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por Paulo Hayashi Jr.

 

Zacarias, Isabel e João Batista: algumas considerações iniciais


O nascimento de Jesus Cristo tem muitas histórias fascinantes que instruem e que, muitas vezes, se complementam. Algumas conhecidas por meio dos livros sagrados da Bíblia. Outras, por meio de relatos feitos por autores espirituais. Por exemplo, o livro “Boa Nova” de Humberto de Campos e “Primícias do Reino” e “Vivendo com Jesus”, de Amélia Rodrigues. Há também os escritos apócrifos, os quais não são reconhecidos oficialmente pela igreja católica, tais como o evangelho de Enoque, de Judas, de Thomé, entre outros.

Dos quatro evangelhos oficiais, Marcos e João são lacônicos nas informações sobre o nascimento de Cristo. Em ambos, o aparecimento de Jesus Cristo acontece quando ele está prestes a receber o batismo através das mãos de João Batista.

João era filho de Isabel, prima de Maria, e de Zacarias, “um sacerdote respeitado e cumpridor dos deveres religiosos, fiel seguidor da tradição” (Rodrigues, 2013, cap.2). Para alguns estudiosos, Maria e Isabel são primas de sangue, enquanto que para outros, parentes ou pessoas com fortes afinidades (Silva, 2019). O certo é que o entrelaçamento da vida de João Batista e Jesus é robusta e aparece nos quatro livros do evangelho. Em todos eles, no primeiro capítulo, é a vida de João Batista que ganha destaque, em especial como o preparador de caminhos para o Messias.

Neste pequeno artigo iremos explorar alguns aspectos que parecem ser críveis e que podem nos ajudar na expansão da compreensão dos anos iniciais de Jesus. Todas elas são hipóteses de trabalho, mas sem a possibilidade de comprovação. Assim, sobrarão mais perguntas do que respostas nesta exploração. A imaginação, a criatividade e a lógica podem ser excelentes ferramentas para auxiliar no estudo da Bíblia, bem como de rastrear as pegadas do mestre Nazareno, em especial com a ajuda do pensamento abdutivo. Ou seja, tal como um legítimo detetive, busca-se unir pistas e informações que estão esparsas, mas que juntas, podem auxiliar na expansão da compreensão. Não se espera fazer um trabalho definitivo, mas de lançar certas luzes na amizade entre as duas famílias.

João Batista foi concebido e nasceu primeiro que Jesus. Para Lucas, em torno de seis meses antes:

“E, no sexto mês, foi o anjo Gabriel enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, uma virgem desposada com um homem, cujo nome era José, da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria, entrando o anjo aonde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres. E, vendo-o ela, turbou-se muito com aquelas palavras, e considerava que saudação seria esta. Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus. E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o nome de Jesus”. (Lucas 1:26-31)

Neste primeiro trecho em destaque, é possível perceber que Maria recebe a notícia da gravidez na cidade de Nazaré. Jesus pode ter sido concebido e criado nesta cidade, apesar de não ter nascido nela. A anunciação da gravidez é feita pelo anjo Gabriel e que é o mesmo que tinha anunciado para Zacarias a gravidez de sua esposa. Isabel era alguém próxima de Maria e também, de maior idade que ela. Além disso, assim como Maria, não havia tido filhos antes.  “E não tinham filhos, porque Isabel era estéril, e ambos eram avançados em idade”. (Lucas 1:7)

Se Maria era virgem (Lucas 1:27), por sua vez, Isabel era estéril (Lucas 1:7). Por outro lado, se José era da casa de Davi (Mateus 1:1-17), Zacarias era de Abias (Lucas 1:5), um dos sacerdotes de Davi (1 Crônicas 24:10). Assim, desde longa data havia esta afinidade, o que parece ser reforçada pelo convívio cotidiano. Por exemplo, logo que Maria recebe a notícia de sua gravidez, ela vai para a casa de Isabel contar a novidade. João Batista, mesmo estando na barriga de sua mãe, ao escutar a voz de Maria, alegra-se: “Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, o bebê agitou-se em seu ventre, e Isabel ficou cheia do Espírito Santo” (Lucas 1:41). Outra passagem importante: “E Maria ficou com ela quase três meses, e depois voltou para sua casa.  E completou-se para Isabel o tempo de dar à luz, e teve um filho” (Lucas 1:56,57). Se ambas estavam grávidas, Isabel com certa idade e seis meses de gravidez antes que Maria, então, pela passagem, percebe-se que Maria vem a auxilia-la, seja para ajudar nos afazeres domésticos, seja pela companhia e apoio emocional. Não seria de estranhar então que o casal venha a conhecer o filho recém-nascido de Isabel e que José e Maria tenham pego o bebê no colo. Quem sabe até mesmo o bebê, João Batista, e Jesus Cristo, no ventre da mãe, trocaram afagos e vibrações para melhor se prepararem para as devidas missões, as quais não deveriam ser sem riscos. Segundo Humberto de Campos (2013), houve “acontecimentos singulares e cercada de estranhas circunstâncias” no nascimento das crianças.

