Correio mediúnico

Espírito: Inácio Bittencourt

Visão nova

 

Você pergunta quais as primeiras sensações do “eu”, além da morte, e eu devo dizer, antes de tudo, que é muito difícil entender, na carne, o que se passa na vida espiritual. As ilusões da vida comum são demasiado espessas para que o raio da verdade consiga varar, de pronto, a grossa camada de véus que envolvem a mente humana.

Há vastíssima classe de pessoas que se agarram às situações interrompidas pelo túmulo com o desespero somente comparável às crises da demência total. Para nós, entretanto, que possuímos algum discernimento, por força da autocrítica, que não somos nem santos nem criminosos, as impressões iniciais de além-túmulo são de quase aniquilamento.

Só então percebemos a nossa condição de átomos conscientes. À nossa frente, os valores diferem numa sucessão de mudanças imprevisíveis. Há transformações fundamentais em tudo o que nos cerca. O que nos agradava é, comumente, razão para dissabores, e o que desprezávamos passa a revestir-se de importância máxima.

A intimidade com os outros mundos, tão celebrada por nós, os espiritistas, continua a ser, como sempre, um grande e abençoado sonho… De quando em quando, o obreiro prestimoso, na posição do aprendiz necessitado de estímulo, é agraciado com uma ou outra excursão de mais largo voo, mas sempre condicionado a horário curto e a possibilidades restritas de permanência fora de seu habitat, o que também ocorre aos investigadores da estratosfera que vocês conhecem aí: viagens apressadas e rápidas, com limitação de ausência e reduzidos recursos de sustentação.

Incontestavelmente, grandes vultos da Humanidade gloriosamente vivem em outros climas celestes; mas, falando da Esfera em que nos encontramos, compete-me afirmar que é ainda muito remota para nós qualquer transferência definitiva para outros lares suspensos da nossa comunidade planetária. Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno, importantes companheiros da Terra, no sistema presidido pelo nosso Sol, acham-se a milhões e milhões de quilômetros. A própria Lua, considerada dependência terrestre, rola a centenas de milhares de quilômetros.

E as constelações mais próximas?

Você já imaginou o que seja o Espaço, esse domínio imenso, povoado de forças espirituais que ainda não conseguimos compreender em seus simples rudimentos? já calculou o que seja esse Plano infinito, onde a luz viaja com a velocidade de trezentos mil quilômetros por segundo?

Francamente, hoje creio que um homem, dentro do nosso reino solar, é, comparativamente, muito menor que uma formiga no corpo ciclópico da montanha onde se oculta.

Sentindo-nos, assim, quase na condição de ameba pensante, somos, depois do transe carnal, naturalmente constrangidos a singulares metamorfoses do senso íntimo. Sempre nos supomos figuras centrais no mundo e acreditamos ingenuamente que o nosso desaparecimento perturbará o curso dos seres e das coisas; contudo, no dia imediato ao de nossa partida, quando é possível observar, reparamos que os corações mais afins com o nosso providenciam medidas rápidas para a solução de quaisquer problemas nascidos de nossa ausência.

Se deixamos débitos sob resgate, pensamentos pungentes daí se desfecham sobre nós, cercando-nos de aflições purgatoriais; e se algum bem material legamos aos descendentes, é preciso invocar a serenidade para contemplarmos sem angústia os tristes aspectos mentais que se desenham ao redor do espólio.

A vida, porém, prossegue imperturbável, e nós precisamos acompanhar-lhe o ritmo na ação renovadora e constante.

Somos, assim, atribulados por enormes problemas.

Não será mais possível prosseguir com as ilusões a que nos agarrávamos entre os conceitos provisórios e os títulos convencionais, e nem podemos, de imediato, penetrar nos serviços da Espiritualidade Superior, por nos faltarem credenciais de luz íntima, com o amor e a sabedoria por bases.

Resta-nos, pois, diante das transformações inelutáveis da morte, recomeçar humildemente aqui o velho curso de aperfeiçoamento moral, reaprendendo antigas lições de simplicidade e de serviço; e, quando nos comunicamos entre os homens de boa vontade, é natural não sejamos os Espíritos iludidos de ontem, mas os discípulos da verdade, no presente imperecível, edificados na integração mais perfeita com os princípios de Jesus, nosso Mestre e Senhor, não obstante a nossa demora multissecular em pleno jardim da infância.

 

Do livro Falando à Terra, obra psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.

 
 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita