Kardec para além das
superficialidades
O pensamento de Allan Kardec traz sempre algo bom para
reflexão.
Uma das críticas que faziam a ele – Kardec – era de que
não se empenhava, em nada, para recuperar a estima
daqueles que se afastavam. E proporcionava, a quem o
censurava por isso, uma lógica explicação: aqueles que
dele se afastavam o faziam por livre e espontânea
vontade.
Ora, sendo vontade, por qual razão deveria ele, Kardec,
impor-se a eles?
Mais inteligente respeitar a decisão da pessoa em
afastar-se e seguir caminho diferente. Seria até uma
prova para o amor-próprio entender que, para muitos, não
somos criaturas adoráveis como julgam nossas mães.
Entender essa simples lógica ajuda-nos a desenvolver a
humildade e, com isso, damos um chega pra lá na
arrogância, aliás, que tanto mal nos causa.
Uma boa sensação para a alma, creio, é sentir-se livre
de ser “obrigada” a ter a aprovação de todos a fim de
seguir na companhia de muita gente, enfim, fazer parte
da turma, ou, como se diz hoje em dia, estar numa bolha.
Mas, quantas vezes, por exemplo, deixamos nossos valores
de lado, marginalizando o que há de mais sagrado em nós
porque queríamos a aprovação de A, B ou C?
Não é fato incomum essa traição íntima para ter a estima
alheia, e o que isso gera em nós a longo prazo se não
apenas a insatisfação por termos abandonado as
diretrizes da consciência?
Naturalmente não me refiro às concessões que a vida de
relação pede que façamos com maior ou menos constância,
porquanto conviver é aprender a conceder, flexibilizar,
negociar...
Já ensinavam os Espíritos que os bons seres não se
impõem, ao contrário, respeitam nossa forma de ser,
entendem-nos tal qual estamos nos caminhos do progresso
e, se possível, ajudam-nos a avançar, mas jamais colocam
condicionantes para estar ou não conosco.
Aliás, se alguém faz isso, tenhamos a certeza de que,
quase sempre, não o faz por nós, mas apenas por si
mesmo, para ter seus desejos atendidos, pegando em nosso
ponto fraco, a vaidade, que nos deixa reféns do agrado
constante e contínuo para que não nos vejamos juntos à
solidão.
Sei que há fases na vida em que estamos realmente mais
frágeis e, portanto, suscetíveis a cair nessas
armadilhas da autotraição, contudo, vale a pena refletir
com seriedade nas razões pelas quais alguém decidiu
afastar-se de nós e se compensa o esforço para reaver
aquela companhia. Claro que cada caso é um caso e não
vamos esgotar a complexidade das relações humanas em um
texto curto, aliás, nem temos esta pretensão, contudo,
fica como um ponto para pensarmos com carinho.
E também não quero aqui malbaratar a dor de uma
separação ou rompimento abrupto de laços, sei que isso
dói um bocado, até porque todos nós já passamos por isso
e sabemos bem como é complicada esta questão. Nem sempre
é tão simples abrir mão de uma convivência, mas repito e
reforço: é um direito do outro seguir um caminho que não
seja mais ao nosso lado.
A propósito, recordo-me de que, certa feita, uma aluna
veio conversar comigo, muito triste, e disse: “O que
devemos fazer quando alguém não quer mais conversar
conosco?”
Ora, cara aluna, respeitar a decisão do outro, afinal, é
um direito que lhe assiste.
Minha aluna, na época uma adolescente de 13 anos, não
ficou muito feliz com minha resposta. Entretanto, quem
disse que na vida temos de ficar sempre satisfeitos com
as respostas que nos são dadas, seja pelos colegas,
professores ou até pela própria natureza?
No bom e velho jargão: Não somos a última bolacha do
pacote.
Pois é... Kardec sempre nos ensinando para além das
superficialidades.