A sociopatia e as permissividades
“Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém.” –
Paulo (1ª Coríntios, 6:12.)
As regras de conduta nas mais diversas sociedades no
Planeta prenunciam que nós somos responsáveis pelos
nossos atos e ações. Um episódio lamentável ocorrido na
quadra esportiva da Universidade Santo Amaro (UNISA) em
maio deste ano, durante um campeonato interuniversitário,
tomou lugar nas redes sociais na terceira semana do mês
de setembro, quando um grupo de aproximadamente 20
alunos de Medicina invadiu a quadra durante uma partida
de voleibol feminino, tirando suas roupas e ficando com
as genitálias à mostra, alguns com gestos de masturbação
ostensiva, enquanto parte da torcida nas arquibancadas
aplaudia o ato enquanto outros censuravam.
Aí eu me pergunto: o que pode ter levado esses jovens a
esse abominável gesto diante de familiares e amigos e
junto de outros tantos discentes e docentes que estavam
presentes ao evento? Seria apenas uma brincadeira de
colegas marcando suas passagens pela Universidade, para
escreverem seus nomes nos anais da Instituição? Como
poderemos aceitar atitudes como essas, que agridem as
fibras mais íntimas do comportamento social?
Como psicólogo, sugiro de pronto tratar-se de TPA
(Transtorno do Comportamento Antissocial), mais
conhecido como sociopatia. Segundo o DSM-IV (Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), em
sua classificação de número 300.7, eis a característica
essencial dessa patologia: “um padrão invasivo de
desrespeito e violação dos direitos dos outros; também
conhecido como psicopatia ou transtorno da personalidade
dissocial”. Outras características desse comportamento
poderão ser listadas como mentiras compulsivas,
manipulações, arrogância, relacionamento abusivo,
dificuldade para ter empatia, incapacidade de
compreender as emoções de outras pessoas e de sentir
tristeza, felicidade, raiva, pesar pela morte de alguém,
medo de algo que os possa fragilizar, considerar
importantes somente as pessoas que obtiveram conquistas
pessoais, as quais, para o sociopata, são superiores às
pessoas que não obtiveram as mesmas conquistas. Repetem
os mesmos erros que porventura já tenham cometido, por
acreditar que estavam certos e não se sentem culpados.
Tendem a ser irritáveis ou agressivos, podendo até mesmo
entrar em luta corporal ou agredir pessoas próximas para
provarem para si mesmos sua superioridade.
Ampliando nosso olhar e a nossa escuta, podemos ir além
do episódio citado acima e observar o que está ocorrendo
na mídia como um todo, jovens bem-sucedidos
economicamente, através dos esportes, sendo denunciados
e cancelados pelas instituições de que fazem parte, por
agressões causadas as esposas e ou namoradas. Mais do
que um caso disciplinar, acendo aqui um sinal de alerta
para todos que convivem em sociedade, para ficarem
atentos aos sinais que porventura possam surgir em seu
ambiente profissional, social e até mesmo no seio
familiar, para poderem contribuir, com a ajuda que se
fizer oportuna, identificando e denunciando a fim de que
os envolvidos possam dar-se conta da real situação, ou
encaminhando-os para tratamento terapêutico, que poderá
ser acompanhado por profissionais qualificados, e até
mesmo, em muitos casos, ser recomendada a internação em
clínicas especializadas para a proteção da própria
pessoa e de todos em sua volta, por tempo indeterminado.
Somente com a evolução no tratamento é que poderá ser
avaliada a necessidade da continuidade ou da abreviação
da internação.
É importante ressaltar que a ajuda aos familiares das
pessoas que apresentam essa patologia (sociopatia) é
algo sempre sugerido, para que possam compreender melhor
esse comportamento e não serem envolvidos nas
manipulações e chantagens emocionais de que certamente
serão alvo, podendo assim promover uma melhor qualidade
de vida.
Lembramos aqui as palavras do grande jurista Ruy Barbosa
de Oliveira, que em sua “Oração aos moços” assim se
expressou: “A regra da igualdade não consiste senão em
quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que
se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada
à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei
da igualdade”. Esse discurso foi para chamar a atenção
dos novos formandos a respeitarem os seus iguais e a
sociedade como um todo. Não podemos permitir que os
sociopatas saiam por aí fazendo o que querem sem as
penalidades adequadas. Quanto aos jovens que invadiram
criminalmente a quadra esportiva, as autoridades
acadêmicas tomaram providências punitivas expulsando-os
da Universidade.
Parece que o Apóstolo dos Gentios, como doutor da Lei,
compreendeu que há licitude para os iguais e para os
desiguais, mas nem tudo convém. A origem da frase se deu
na carta endereçada por Paulo à igreja de Corinto,
Grécia, onde os novos cristãos estavam confundindo a
liberdade cristã com o consentimento para a prática de
imoralidades e libertinagem e procuravam justificar suas
atitudes dizendo que “tudo me é lícito”, ao que Paulo
rebateu o argumento com a frase “mas nem tudo convém”.
Mais adiante, fazendo um trocadilho com o idioma grego,
Paulo acrescenta: “tudo me é lícito, mas eu não me
deixarei dominar por nada”. Ser livre para tomarmos
as nossas decisões, portanto, não quer dizer que devemos
deixar-nos levar por quaisquer estímulo ou sugestão em
desajuste com as nossas convicções. Ratificando Paulo: “Tudo
me é lícito, mas nem tudo me convém”.
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