Por exemplo, pela sequência dos eventos apresentados na Bíblia, a viagem de José e Maria para Belém devido ao alistamento aconteceu depois do nascimento de João Batista e da profecia de Zacarias (Lucas 1:67-79).

Todavia, sobre o lugar de nascimento de Jesus Cristo, há algumas divergências na literatura especializada. Para os textos bíblicos (Mateus 2:1), o nascimento de Cristo ocorreu em Belém da Judeia. Para outros, na Belém da Galileia (Chagas, 2011).  A primeira dista 150 km de Nazaré, enquanto que a segunda, somente 7 km. Estando Maria grávida de 3 meses ou mais, uma longa viagem parece ser pouco provável. Talvez houvesse algum imprevisto que tenha forçado este parto na manjedoura. Por outro lado, se ocorreu esta viagem planejada para a distante Belém da Judeia, então aconteceu uma certa separação das famílias por um tempo. Todavia, não seria de estranhar que, quando as famílias voltassem a se reunir, as crianças tenham brincando juntas em determinado momento da vida. Quais pais não seriam brindados com tamanha satisfação e a região de Nazaré parece ser o local de moradia das famílias, a qual tinha menos de 300 pessoas na época (Slabbert, 2021). Um lugar pequeno, protegido, mas certamente grande nos propósitos e nos desafios.

Segundo relatos do evangelista Lucas, depois que Maria deu à luz, e passando o período de resguardo, o casal fez uma viagem até Jerusalém (Lucas 2:22). Aqui fica novamente a questão. A distância de Belém da Judeia ou da Galileia. A Belém da Judeia fica próxima de Jerusalém, cerca de 10 km, enquanto que Belém da Galileia 140 km. Ou seja, em algum momento o casal fez uma viagem mais longa. Pode ter sido quando Maria estava grávida, ou quando ela já estivesse com o bebê no colo.

Em Lucas parece haver a resposta. “E, quando acabaram de cumprir tudo segundo a lei do Senhor, voltaram à Galileia, para a sua cidade de Nazaré” (Lucas 2:39). Assim, tiveram que fazer uma longa viagem e, por isso, não seria de estranhar que ambas as crianças, João e Jesus, ficassem felizes ao se reencontrarem. Além disso, com o passar dos tempos: “E o menino crescia, e se fortalecia em espírito, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele” (Lucas 2:40). O mesmo parece ter acontecido com João Batista.

Neste ponto, é essencial relembrar tanto da conduta irreparável de Zacarias, quanto da sua condição de sacerdote. Uma pessoa com condições mediúnicas favoráveis, assim como o conhecimento e certamente, uma biblioteca disponível para as crianças. Uma pessoa de idade, com filho único parece ser uma visão prestimosa para a complementação da formação que Jesus teria tido em casa.

Apesar da descendência da casa de Davi, bem como do seu caráter justo (Mateus 1:19), os livros sagrados pouco apresentam sobre José. Um dos poucos trechos é a preocupação dos pais com o sumiço do menino Jesus durante três dias em Jerusalém (Lucas 2:43-48). Além disso, José seria carpinteiro e que o menino Jesus provavelmente o ajudava (Mateus 13:55). Se com o pai poderia aprender o lado pragmático da vida, com o compadre Zacarias, o lado teórico-abstrato, religioso, filosófico. Não seria estranho se o fato relatado em Jerusalém não tivesse sido a primeira experiência de Jesus com o templo religioso, em especial com a companhia e a facilidade de acesso promovida pelo primo-tio.

