O esquecimento das vidas passadas
No imaginário
popular, muitas pessoas gostariam de remover a sombra do
esquecimento que cobre o passado, tendo acesso às vidas
passadas e aos acontecimentos que nelas ocorreram para
melhor compreender certos acontecimentos da atual
encarnação, como se a responsabilidade do sucesso
reencarnatório na atual existência recaísse
exclusivamente na compreensão dos acertos ou dos erros
das vidas passadas.
Se Deus na sua infinita bondade e misericórdia
permitisse o livre acesso ao inconsciente profundo da
alma, na avaliação do psiquiatra e espírita Jorge
Andréa, poderia atrapalhar a reencarnação de muitos, uma
vez que nem todos amadurecem moralmente ao mesmo tempo,
no mesmo ritmo, para lidar com equilíbrio e prudência as
revelações das suas encarnações mais remotas. 1
Observamos em O Livro dos Espíritos as perguntas
de 392 até 399, em que lemos que o esquecimento do
passado é uma necessidade para a evolução do espírito,
pois se ele viesse a se lembrar de determinados
acontecimentos em um momento inoportuno, isso poderia
comprometer sua atual existência. Segundo os espíritos,
quando retornamos à matéria para uma nova oportunidade,
solicitamos do mundo maior o esquecimento das vidas
anteriores com o objetivo de superar as dificuldades que
nos levaram a cometer imprudências, para não reincidir
nos mesmos erros. 2
Para os antigos gregos, o esquecimento por completo das
vidas anteriores é quase impossível, pois nossa história
faz parte da nossa essência e dessa forma trazemos no
nosso âmago as reminiscências das lembranças adormecidas
do passado, que às vezes despertam com objetivo de nos
lembrarem das faltas que temos por obrigação reparar em
uma nova existência física.
No imaginário popular, gostaríamos de ter o pleno acesso
às lembranças de outras vidas sem nenhum tipo de cautela
ou de ressalva, já que a curiosidade na condição de
vigília leva o encarnado em alguns casos a cometer
certas imprudências.
Até mesmo nos mundos mais evoluídos, nem todos os
espíritos têm permissão para acessar suas lembranças de
vidas passadas e quando o fazem já apresentam um
relativo grau de amadurecimento. Somente buscam o
conhecimento de suas antigas encarnações por motivos
terapêuticos e não por curiosidades, típicas de um
planeta de provas e expiações, como ocorre na Terra.
Se desejarmos saber um pouco mais das nossas antigas
encarnações basta observar nossas inclinações ou
aptidões e já teremos uma forte indicação do tipo de
vida que levávamos.
Segundo nos contam os espíritos em obras como a série de
André Luiz, “A Vida no Mundo Espiritual”, nem todos os
problemas que precisamos superar têm origem em vidas
passadas, algumas falhas ou dívidas, foram contraídas
nessa atual existência por abusos cometidos de forma
imprudente. Certas revelações poderiam desencadear um
processo de perturbação, levando em alguns casos a uma
obsessão, por isso a necessidade do esquecimento.
Na obra Ação e Reação, podemos observar que André
Luiz e Hilário orientados por Druso na Mansão Paz,
procuram conhecer casos intrincados de processos de
desequilíbrio, cuja explicação reside no mal-uso do
livre arbítrio em vidas passadas, gerando um
comprometimento que só pode ser corrigido em uma nova
encarnação, quando os espíritos na condição de algozes
tiraram a vida de suas vítimas, se utilizando das mais
variadas artimanhas para atingir seu intento.
Vários casos nos chamam atenção, porém o mais
surpreendente é que alguns desejam reencarnar para
usufruírem apenas do esquecimento que o corpo de carne
promove, nas lembranças que o espírito é portador na
erraticidade.
Vários desencarnados trabalhavam em uma enfermaria
atendendo aos necessitados que chegavam das regiões
umbralinas em profundo desequilíbrio e um senhor idoso,
trôpego e cambaleante que já estava na Mansão Paz há
vinte anos, pergunta ao dirigente Druso, quando ele
teria oportunidade de reencarnar, para sua mente ficar
livre das lembranças que o atormentavam de forma
contínua gerando um grande desconforto. Druso lhe diz
que tivesse paciência, pois em momento oportuno a
espiritualidade iria providenciar essa oportunidade
abençoada.
Esse relato reforça a ideia que apenas os espíritos
moralmente amadurecidos, solicitam de forma consciente e
responsável o conhecimento das vidas anteriores de forma
terapêutica e não por mera curiosidade frívola. 3
Fazendo uma análise dessa narrativa podemos perceber que
o processo de reparação é muito individual de cada um,
pois desconhecemos as vidas anteriores dos companheiros
que nos cercam e a reforma íntima é necessária para
ressignificar a maneira como interagimos com as pessoas
e com a sociedade.
Esse processo de reeducação do espírito não se limita a
uma única encarnação, porém quando temos a oportunidade
de iniciá-lo, passamos a ter um compromisso redobrado,
pois não somos mais meros espectadores da realidade e
sim agentes da nossa transformação pessoal.
Sabemos que a natureza não dá saltos e precisamos nos
esforçar para dar um testemunho de boa vontade, no qual
demonstraremos aos desencarnados que percebemos a
necessidade de renovação com a reforma íntima, através
do estudo e da mudança de padrão vibratório, assim como
o exercício da caridade material e moral.
Um autoconhecimento representa o primeiro grande passo
para a renovação dos sentimentos que nos transformarão
em individualidades mais livres e evoluídas.
Referências:
1) Andréa, Jorge; Psicologia Espírita;
Ed. Societo Lorenz; v:1 e 2.
2) Kardec, Allan; O Livro dos
Espíritos; FEB.
3) Xavier, Francisco Cândido; Ação e
Reação; FEB. Cap. 2.
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