Psicóloga clínica formada pela Universidade
Estadual de Londrina e especialista em Terapia
Analítico Comportamental, natural de Marília
(SP), onde também reside, Livia Doro (foto) vincula-se
ao Centro
Espírita Luz Fé e Caridade (CELFC), de sua
cidade, onde exerce atualmente o cargo de
vice-presidente. Jovem e bastante atuante,
entrevistamo-la sobre suas vivências espíritas:
Sendo espírita de infância, o que mais lhe
chama atenção em toda essa vivência espírita,
entre o conhecimento que foi agregando e as
atividades de que pode participar?
Para mim, o aprendizado mais importante foi
entender que o Espiritismo é como uma bússola na
minha vida. Compreendi isso recentemente quando
um adolescente da mocidade me perguntou: como
você sabe que o Espiritismo é a religião certa?
E eu respondi: não sei, mas a doutrina é um
propósito para a minha vida, traz sentido para
as dificuldades e injustiças que enfrento no dia
a dia, consola e me dá esperanças, explica sobre
a vida e para onde vou quando morrer, me faz
querer ser uma pessoa melhor, ajudar os outros e
me lembra de ser grata por tudo que eu tenho.
Sendo jovem e compondo a diretoria de uma
instituição espírita, como sente a velha questão
do conflito entre as gerações?
O conflito entre as gerações existe, não é
mesmo!? E vai além das instituições espíritas.
De um lado percebo que a “velha” geração tem
regras rígidas sobre a condução das atividades,
formalidades, hierarquia, burocracias e muita
experiência. Do outro lado, a “nova” geração é
mais dinâmica e questionadora, traz o bom humor,
a informalidade, a necessidade de aprender, a
abertura para o novo e a tecnologia. Há
resistência de ambos os lados para conversar,
ceder, ouvir e mudar. Acredito que o único
caminho para resolver esse conflito é o do
equilíbrio. Todos são importantes e podem
contribuir para as instituições espíritas e o
trabalho no bem.
Faça um compacto histórico da instituição a que
se vincula.
Nós brincamos que o Centro Espírita Luz Fé e
Caridade (CELFC) é um centro “retrô” porque ele
é o mais antigo de Marília, fundado antes da
cidade, no dia 30 de novembro de 1928. Além
disso, o CELFC participou das atividades da 1ª
Confraternização de Mocidades e Juventudes
Espíritas do Brasil (COMJEB) em 1965 e apoiou o
surgimento de uma biblioteca espírita pública
que depois foi incorporada pelo Centro
Universitário Eurípides de Marília (UNIVEM).
Inúmeras pessoas contribuíram para que essa casa
espírita continuasse de portas abertas e o
trabalho continua até hoje com a finalidade de
estudar a doutrina codificada por Allan Kardec e
auxiliar os que sofrem. Em 1938 também foi
fundada a Assistência Social Dr. Bezerra de
Menezes localizada junto ao Centro, um espaço
para exercitar o amor ao próximo, ajudando
material e espiritualmente a população em
situação de vulnerabilidade social da cidade.
Em sua visão como poderia operar de maneira mais
eficiente a transição entre a velha e a nova
geração na condução das atividades espíritas
numa instituição?
Talvez a minha resposta seja um pouco “clichê”,
mas acredito que ter abertura para conversar
sobre as dificuldades vivenciadas na casa
espírita pode ser um primeiro passo. Seria
incrível ter a “nova” e a “velha” geração
pensando juntas sobre a possibilidade de
atividades artísticas, uso de tecnologias, o
conteúdo e o formato dos estudos doutrinários.
Um segundo passo pode ser incluir os jovens nas
atividades. Todos que começam no Espiritismo
precisam de incentivo para se aprofundar,
coordenar trabalhos e assumir cargos, comigo foi
assim. E esse incentivo veio daqueles que já
estão nas instituições há mais tempo, a “velha”
geração. No meu caso, meus pais me incentivaram
muuuuuuito para que eu estivesse à frente de
algumas atividades na casa espírita.
