Pais e filhos – contaminações familiares
Sabe-se que a mãe estressada, portadora de alguma
neurose que desencadeia processos bioquímicos que
liberam, na corrente sanguínea, catecolaminas e
glicorticoides, vai levar, ao seu bebê, um leite materno
"contaminado". As substâncias do estresse são um
"veneno" para a criança. Esses conflitos não resolvidos
alteram a estrutura bioquímica do leite, comprometendo a
saúde da criança.
Há crianças que rejeitam a mama porque sentem
inconscientemente, o mau estado do "produto" que lhe é
oferecido. Outros ingerem, mas desenvolvem vários
quadros clínicos doentios. A felicidade e carinho
materno traduz-se num leite de qualidade, capaz de
atender às necessidades do filho, evitando a transmissão
de resíduos de emoções negativas ao inocente.
Outras influências ocorrem no campo psíquico. Carl Jung
estudou tais relações inconscientes em sua obra O
desenvolvimento da personalidade. Às vezes, é
no estado onírico, como narra a história abaixo, que
ocorrem tais “infecções psíquicas” do campo mental da
mãe refletindo sobre o filho.
OS SONHOS DAS CRIANÇAS
Pedrinho (6 anos) tinha “pesadelos” constantes. Acordava
gritando, chorando, esperneando. A mãe, muito apreensiva
pelas dificuldades financeiras, guardava dentro de si
seus medos e culpas por não conseguir oferecer ao filho
tudo que ele precisava. Separada, sofria em silêncio
pelo esgotamento de cuidar de tudo sozinha.
Até os 7 anos, o inconsciente da criança está cheio dos
conteúdos psíquicos recalcados da mãe. Pedrinho, na
verdade, estava sonhando as “angústias”, “medos”,
“desesperanças” de sua mãe. Analisando e interpretando
os “sonhos” de Pedrinho, pôde-se descobrir o que sua mãe
sentia e como ela poderia administrar suas preocupações
para não “contaminar” seu filho e entender que ele
precisava mais da sua mãe em paz e saudável do que de
coisas e objetos.
O ESTRESSE
Essa influência do estresse – estado de humor – dos pais
sobre seus filhos é estudada e pesquisada por vários
autores mundiais, entretanto a maior descoberta vem dos
meandros amnióticos, onde até mesmo o feto sofre a
influência da mãe, mesmo antes da concepção.
As experiências do psiquiatra Thomas Verny, tão bem
documentadas em suas duas obras “A Vida Secreta da
Criança Antes de Nascer” e “O bebê do amanhã”, narram
situações reais em que o adulto regride ao estado fetal
e “lembra”, ou seja, registra memórias congênitas
durante os noves meses que viveu dentro da mãe. Tais
lembranças trazem à tona importantes indagações em que
se mostra que o feto, antes mesmo da mielinização
cerebral e formação do hipocampo – sede da memória de
longo prazo –, já armazena informações.
Sempre pensou-se que antes da memória
explícita/linguística e da memória
implícita/inconsciente nenhum registro mnemônico
existiria. Foi justamente essa nova informação da
psicologia perinatal ou intrauterina que trouxe
revoluções na percepção do bebê, da criança e da relação
mãe e feto. Segundo Candace Perto, os peptídeos –
hormônios encarregados de transmitir informações por
todo o corpo – existem e funcionam como receptores e
transmissores. Isso significa que existe uma rede única
– psiconeuroendocrinoimunologia -
de comunicação interna onde tudo fica armazenado nas
células. Em sua obra “conexão mente e corpo”, ela
detalha essa relação que rompeu o abismo cartesiano que
dissociou a mente do corpo.
PAIS CONSCIENTES, FILHOS PROTEGIDOS
Essas experiências pré-natais ficam marcadas como
cicatrizes indeléveis nesses fetos que se tornarão
adultos funcionais ou com alguns transtornos, se
conseguirem elaborar traumas eclodidos ainda no berço
placentário. Além dessa memória celular que antecede as
memórias neurológicas, existe toda a influência que a
criança sofre de seus pais no pós-concepção.
Até os 7 anos, o inconsciente da mãe e filho é único. Ou
seja, como no caso dos pesadelos, citado acima, em que a
criança sofria a influência dos dramas recalcados pela
sua mãe, da mesma forma, ela será bombardeada por todos
aqueles conteúdos não resolvidos – o aspecto sombra da
psicologia analítica.
