Há um tempo, já alguns anos, foi solicitado aos
trabalhadores da casa que eu frequentava que
desenvolvêssemos o tema Personalismo, em forma
de apostila, e a trabalhássemos em grupo, já
que, quando se pretende a renovação espiritual,
necessário se faz a análise das mazelas de tudo
o que ainda carregamos em nossas almas.
Sabemos, infelizmente, que os relacionamentos
não são fáceis, em todas as esferas do nosso
viver. Os atritos, as contendas, a cizânia nos
grupos espiritistas, nos quais não poderiam
ocorrer, são mais comuns do que podemos
imaginar.
Fazendo uma análise e buscando fontes seguras
veremos quanto precisamos conhecer os “inimigos”
que precisamos combater e que estão dentro de
nós mesmos.
Assim, ocorreu-me trazer o tema para que outros
possam refletir e fazer o bom combate.
Iniciaria com a definição do dicionário Houaiss
da Língua Portuguesa que assim diz: Personalismo
é qualidade daquilo que é subjetivo: conduta;
procedimento do indivíduo que refere todas as
coisas a si mesmo, que tem a si próprio como
ponto de referência de tudo o que ocorre à sua
volta; egocentrismo.
Personalismo é a excessiva valorização de si
mesmo, podendo tomar as mais variadas máscaras,
quais sejam, a vaidade, a tirania, a leviandade,
a tristeza.
Em O Livro dos Espíritos (LE), no
capítulo XII, Livro III, que trata da perfeição
moral, aprendemos que o egoísmo se associa à
personalidade. Para melhor compreensão,
transcrevemos o ensinamento: “O egoísmo se funda
sobre a importância da personalidade”.
Assim, se o egoísmo decorre do personalismo,
primeiro precisamos analisar o que seja o
egoísmo e suas causas, para depois entendermos o
personalismo.
No capítulo do LE acima citado, lemos a seguinte
explicação dos Espíritos Superiores: “O egoísmo,
dentre todos os vícios, é o mais radical, pois
dele deriva todo o mal. Se estudarmos todos os
vícios, veremos que no fundo de todos está o
egoísmo. Será inútil combatê-los (os vícios), se
não atacar o mal pela raiz, sem a destruição da
causa. Todos os nossos esforços devem tender
para esse objetivo, porque aí está a verdadeira
chaga da sociedade. Todo aquele que quer se
aproximar, desde esta vida, da perfeição moral,
deve extirpar do seu coração todo sentimento de
egoísmo, porque o egoísmo é incompatível com a
justiça, o amor e a caridade. Ele neutraliza
todas as outras qualidades.”
Na pergunta 914 do LE, indaga-se se será
possível um dia extirpar o egoísmo do coração
dos homens, e a resposta dada foi: “À medida que
os homens se esclarecem sobre as coisas
espirituais, ligam menos valor às coisas
materiais. É preciso reformar as instituições
humanas que o entretêm e o excitam. Tudo depende
da educação”.
Eles nos dizem também, na resposta à pergunta
915, que: “O egoísmo é o nosso pior mal, mas ele
se prende à inferioridade dos Espíritos
encarnados sobre a Terra, e não à humanidade em
si mesma. Os espíritos, à medida que vão se
depurando pelas encarnações sucessivas, perdem o
egoísmo, como perdem suas imperfeições”.
Dessarte, compreendendo um pouco do que vem a
ser o egoísmo, também encontramos no mesmo
livro, na questão 917, orientação sobre como
podemos combater esse mal, tão arraigado em nós,
pela influência da matéria, da qual o homem,
ainda muito próximo da sua origem, não pode se
libertar, e essa influência concorre para o
sustentar em nossas leis, na organização social,
na educação: “O egoísmo se enfraquecerá com a
predominância da vida moral sobre a vida
material e, sobretudo, com a inteligência que o
Espiritismo nos dá de nosso estado futuro real e
não desnaturado pelas ficções alegóricas. O
Espiritismo bem compreendido, quando estiver
identificado com os costumes e as crenças,
transformará os hábitos, os usos e as relações
sociais.”
Assim, se é no personalismo que encontramos as
raízes do egoísmo, não é demais fazermos algumas
considerações sobre o orgulho, pois também o
personalismo é a sua expressão mais perceptível
e concreta.
E é no capítulo X, item 10, do livro O
Evangelho Segundo o Espiritismo (ESE) que
encontramos a seguinte lição: “(..) porque é o
pai de muitos vícios, o orgulho é também a
negação de muitas virtudes. Ele se encontra como
móvel de quase todas as ações humanas. Essa a
razão por que Jesus se empenhou tanto em
combatê-lo, como principal obstáculo ao
progresso.”