Ademais, conforme Humberto de Campos (2013), depois da famosa apresentação de Jesus em Jerusalém aos doutores do templo, Isabel faz uma visita para Maria em companhia de seu filho. Nesta ocasião, ambas as mulheres trocaram conversa, em especial, sobre as posturas de seus filhos, as quais “trazem para a Humanidade a luz divina de um caminho novo” (Campos, p.20). Eles representam a encarnação da verdade e do amor, apesar de que as mães tinham a impressão das dificuldades e das dores que os aguardavam. Nesta mesma ocasião, vindo o pôr do sol, “Maria e Isabel avistaram seus filhos, lado a lado, sobre uma eminência banhada pelos derradeiros raios vespertinos [..] Quem poderia saber qual a conversação solitária que se travara entre ambos?” (Campos, p. 21). Provavelmente as visitas tenham dormido na casa de José e Maria, pois somente na manhã seguinte partiram de viagem de volta.

Todavia, sabe-se que o convívio foi enfraquecido, pelo menos temporariamente, com a fuga da família de José e Maria para o Egito. Não se sabe quantos anos tenha durado. Mas, estima-se que boa parte da infância e juventude de Jesus tenha ficado por lá. Tal viagem foi empreendida pela família devido aos perigos iminentes e as advertências feitas pelo Anjo do Senhor à José: “Levanta-te, e toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito, e demora-te lá até que eu te diga; porque Herodes há de procurar o menino para o matar” (Mateus 2:13).

A viagem de volta da família de Jesus parece se alinhar com o início das atividades de João Batista. O que corresponderia então por volta dos trinta anos (Lucas 3:23). Não se sabe se José e Maria teriam encontrado o casal amigo ainda em vida encarnada.  Ou ainda, se eles também não fizeram a famosa viagem para o Egito ou algum outro lugar. Será que Herodes buscava somente Jesus e não a João Batista que era somente seis meses mais velho? Não se tem notícias nenhuma. Estima-se, no senso popular, que somente o primeiro casal tenha fugido, já que Herodes procurava crianças da idade de Jesus para menos (Mateus 2:16). O que se tem notícias é que João Batista já estava em Jerusalém quando do retorno do Messias. Assim, apesar do preparo inicial de Jesus possa ter ocorrido com o auxílio de Zacarias, parece que a parte final não. Ele teria feito esta preparação no Egito, bem como no deserto após o batismo (Mateus 4:1).

A Bíblia não revela se os pais de João Batista estavam vivos após o fatídico pedido da filha de Herodias (Mateus 14:8), mas certamente, há de se pensar no apoio que receberiam da família de Maria para consolar a tragédia.  O mesmo pode ser dito no caso de Maria.

Outra passagem entre os afins, agora com João Batista já de volta na Pátria Espiritual, é com a transfiguração de Cristo. “E transfigurou-se diante deles; e o seu rosto resplandeceu como o sol, e as suas vestes se tornaram brancas como a luz. E eis que lhes apareceram Moisés e Elias, falando com ele. (Mateus 17:2,3). No caso em questão, Elias e João Batista representam o mesmo espírito em diferentes encarnações (Mateus 17:10-13; Marcos 9:11-13).

Se João Batista foi o maior dos homens nascido de mulher (Lucas 7:28) e Cristo, o modelo perfeito de ser humano, temos somente a agradecer e imaginar tanto os desafios, quanto a questão do preparo feito tanto por eles, quanto pela espiritualidade amiga para dar apoio e retaguarda em tais nobres missões. Imaginar que os casais tenham se ajudado, não seria de se estranhar.  Compadre e comadre de missão e coração, Zacarias e Isabel certamente foram também, espíritos de escol, assim como José e Maria, que auxiliaram a humanidade e que merecem a nossa maior gratidão, reconhecimento e amor. [1].

 

Referências:

Campos, H. (2013). Boa Nova. FEB: Brasília.

Chagas, T. (2011). Arqueólogo afirma que Jesus nasceu em uma Belém diferente da que a Bíblia conta. Confira: LINK-1

Rodrigues, A. (2002). Primícias do reino. Salvador: Editora LEAL.

Rodrigues, A. (2013). Vivendo com Jesus. Salvador: Editoral LEAL.

Silva, I. (2019). Era Isabel prima de Maria? E João Batista primo de Jesus? Confira: LINK-2

Slabbert, C. (2021). Nazareth: The Significance in Jesus’ Time. Confira: LINK-3

 


[1] Escrito em homenagem aos meus pais, Paulo Hayashi e Ioko Ikefuti Hayashi, que já se encontram na Pátria Espiritual.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita