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por Rogério Miguez

 

Perfeição relativa


É comum no meio espírita afirmar-se que todos seremos perfeitos: uns mais cedo, outros mais tarde, dependendo de como enfrentamos as diversas provas previstas no processo evolutivo de cada qual. Este “destino” se delineia como seguro resultado da inexorável Lei do Progresso.

Allan Kardec se expressa de diversas formas quando faz referência à ideia da perfeição, mencionando-a, pela primeira vez, em: “Os Espíritos pertencem a diferentes classes e não são iguais, nem em poder, nem em inteligência, nem em saber, nem em moralidade. Os da primeira ordem são os Espíritos Superiores, que se distinguem dos outros pela sua perfeição, seus conhecimentos, sua proximidade de Deus, pela pureza de seus sentimentos e por seu amor do bem: são os anjos ou Espíritos puros.” (O Livro dos Espíritos: Introdução VI)1 (negritamos)

Contudo, usa outras expressões: perfeição absoluta (L.E.: Introdução VI);2 grau supremo da perfeição (OLE: item 100),3 entre outras.

Por outro lado, os Espíritos que ajudaram Allan Kardec na execução de sua magna tarefa também afirmam: “A razão, com efeito, vos diz que Deus deve possuir essas perfeições em grau supremo, [...]” (L.E.: q. 13).4

Por conta destas formas de se apresentar a fatalidade da perfeição, muitos não percebem que, de fato, só Deus pode ser perfeito, enquanto as suas criaturas atingirão um estado tal de evolução que precisaríamos possuir uma outra palavra para bem caracterizá-lo, sob pena de sermos levados a nos confundir com a Divindade, no que tange à questão do atingimento da nossa perfeição.

O nosso idioma não comporta gradações de perfeições, é preciso adjetivá-la ou usar advérbios quando desejamos, por exemplo, dizer que uma coisa é quase perfeita de outra que é totalmente perfeita; entretanto, perfeição é uma coisa só, ou seja: “substantivo feminino - Excelência; de teor elevado, supremo; sem defeitos, falhas; o mais elevado grau de exatidão: a peça foi ótima pela perfeição dos atores. Justeza; alto nível de virtude, correção moral: perfeição de caráter.”5

Esta pobreza de nossa linguagem na definição de certos conceitos é que cria esta pequena confusão a ponto de, quando se afirma que os Espíritos alcançarão, em realidade, a perfeição relativa, alguns não entendem, não aceitam, e questionam, pois acostumados estão à ideia de que seremos perfeitamente perfeitos, atributo aplicado literalmente apenas ao Criador.

Nenhuma surpresa, pois se pudéssemos alcançar a perfeição, através de um progresso ininterrupto e constante, isto é, já vivendo apenas no plano espiritual, sem necessidade de tornar a reencarnar, seríamos todos deuses, mais cedo ou mais tarde, aliás já existiriam incontáveis deuses, pois a criação de Espíritos nunca foi interrompida. Havendo muitos deuses, poderia não existir unidade na Criação e, se algum deles fosse ligeiramente mais perfeito do que os outros, então este seria o Deus único.

É oportuno informar que o próprio Allan Kardec assim registrou: “Progredir é condição normal dos seres espirituais e a perfeição relativa o fim que lhes cumpre alcançar. Ora, havendo Deus criado desde toda a eternidade, e criando incessantemente, também desde toda a eternidade tem havido seres que atingiram o ponto culminante da escala.”6 (negritamos)

Observemos que o Codificador usou perfeição relativa na última obra fundamental, ou seja, já havia meditado profundamente sobre esta questão, assim entendemos, e optou por finalmente adjetivar a palavra perfeição como relativa.

E, podemos destacar também que foi feita referência a ponto culminante da escala. Esta expressão indica claramente que os Espíritos alcançam um ápice em seu processo evolutivo, não progredindo indefinidamente, ou seja, jamais atingirão a perfeição divina.

 

Referências:

1,2,3,4 O Livro dos Espíritos. KARDEC, Allan. Tradução Evandro Noleto de Bezerra. Brasília: FEB, 2007.

Dicionário

6 KARDEC, Allan. A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo.  Tradução Guillon Ribeiro. Brasília: FEB, 2013. cap. XI. Gênese espiritual. Princípio espiritual. it. 9.
 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita