Especial

por Americo Domingos Nunes Filho

Mediunidade na Bíblia

Para muitos religiosos este tema não encerra autenticidade, desde que os dogmáticos de todos os tempos anatematizam a doutrina dos espíritos e seus princípios básicos, de que a mediunidade é um de seus pilares mais sólidos.

O intercâmbio mediúnico sempre foi observado e analisado por muitos cientistas e religiosos. Quem desejar pesquisar vai encontrar um campo imenso para seus trabalhos investigativos.

Podemos afirmar que a mediunidade é a principal responsável pela concepção do cristianismo, desde que o Mestre Jesus, ressurrecto, completamente materializado, aparecendo à Maria Madalena e a seus apóstolos, dá início ao movimento cristão, ressaltando a imortalidade do espírito, reaparecendo vivo e glorioso.

Sabemos que a doutrina cristã se expandiu, graças ao fenômeno mediúnico desenvolvido por Jesus nos apóstolos, sendo o dia de Pentecostes o marco inicial, com cerca de 3.000 pessoas convertidas. O que aconteceu, nessa festa, foi que os judeus estrangeiros, em Jerusalém, se depararam com os discípulos do Cristo, em transe mediúnico, se expressando em línguas estrangeiras, sendo eles simples e humildes pescadores da Galileia. Esse fato é ensinado pelo Espiritismo, denominando-o de “xenoglossia”.

A partir daquele momento, os apóstolos foram possuídos por uma estranha coragem que lhes permitiu proclamar o evangelho por toda a parte, enfrentando com galhardia a prisão, os açoites, a espada e a cruz. Portanto, a mediunidade aparece como a precursora e, igualmente, com expressivo papel, na disseminação do cristianismo no mundo.

A revelação espiritual se verificou, através do “derramamento do Espírito Santo” ou “derramamento de um espírito santificado”, isto é, por meio da presença de santos espíritos, sob a égide do Cristo e foi constante no cristianismo primitivo. Na expressão “Espírito Santo”, no grego, não se apresentando com o artigo definido (o), verifica-se a indeterminação; assim a tradução certa é “um espírito santo” ou “um espírito santificado”. Esse apontamento foi realizado pelo saudoso professor de Latim e Grego da Universidade de Brasília, Carlos Torres Pastorino, em sua magnânima obra Sabedoria do Evangelho.

O termo “Espírito Santo”, em grego, trazendo o artigo definido, refere-se à força superior divina ou Cristo Interno ofertado por Deus e imanente em cada criatura. No texto suprimido pelos exegetas protestantes, na Bíblia, há referência de “O Senhor suscitar o Espírito Santo de um moço chamado Daniel” (1). O verbo suscitar, quer dizer, fazer nascer ou fazer aparecer, mostrando-nos a criação do Espírito Daniel, trazendo em seu interior a energia divina (“Espírito Santo”), responsável por sua existência e lhe oferecida no momento de sua formação cósmica. 

Nota-se que os exegetas dogmáticos despendem um esforço mental bem acentuado, exteriorizando intensa e cansativa verborragia, tentando explicar normalmente o que se apresenta com a aparência de fantástico, porquanto a doutrina da trindade tem sua origem estritamente humana, surgindo entre os séculos II e IV D.C. e que tenta revelar o Pai, o Filho e o Espírito Santo, como o próprio Deus situado em três pessoas distintas, mas todas englobando uma só essência ou natureza. Em verdade, foi atribuída uma existência concreta a uma realidade abstrata, fictícia e mal compreendida.

A mediunidade, em suas várias apresentações, ostensivamente exercida, no cristianismo nascente, foi apontada por Paulo, na Primeira Carta aos Coríntios: “Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil. Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação das línguas (2).   

Esse derramamento do Espírito, que sabemos ser a presença dos emissários espirituais de Jesus, comunicando-se, através dos seus discípulos, foi predita pelo profeta Joel: (...) “Derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão visões. E, também, sobre os servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu Espírito” (3).    

O Mestre alertou a seus discípulos que seriam “batizados no Espírito Santo”, ou seja, receberiam o dom do intercâmbio mediúnico com os mensageiros espirituais do Cristo (4), assim também, aconteceu com os que foram tocados pelas pregações dos apóstolos, sendo granjeados com a graça da mediunidade (“dom do Espírito Santo”) (5).   