É importante ressaltar que o orgulho, sendo um
sentimento de superioridade pessoal resultante
do processo natural de crescimento do espírito,
poderíamos dizer, um subproduto do instinto de
conservação, um princípio que foi colocado no
homem para o bem, porque sem o “sentimento de
valor pessoal” e a “necessidade de estima”, não
encontraríamos motivação para existir e não
formaríamos um autoconceito de dignidade
pessoal. O problema não é o sentimento de
orgulho, mas o descontrole de seus efeitos. No
atual estágio de aprendizado, ainda não temos
plena capacidade de controlá-lo. Ele está
presente em quase tudo o que fazemos. Isso o
torna uma paixão ou, como dizem os bondosos
Guias da Verdade, “o excesso de que se acresceu
a vontade”.
Portanto, o personalismo é o orgulho centrado no
eu. Enquanto o orgulho incapacita-nos para
verificar as próprias imperfeições, o
personalismo tem como efeito gerar ideias de
tudo aquilo que parta de nós é o melhor e mais
correto. Em outras palavras, a superioridade
pessoal provocada pelo provocada pelo sentimento
de orgulho interfere na formulação de juízos.
Diante de todo o escrito, podemos afirmar que
todos nós somos personalistas, em graus mais ou
menos elevados. Nos labores doutrinários ele se
apresenta nas seguintes situações, sem esgotar o
rol, quando: externamos uma aversão à crítica;
apresentamos gosto pela pompa; tentamos impor
nossos pontos de vista; sentimo-nos melindrados
quando as discrepâncias ocorrem; nutrimos a
mágoa alimentada; damos importância conferida ao
nosso nome, entre outras coisas.
Como transformá-lo?
Lembremo-nos do ensinamento do Codificador:
“Ora, o Espiritismo bem compreendido, repito,
mostra as coisas de tão alto que o sentimento da
personalidade desaparece, de certo modo, diante
da intensidade”. Desse modo, se ainda nos
aferramos com tanta desídia ao personalismo é
porque ainda não compreendemos bem a doutrina
que professamos.
No capítulo III, item 28, d’O Livro dos
Médiuns, importante ensinamento leva-nos a
refletir na importância de buscarmos o
autoconhecimento e, consequentemente, a
renovação interior, como sendo a maneira com que
nos libertaremos de todas as nossas imperfeições
morais, pois nada vale admirar a moral contida
nos preceitos da Doutrina Espírita e em nada
alterar nossos hábitos.
Assim, à medida que se impõe é que invistamos em
nós, em nosso processo de transformação moral e
espiritual, buscando os recursos que temos
disponíveis em toda a bibliografia espírita, que
esmiúça as questões do nosso psiquismo, como,
por exemplo, as obras ditadas pelo espírito de
Joanna de Ângelis, psicografadas por Divaldo
Pereira Franco, e muitas outras que nos
apresentam os caminhos que devemos percorrer
para o encontro com nossas sombras. Nelas
encontraremos orientações seguras para
aportarmos num campo fértil, quando então, ao
conquistá-lo, alegrias invadirão o âmago de
nosso ser.
A sinceridade nos campos dos sentimentos será um
antídoto eficaz contra o egoísmo, devassando sem
medo e admitindo sem inibição, para nós mesmos,
as mais secretas emoções da vaidade e do
amor-próprio que se movimentam na intimidade,
fazendo um autoencontro com as facetas sombrias
da personalidade.
E não poderíamos, com tanto a escrever, é que,
após esse mergulho interior, regressemos ao
mundo das sensações, ao invés de buscarmos a
oração a Deus, integrando-nos, humildes e
abnegadamente, no seu Suprimento Universal,
revigorando-nos as forças para dominarmos as
tendências ora reveladas. E assim perceberemos a
pouco e pouco o ruir das falsas e atordoantes
miragens que a imaginação emitia para os
departamentos da decisão e da ação, em prejuízo
do nosso melhor ajustamento nas experiências da
reencarnação.
Tomados por tais ilusões, atiçamos o
autoritarismo, a indiferença e mesmo o descaso
com respeito a muitos viajantes que nos
compartilham os caminhos doutrinários. Nesse
clima, os “espinhos” do outro são como sinônimo
de incômodo e repulsa, levando muitos
companheiros, premidos pela presunção, a
permitirem um psiquismo inamistoso, tombando por
fim nas malhas da maledicência, nas tormentas do
isolacionismo, do centralismo e da insensatez
doutrinária.
Esse quadro rememora a fábula dos
porcos-espinhos, levando-nos aos rumos da frieza
de afeto por desistirmos de abraçar os
diferentes, os supostos oponentes, os menos
simpáticos que surgem, até mesmo, em nossas
leiras de amor.
O amor, o afeto, eis o antídoto eficaz para
interromper o fluxo rotineiro da “imaginação
enfermiça”, que opera a manutenção de uma
autoimagem centrada na supremacia das qualidades
pessoais, que, muitas vezes, nem sempre
possuímos.
Sejamos nós mesmos e aprendamos a nos prezar e
valorizar.
“Só aquilo que somos realmente tem o poder de
curar-nos.” (Carl Gustav Jung)