Quais seriam os maiores obstáculos para
integração do jovem no centro espírita?
Acredito que a resistência às mudanças pode ser
o maior obstáculo, tanto da geração mais “velha”
quanto da mais “nova”. Mudar é tão difícil, não
é!? Pensando na minha vivência, percebo que
muitos se acomodam em uma posição “passiva” de
frequentador, observam pontos que poderiam ser
melhorados e não fazem nada. Continuamos com os
mesmos processos de trabalho, com as mesmas
pessoas, do mesmo jeito. Por exemplo, com a
pandemia percebemos que era necessário mudar, as
atividades presenciais precisavam passar para o
on-line. Esse movimento não foi fácil, houve
resistência e nem todos se adaptaram. Lembro que
conversei com alguns membros da diretoria do
centro e disse que o CELFC precisava “estar na
internet” de alguma forma e me propus a ajudar.
Tivemos que aprender a usar o Google Meet,
fazer lives pelo Youtube, criar um
grupo no whats para os frequentadores, redes
sociais e site. Veja só! O centro mais antigo da
cidade ficou tecnológico! Tudo isso foi
realizado porque conversamos sobre as
dificuldades que estávamos passando, propusemos
mudanças e trabalhamos juntos.
Como os mais maduros poderiam vencer a própria
resistência com as gerações mais novas?
Ahhhhh! Você também foi jovem, lembre-se disso!
Todo adolescente sentiu, em algum momento, que
gostaria de fazer algo diferente da geração mais
“velha”. Nas instituições espíritas não é
diferente. Vale destacar que o trabalho que
realizamos não é nosso. Somos uma pequena parte
dessa grande obra do mestre Jesus. Precisamos
incentivar outras pessoas, principalmente a
geração mais “nova”, a levar esse trabalho
adiante.
E como as gerações mais novas devem vencer os
obstáculos dos conflitos de gerações?
Ouçam os mais velhos. Eles têm muito a ensinar.
Quando converso com as pessoas que estão no
centro há mais tempo, aprendo muito sobre a
história do Centro Espírita Luz Fé e Caridade, o
estatuto, burocracias, coordenação de pessoas e
tomada de decisões. Não precisamos cometer os
mesmos erros que eles.
Existe uma forma ideal para integrar mais o
jovem?
Pra ser sincera, eu não faço ideia. Nós estamos
começando a trazer a vivência do jovem para o
nosso centro espírita e aos poucos estamos
caminhando em direção à integração. As redes
sociais estão ajudando nesse processo, grupos de
estudos mais dinâmicos e incentivo para que o
jovem assuma trabalhos na casa espírita. Até o
nosso mascote “cheetos” (um cachorro muito fofo)
é capaz de nos ajudar a atrair o jovem, deixando
os estudos da nossa mocidade mais leve e
divertido.
De suas vivências espíritas, na infância ou
mocidade ou mesmo agora, o que gostaria de
relatar aos leitores?
Eu gostaria destacar a importância da
evangelização. Pais, avós, tios, levem as
crianças ao centro! Se não fossem os meus pais
me cobrando e insistindo para que eu
frequentasse as atividades, eu teria me afastado
da religião. Eu era preguiçosa, queria dormir ao
invés de estudar sobre o Espiritismo. Percebo
que participar da evangelização e da mocidade
foi essencial para que eu assumisse trabalhos na
casa espírita. Uma boa parte dos trabalhadores
que estão no nosso centro são crianças que
frequentaram a evangelização infantojuvenil e
hoje percebem a importância da doutrina espírita
e de estar à frente dos trabalhos.
Suas palavras finais.
As respostas para todas essas perguntas são
bastante complexas. É difícil entender como
lidar com o conflito de gerações e como atrair
os jovens. Não escrevi sobre verdades absolutas
e sim sobre as minhas vivências. Espero que esta
entrevista possa trazer boas reflexões para os
leitores.
|