Encontramos, igualmente, a mediunidade de efeitos físicos, nas Escrituras, assim como observada nos trabalhos espíritas específicos, onde há a presença de sensitivos que, por manipulação de seus fluidos vitais, há a produção de efeitos materiais. O fenômeno, geralmente, é realizado por entidades desencarnadas agindo no mundo físico, utilizando-se da energia liberada pelo médium. Então, podem causar a movimentações de objetos, materializações, pancadas, a escuta de vozes etc. Embora sejam fenômenos observados, nos trabalhos práticos espíritas, foram atestados por alguns cientistas, como Paul Gibier, Ernesto Bozzano, Aksakof, William Crookes e apontados na Bíblia, não ocorrendo nos cultos católicos e protestantes.

Por que o Espiritismo tem essa primazia? Porque nos arraiais espiritistas, além da constatação do fato, há explicação de como acontece, desde que Jesus prometera que o Consolador que o Pai enviaria em seu nome nos ensinaria todas as coisas, além de nos lembrar de tudo o que ele disse (6).   

Em O Novo Testamento, podemos verificar a ocorrência de fatos regidos pela mediunidade de efeitos físicos, como a materialização de dois varões, Moisés e Elias, personagens ilustres do Antigo Testamento (7). Importante a citação posterior e digno de registro que Pedro, Tiago e João estavam “carregados de sono”; e, quando despertaram, viram aqueles dois homens que estavam com o Mestre (8).

Sendo o Espiritismo contemplado com a fé raciocinada, podemos afirmar que seria impossível alguém dormir após um fenômeno ímpar que foi a transfiguração realizada por Jesus, porquanto se tratou de um fato grandioso: “O rosto do Cristo resplandeceu como o sol, e as suas vestes se tornaram brancas como a luz” (9). Jesus, com certeza, por alguns minutos, fez iluminar intensamente o local, pois o singular evento ocorreu no período noturno.

Uma questão surge, necessitando de uma resposta objetiva: Como explicar o adormecimento dos discípulos presentes no Monte da Transfiguração?  A resposta não pode ser oferecida pelos exegetas dogmáticos, desde que desconhecem intensamente o fenômeno mediúnico de efeitos físicos, ignorando que os médiuns, durante esses trabalhos, em sua grande maioria, ficam profundamente adormecidos. Eles se achavam premidos de sono, cedendo ectoplasma. Contudo, logo de imediato, acordaram e puderam deslumbrar a magnitude do acontecimento.

É muito comum, nas sessões de materialização, o aparecimento de luz radiante. Mateus descreve uma “nuvem luminosa” envolvendo a todos e vinda dela uma voz se fez audível: “Este é o meu amado Filho, em quem me comprazo; escutai-o”. Os discípulos vivenciaram grande temor; porém, aproximando-se Jesus, tocou-lhes e disse: “Levantai-vos, e não tenhais medo”. E, erguendo eles os olhos, ninguém viram senão unicamente a Jesus (10).

Para os estudiosos da ectoplasmia, o referido fenômeno denomina-se “voz direta” ou “pneumatofonia”, bem ilustrado em O Livro dos Médiuns (11).

Outro acontecimento luminoso bem expressivo, causado por espíritos, aconteceu, na noite do nascimento de Jesus, sendo responsável por guiar os pastores e os chamados reis magos ao local onde se encontrava a estrebaria. Consideraram o fenômeno como o aparecimento de um astro, denominando-o de “Estrela de Belém”.

No Antigo Testamento, é bem conhecida a passagem, na qual um ser espiritual surge em uma chama de fogo do meio de uma sarça que não se consumia, apesar do fogo forte (12). Em muitas passagens, encontramos o relato da chamada “nuvem de glória”, exatamente a representação da substância utilizada pelos espíritos nos fenômenos de ordem física, conhecido como ectoplasma. Em Êxodo, repousava essa energia espiritual sobre o tabernáculo, considerado um lugar sagrado, onde os filhos de Israel se consagravam a Deus (13).

Quando Moisés recebeu a Lei e as instruções acerca do sacerdócio e da construção do Tabernáculo, a nuvem estava presente e a partir dela se manifestou um ser extrafísico conhecido como “o Senhor”. Enquanto o povo observava de longe, Moisés se chegou à nuvem escura (14).

No episódio de oferecimento de codornizes e maná aos israelitas famintos no deserto, enquanto Arão falava a toda a comunidade, todos olharam em direção ao deserto e a glória do Senhor apareceu na nuvem (15).