Dos 7 anos aos 13/14, a criança recebe o inconsciente do
pai, logo, todo problema nesse período terá relação com
os problemas psíquicos não resolvidos ou ocultados do
pai. É bom frisar que não seria, propriamente, a
ansiedade, o nervosismo, a tristeza dos pais que afeta –
contamina – a criança, mas aquelas situações que eles
preferem esconder a abordar. Qualquer conteúdo da mente
reprimido, torna-se mais forte porque degenera numa
sombra, conjunto de aspectos não aceitos ou não
integrados. O caso abaixo ilustra bem.
MEU PAI FOI EMBORA, MINHA CASA DESMORONOU
Depois de 21 anos de casados, Sr. Jorge saiu de casa. A
esposa, profundamente transtornada, viu-se totalmente
desamparada. Seja pela questão econômica, já que ela
dependia do esposo para tudo e não trabalhava, seja pela
questão emocional porque nunca pensou que seu casamento
teria um fim. Meio a esses dois abalos, começou a
trabalhar lavando roupas nas casas de alguns conhecidos.
Os dois filhos, André de 6 anos e Fátima de 11, sofreram
muito, mesmo sem saber os reais motivos. Certos assuntos
são evitados em certas famílias para não constranger ou
trazer à tona dores passadas.
Durante meses, os dois filhos choravam no quarto,
sentindo a falta do pai enquanto a mãe chorava na sala,
assistindo à TV e fingindo que tudo estava bem. Essa
mãe, movida por boa intenção, acreditava que seria
doloroso conversar com os filhos sobre a saída do pai.
Muitos acreditam que assuntos evitados desaparecem. Não
é bem isso que ocorre. Segundo a lei da constelação
familiar, pela qual o inconsciente engloba tudo aquilo
que é ocultado, escondido e dissimulado, aqueles
assuntos pendentes, que carregam problemas não
resolvidos, continuam influenciando a vida dos
envolvidos.
Numa atitude saudável, em vez daquela família sofrer
isolados, uns dos outros, eles poderiam chorar juntos,
compartilhar seu sentimento de perda e buscar
consolar-se com amor e quiçá com perdão àquele amado pai
que os deixou.
Logo as crianças adoeceram do pulmão. Uma infecção que
os levou ao hospital, exigindo um tratamento prolongado.
A mãe, por sua vez, desenvolveu depressão e constatou,
depois de uma crise hipertensa, que deveria medicar-se
para controlar sua pressão sanguínea.
Aquele pai era o arrimo da casa. Quando ele foi embora,
desorganizou o arranjo familiar deixando profundas
mágoas nos filhos e na esposa, porém não foi a saída
dele, em si, que causou a doença na família, mas a
dificuldade que eles tiveram em abordar, conversar sobre
o assunto. A elaboração de um problema diminui
consideravelmente seus efeitos. Dores ocultas são mais
problemáticas do que dores faladas, comentadas,
discutidas.
Segundo as últimas informações, os filhos estão se
recuperando muito bem de sua infecção pulmonar e a mãe
segue com seu tratamento.
Diante de um problema, a melhor maneira, se não for
possível resolvê-lo, é abordar o assunto, sem medo, com
as pessoas envolvidas, para que esse “tema” reprimido em
família não seja empurrado para o inconsciente familiar
e não venha somatizar-se em doenças físicas.
CONCLUSÃO
Ser pai ou mãe é assumir seus dramas sem usar ou
interpretar um personagem perfeito e idílico para educar
seus filhos, porque as crianças saberão se suas palavras
e gestos são de amor e sinceridade ou uma pura
interpretação de quem foge dos próprios sentimentos e
ainda tem a ousadia de tentar “educá-los” fugindo de si
mesmo. Uma criança não precisa de pais perfeitos, ela
precisa de pais humanos, que assumem seus problemas,
conversem honestamente com seus rebentos e saibam
amá-los dentro daquilo que são e podem ser.
Referências bibliográficas:
O bebê do amanhã – Thomas Verny
O que é psicologia pré-natal – Joanna
Wilheim
A biologia da crença – Bruce Lipton
A vida do bebê no útero – Peter
Nathanielsz
Conexão mente e corpo – Candace Pert
Árvores maravilhosas da mente - Marian
Diamond
Evolução em Quatro Dimensões - Eva
Jablonka, Marion J. Lab
A maternidade e o encontro com a própria
sombra – Laura Gutman
O poder do discurso materno – Laura
Gutman
Os Quatro Pilares da Educação – João
Márcio
A doença como linguagem da alma na
criança – Rudiger Dahlke
Infância, a idade sagrada – Evania
Reichert.
João Márcio F. Cruz, de Canindé (CE), especialista em
Saúde Pública, é psicanalista clínico, palestrante
espírita e autor dos livros Os Quatro Pilares
da Educação e O Espiritismo e o encontro com a
própria sombra.
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