo Emmanuel,
ganhassem uma notoriedade, talvez, um
pouco diferente da proposta de seu
conteúdo, assim entendemos. De fato, a
notoriedade é tanta que muitos nem
simpatizam com os trabalhos do autor
espiritual tendo, inclusive,
divergências. Mas não são divergências
com as ideias e nem com a forma enérgica
e austera com que trabalhou com Chico
Xavier. Nem diferenças por aquilo que se
denomina no movimento espírita como
“erro doutrinário” atribuído a
pensamentos e ideias sobre a “alma
gêmea”, por exemplo. Nada disso. É mais
por causa dos “emmanuelistas”, que
alimentam um “cheiro de sacristia” muito
diferente da filosofia trazida pelo
autor espiritual.
Uma prova disso pode ser extraída da
série “Fonte Viva”. Um conjunto de
livros com diversas interpretações do
Evangelho, que mais poderia se chamar
“Fonte de Luz” do que “Fonte Viva”
(quiçá são sinônimos!). São
interpretações profundas, contribuições
honestas, conexões de ideias que
favorecem uma pessoa comum a extrair da
letra o espírito que vivifica do
Evangelho.
A série “Fonte Viva” é um excelente
recurso para se utiliza no Evangelho no
Lar, para harmonização ambiente,
colocando “todos” na “mesma página” em
busca de sintonia e inspiração superior.
Não se limita ao Evangelho no Lar. Serve
para ser aberto ao acaso quando se
acorda, ao deitar, durante o dia, em
diversos momentos da vida e são
reflexões que nem sempre são
compreendidas em sua essência, ainda
mais quando a mesma lição surge durante
um período maior.
A mensagem de número 147, por exemplo,
do livro que deu nome à série, Fonte
Viva, é de uma beleza ímpar. Seu
título é “Refugia-te em paz”. Emmanuel
interpreta a passagem narrada pelo
Apóstolo Marcos, no capítulo 6,
versículo 31 (“Havia muitos que iam e
vinham e não tinham tempo para comer”),
com riqueza de detalhes e uma abordagem
muito atual. A obra foi escrita em 1956!
Logo no primeiro parágrafo, o autor
espiritual diz do que se trata a
mensagem: “O convite do Mestre para que
os discípulos procurem lugar à parte, a
fim de repousarem a mente e o coração na
prece, é cada vez mais oportuno”. A
prece é o “alimento” é o ato de “comer”.
De fato, sua atualidade corrobora com a
oportunidade: os dias atuais exigem,
cada vez mais, o repouso para a mente e
o coração na prece, na tentativa de
vencer os obstáculos diários que nos
afligem.
Mas não entendemos o repouso da mente e
do coração na prece como uma proposta
dogmática, religiosa, como faz crer
alguns “emmanuelistas”. O recolhimento
proposto é subjetivo e trata de voltar o
olhar para dentro de si mesmo para
compreender melhor o que move o
indivíduo.
Com tantas lutas fratricidas do lado de
fora, como o indivíduo tem-se comportado
do lado de dentro? “As estradas
terrestres estão cheias dos que vão e
vêm, atormentados pelos interesses
imediatistas...”, e assim Emmanuel
desenvolve seu raciocínio em um convite
individual, que pode abarcar a todos,
sem melindres, porque é destituído de
aparências exteriores. “Nunca houve no
mundo tantos templos de pedra...”, quem
busca refugiar-se em paz em templos de
pedra, não encontra conforto e calor.
Poderia, mas não tem encontrado. O
refúgio é interior.
Em outro momento, o autor espiritual
segue com reflexões atuais e
edificantes, como “aprimoraram-se as
teorias sociais de solidariedade e nunca
houve tanta discórdia”. A necessidade da
fraternidade social está cada vez mais
evidente. As casas espíritas continuam
vazias após a pandemia, com os
frequentadores descrentes daquele modelo
de reunião automatizada de “prece –
palestra – passe – prece”, com algumas
alterações na ordem dos fatores.
Esse desconforto é um indicativo de que
as casas espíritas podem rever seu
modelo, sem alterar a forma de
funcionamento, ou seja, é preciso
convencer aqueles que “vão e vem” na
casa espírita, que, mesmo que o modelo
seja esse em grande parte das casas
(“prece-palestra-passe-prece”), as
reuniões públicas têm o objetivo de
proporcionar conexões com o universo “de
dentro”, para fazer luzir esperança,
conforto e fortalecimento mental para o
cansaço que sobrevém àqueles que
frequentam a casa. Por quê?
Na interpretação de Emmanuel, “a maioria
dos homens permanece no vai e vem dos
caminhos, entre a procura desorientada e
o achado falso, entre a mocidade leviana
e a velhice desiludida, entre a saúde
menosprezada e a moléstia sem proveito,
entre a encarnação perdida e a
desencarnação em desespero”. Que
reflexão maravilhosa e atual!
Essa mensagem nos faz lembrar o
pensamento de Léon Denis, na pequena
obra, porém gigante em ensinamentos
também, O porquê da vida: conforme
for o ideal, assim é o homem.
Que possamos renovar as esperanças
dentro de nós mesmos, perseguindo
“devagar, mas sempre” os propósitos
superiores e do além, como continuidade
da vida. Emmanuel, em outra mensagem na
mesma obra, nos convida a voltarmos o
olhar para dentro de nós mesmos e
perseverarmos com vigilância: “não
abandones o teu grande sonho de conhecer
e fazer, nos domínios da inteligência e
do sentimento, mas não te esqueças do
trabalho pequenino, dia a dia”.