Muitos eventos mediúnicos são observados nos textos bíblicos, principalmente os de ordem física. Em “Atos dos Apóstolos” há a descrição de que um espírito surge, inteiramente materializado, e abre as portas do cárcere, onde se encontravam alguns discípulos de Jesus, levando-os para fora. Então, por “voz direta” é dada a instrução de continuarem a pregar a causa do Cristo no templo (16).   

Em outra circunstância, o apóstolo Pedro, incontestavelmente um médium de efeitos físicos, foi responsável por mais uma manifestação de ectoplasmia, aparecendo um ser espiritual (“anjo do Senhor”) iluminado, inteiramente materializado, libertando-o da prisão. O discípulo encontrava-se acorrentado com duas candeias e “dormindo entre dois soldados”. Mais uma vez o relato de estar alguém adormecido. Certamente, em transe, o valoroso seguidor de Jesus fornecia o ectoplasma responsável pela aparição de sua salvadora entidade (17).   

Outras passagens bem significativas de efeitos físicos podem ser apontadas, em “O Novo Testamento”: 1- Dois valorosos combatentes do cristianismo primitivo, Paulo e Silas, estavam aprisionados, em Filipos, e foram livrados após um tremor que sacudiu os alicerces do local, abrindo-se as portas e soltas todas as cadeias. O carcereiro, caído no sono, seguramente era o responsável pelo fato, liberando a energia ectoplasmática (18);

2- De novo o fenômeno da “voz direta”, observado no episódio da conversão de Paulo, na Estrada de Damasco, já que seus companheiros de viagem ficaram emudecidos, ouvindo uma voz e não vendo, contudo, ninguém (19);         

3- O evento da pneumatofonia ou voz direta se caracteriza pela fala de uma entidade, sem o auxílio da voz do médium, e quase sempre é espontânea. O amoroso apóstolo João relata que uma “voz do céu” foi ouvida pela multidão presente em Jerusalém, a qual acreditava ter sido um trovão. Outros argumentavam ser “um anjo que lhe falou”. Pois bem, o Mestre clamou que a voz veio por causa do povo, por amor a ele (20).   

O Cristo esclarece a todos nós que a mediunidade tem a finalidade de fortalecer aos que têm fé e confundir, ou mesmo abalar, os orgulhosos e incrédulos.

Deverá chegar a época, na qual todos os profitentes cristãos aceitarão o princípio básico espírita da comunicação entre as duas dimensões da vida, física e espiritual, porquanto a presença da mediunidade é um fato já comprovado cientificamente e, igualmente, exposta nas Escrituras.

O exemplo de Jesus, em completa materialização, deixando-se tocar por Tomé, patenteia a efetiva existência do intercâmbio mediúnico, despontando que a vida continua após a vida e, ao mesmo tempo, através dele, o cristianismo primitivo agigantou-se, convertendo, em cada pregação, milhares de pessoas.

Portanto, a mediunidade foi a mola propulsora da difusão cristã, cabendo um papel importantíssimo na impulsão da Segunda Revelação Divina à Humanidade, assim como, desempenhando ação fundamental na edificação espírita no mundo, justamente a eclosão gloriosa da Terceira Revelação Divina à Humanidade.

 

Bibliografia:

1- Antigo Testamento, Livro de Daniel, capítulo XIII: 45;

2- Paulo, 1º Coríntios, XII: 7-10;

3- Antigo Testamento, Livro de Joel, II:28,29;

4- Atos dos Apóstolos, I:5;

5- Idem, II:38;

6- O Evangelho de João, XIV:25-26;

7- O Evangelho de Lucas, IX:30-31;

8- Idem, IX:32;

9- O Evangelho de Mateus, 17:2;

10- Idem, 17:5-8;

11- O Livro dos Médiuns, XII:150;

12- Êxodo, 3:2;

13- Idem, 40:38;

14- Idem, 19:9 e 21;

15- Idem, 16:10;

16- Atos dos Apóstolos, 5:19-20;

17- Idem, 12:6-7;

18- Idem, 16: 24-27;

19- Idem, 9:7;

20- O Evangelho de João, 12:28-30.


Americo Domingos Nunes Filho, médico com especialidade em pediatria, reside em Guapimirim-RJ. Palestrante e autor de várias obras espíritas, dirige o Grupo Espírita Dimas e é presidente da AME-Rio, da qual é fundador, tendo sido também membro-fundador da Associação Médico-Espírita do Brasil e da AME-Internacional

  

     
     

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 Revista Semanal de Divulgação Espírita